Como pode ser medida a incerteza política?

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Créditos: Arnaud Jaegers (Unsplash)

A incerteza política refere-se à imprevisibilidade e instabilidade no cenário político de um país, tendo impactos diretos na economia, nos investimentos e na vida social, pois gera um ambiente de desconfiança, dificultando o planeamento e a tomada de decisões por parte de cidadãos, empresas e investidores. Este termo tem talvez sido, nos últimos tempos, a palavra que melhor define o atual contexto.  

Numa conversa com Jorge Silveira Botelho, responsável da BBVA AM Portugal, e Felipe Pathé Duarte, investigador e professor na NOVA School of Law, no Fórum de Gestão de Ativos organizado pela FundsPeople, o professor afirmou que “atualmente vivemos num ambiente VUCA, ou seja, de volatilidade, incerteza, complexidade e ambiguidade”. Segundo o Banco de Portugal, estes períodos de volatilidade nos mercados financeiros internacionais têm-se tornado “mais frequentes”, relacionados, entre outras coisas, “com as alterações de expetativas em relação à orientação de política monetária e a incerteza política”.

Alguns eventos têm contribuído para o aumento da incerteza política, como a vitória de Donald Trump e as eleições para o Parlamento Europeu. Neste último caso, embora os partidos tradicionais tenham mantido a sua maioria parlamentar, a afirmação de forças nos extremos do espetro político levou à convocação de eleições legislativas antecipadas em França, que teve como resultado um Parlamento francês profundamente fragmentado. Segundo um artigo publicado pelo BPI, intitulado A incerteza política irá moldar a economia internacional?, “tudo isto gerou dúvidas entre os investidores sobre a correção dos desequilíbrios orçamentais e provocou turbulência financeira num contexto em que a França parte de um elevado défice e de uma elevada dívida pública (5,5% e 110,6% em 2023, respetivamente)”.

Que índice mede a incerteza política?

Trata-se do US Economic Policy Uncertainty, que também tem uma versão global e outras específicas por países, e que pode ser consultado aqui, um website gerido por três professores universitários americanos, Scott Baker, Nick Bloom e Steven Davis. Segundo explicam, têm em conta três componentes. O primeiro é um índice de resultados de pesquisa de 10 grandes jornais americanos (USA Today, Miami Herald, Chicago Tribune, Washington Post, Los Angeles Times, Boston Globe, San Francisco Chronicle, Dallas Morning News, New York Times e o Wall Street Journal). “A partir destes documentos, construímos um índice normalizado do volume de artigos que abordam a incerteza da política económica”, explicam.

O segundo componente baseia-se nos relatórios do Congressional Budget Office (CBO). “Criamos números anuais ponderados em dólares das disposições do código fiscal que expirarão nos próximos 10 anos, fornecendo uma medida do nível de incerteza sobre o caminho que o código fiscal federal irá seguir no futuro”. O terceiro e último componente baseia-se no Survey of Professional Forecasters da Reserva Federal de Filadélfia. “Utilizamos a dispersão entre as previsões individuais dos profissionais sobre os níveis futuros do Índice de Preços no Consumidor, das despesas federais e das despesas estatais e locais para construir índices de incerteza sobre as variáveis macroeconómicas relacionadas com a política”, afirmam.

De facto, em novembro de 2020, este índice atingiu um máximo histórico com as eleições norte-americanas, como se pode ver pelo gráfico abaixo. Isto deveu-se a duas razões. Por um lado, a estreita diferença que separava, em termos de eleitores, Donald Trump e Joe Biden. Por outro, o complicado sistema de contagem de votos nos EUA, que varia consoante os estados. 

Volvidos quatro anos, essa incerteza política fez-se novamente sentir não só nos EUA, mas em todo o mundo: