Elementos-chave para perceber se 2018 será um ano tão surpreendentemente bom para os mercados como 2017

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Ash_Rob_2006, Flickr, Creative Commons

O debate entre expectativa e realidade alcançou um novo nível em 2017, ano que começou com um sentimento entre o cauteloso e o negativo e que terminou surpreendentemente melhor do que tinham antecipado os participantes do mercado. A grande pergunta, agora, é se esta tendência continuará em 2018. Manuel Arroyo, diretor de estratégia da J.P. Morgan AM para a Ibéria, apresentou, no âmbito do seminário de perspetivas anuais da gestora em Madrid, três elementos-chave para ajudar a resolver a incógnita: a sustentabilidade do crescimento, a direção das políticas monetárias e as valorizações.

O ambiente de crescimento é sustentável?

2017 foi o primeiro ano de crescimento sincronizado a nível global da última década. No entanto, é necessário recordar que as economias do mundo se encontram em distintas fases do ciclo: enquanto a dos Estados Unidos se situa entre as mais avançadas em termos de expansão, os emergentes incorporaram-se recentemente no caminho da recuperação. Na opinião de Arroyo, o que é de facto importante é que todas as grandes regiões do mundo conseguiram cumprir as expectativas de crescimento durante o ano passado. A visão da J.P. Morgan AM é que em 2018 se manterá esta tendência. “A recuperação tem, pelo menos, mais um round dentro do ciclo económico”, afirma Manuel Arroyo.

Faz uma rápida revisão à situação das grandes regiões. Começa por recordar a excecionalidade da recuperação nos Estados Unidos: ao acumular 102 meses de crescimento positivo (face aos 47 da média histórica), esta já é a terceira maior da história. O especialista acredita que “em breve será a segunda maior por duração e, possivelmente, acabará por ser a primeira”.

A razão para acreditar que ainda existe potencial reside no facto de o crescimento ter recuperado gradualmente: a média do PIB real dos Estados Unidos durante esta última expansão foi de 2,2%, face à média histórica a longo prazo de 2,8%. O especialista sublinha que ainda não se produziram sinais evidentes de excessos que possam conduzir à seguinte recessão.

Em contrapartida, a reforma fiscal irá significar um estímulo ao crescimento. “O curioso é que a economia norte-americana na realidade não a necessita: está no pleno emprego, tem pouco défice e vive uma expansão de quase dez anos”, afirma o especialista. Acrescenta que a reforma não irá beneficiar tanto as classes mais baixas como as mais altas e as empresas, “que são as menos propensas a consumir”. A gestora prevê um maior impacto positivo da reforma nos lucros corporativos norte-americanos, para os quais calcula uma revisão em alta entre os 5% e os 8%.

Arroyo também acredita que o crescimento europeu se irá manter em alta: assim o justifica a força dos últimos PMI e de outros indicadores económicos avançados. A nota discordante é colocada na Itália, que irá realizar eleições em março. O diretor de estratégia esclarece que, ainda que signifique uma fonte de preocupação devido ao risco político, é certo que, à medida que a recuperação económica ganhou força, melhorou o sentimento europeu e a aceitação do euro em todo o continente. “Não há melhor cura para os partidos antissistema do que o crescimento económico”, sentencia Arroyo.

O último pilar do crescimento global é o mundo emergente. O especialista vaticina que os países desta região deverão voltar a contribuir para o PIB global em maior medida que os países desenvolvidos em 2018 e, para além disso, que o farão numa situação de fortaleza em linhas gerais, graças às reformas realizadas na última década para controlar o défice e dispor de ferramentas para enfrentar choques globais.

Como vão atuar este ano os bancos centrais?

Segundo Arroyo, a atuação das autoridades monetárias “não significa um grande risco a curto prazo”. Isto deve-se ao facto de, ainda que a Fed já tenha começado a reduzir o seu balanço e esteja a planear mais subidas das taxas, “o BCE e o BoJ vão mais que compensar as políticas da Fed, ao continuar com as suas políticas acomodatícias”. O especialista recorda que, com taxas de crescimento próximas dos 3%, “não faz sentido continuar a injetar dinheiro no sistema”, pelo que o início da normalização será mais que bem-vinda nestas regiões.

Outros dos aspetos que em 2017 marcou pela diferença foi o facto de se ter convertido no primeiro ano desde 2008 em que não se produziram descidas das taxas de juro no mundo desenvolvido. “Não nos preocupa o ritmo da subida das taxas porque não há inflação”, declara o diretor de estratégia. Esclarece que “é bastante provável que a inflação se venha a normalizar gradualmente, o que dará tempo aos bancos centrais para atuar”.

Neste ponto aparece um dos fatores que na J.P.Morgan AM consideram que será fundamental para determinar o rumo de 2018: a evolução dos salários, concretamente nos Estados Unidos. “À margem de argumentos como o impacto da tecnologia ou a falta de incorporação de uma parte da população no mercado laboral, será bastante estranho que os salários não subam, apesar do pleno emprego”, expõe Arroyo. Adverte que, se em 2018 se produzir um crescimento salarial visível, “a resposta dos bancos centrais será mais agressiva, ao aumentar as taxas de juro mais do que os mercados estão a classificar”. Segundo o especialista, trata-se de um risco “que não se está a descontar dos mercados”.

Revisão das valorizações

“Há coisas que não se podem negar. As yields encontram-se em mínimos históricos e há ainda mais de 20% do mercado de obrigações global com taxas negativas. Isto não faz sentido num ambiente de mais inflação e taxas em alta”, afirma Arroyo em primeiro lugar. O especialista refere que na gestora não antecipam um bear market mas sim um cenário de “normalização gradual e ordenada dos rendimentos”.

No que respeita às ações, o especialista esclarece que, ainda que nem todas as bolsas tenham subida ao mesmo ritmo nos últimos anos, “já vimos grande parte dessa subida”, pelo que a partir de agora será necessário “selecionar mais e optar por uma gestão ativa”. Arroyo explica que, ainda que as valorizações não estejam já tão baratas em nenhum mercado, o importante é que a evolução no último ano “foi acompanhada de crescimento dos resultados empresariais”, tendência que se irá prolongar em 2018.