Recentemente, a Sérvulo & Associados realizou o segundo congresso Sérvulo ESG, colocando em destaque o tema do reporte e da diligência devida, com ênfase nos novos deveres e desafios impostos pelas medidas ESG. O evento centrou-se, em particular, na diretiva de relatórios de sustentabilidade corporativa (CSRD), que introduz novos padrões para o reporte de informações ESG, e na diretiva de diligência corporativa em sustentabilidade (CSDDD), também conhecida como CS3D, que estabelece obrigações de diligência devida em matéria de sustentabilidade. Neste artigo focamos nesta última, explorando o seu impacto e exigências para o setor empresarial e, consequentemente, para a gestão de ativos.
O que é a CSDDD?
A CSDDD está em vigor desde julho de 2024 e “espera-se que em menos de dois anos seja transposta para o direito português”, refere Ana Santos Duarte, advogada e membro da Comissão Executiva do NOVA Knowledge Centre for Business, Human Rights and the Environment (NOVA BHRE), e uma das oradoras do congresso. Esta diretiva “visa promover um comportamento empresarial sustentável e responsável nas operações das empresas e nas suas cadeias de valor globais”. Além disso, conforme explica a oradora, a CSDDD “prevê ainda que as empresas devem adotar e pôr em prática um plano de transição para a atenuação das alterações climáticas, que vise assegurar a compatibilidade do modelo e da estratégia empresariais com a transição para uma economia sustentável e com a limitação do aquecimento global a 1,5 °C”.
Contextualizando, como exposto por João Wengorovius Meneses, fundador da Hub 2050 e outro dos oradores do evento, “a CSDDD surge no contexto de outras regulamentações e normativas, como a CSRD, a SFDR e a Taxonomia”. Em específico, a relação entre a CSRD e a CSDDD é estreita, uma vez que esta última exige que as empresas implementem processos de diligência devida para identificar, prevenir e mitigar impactos ambientais e sociais nas suas operações e cadeias de valor. Esses processos, por sua vez, precisam de ser reportados de forma estruturada e pública, o que é regulamentado pela CSRD. Dessa forma, a CSRD assegura que as obrigações de reporte impostas pela CSDDD sejam comunicadas de maneira clara, padronizada e acessível às partes interessadas.
A quem se aplica?
Importa salientar que a CSDDD não se aplica a todas as empresas, pelo menos para já. A intencionalidade da diretiva é focar nas grandes empresas, por terem maior potencial de impacto sobre questões ambientais e sociais. De acordo com Ana Santos Duarte e João Wengorovius Meneses, os critérios de aplicação incluem:
- Empresas da União Europeia com mais de 1.000 trabalhadores, em média, e um volume de negócios líquido anual superior a 450 milhões de euros.
- Empresas de países terceiros que gerem um volume de negócios líquido superior a 450 milhões de euros na União Europeia.
Segundo Ana Duarte Santos, estima-se que esta diretiva impacte mais de cinco mil empresas em toda a União Europeia, cerca de 80 em Portugal. Naturalmente que a implementação desta diretiva não é imediata e tampouco igual para todos os segmentos. Existe uma convenção clara que todas estas obrigações acarretam custos, responsabilidades e mudanças significativas. Neste contexto, esta diretiva implementar-se-á faseadamente até 2030, tendo em conta a dimensão das empresas por número de trabalhadores e receitas, de acordo com o seguinte calendário:

Principais obrigações
As empresas abrangidas pela CSDDD deverão cumprir uma série de requisitos para garantir a sustentabilidade nas suas operações e cadeias de valor. João Wengorovius Meneses expõe algumas das principais obrigações previstas por parte das empresas:
- Mapeamento de riscos: identificar e avaliar riscos ambientais e de violações de direitos humanos nas cadeias de valor, incluindo fornecedores.
- Planos preventivos e corretivos: desenvolver e implementar planos de prevenção e de mitigação de impactos negativos adaptados às operações e cadeias de valor da empresa.
- Plano de transição climática: adotar um plano alinhado com a CSRD e as normas europeias de reporte de sustentabilidade (ESRS), com o objetivo de atingir a neutralidade carbónica até 2050, reportando os progressos anualmente.
- Ações de remediação: suspender temporariamente ou rescindir contratos de fornecimento, caso se constate a existência de riscos significativos e não mitigados de violações ambientais ou de direitos humanos.
Desafios e oportunidades
Frequentemente, a regulação é apontada como um obstáculo à sustentabilidade empresarial, na medida em que o seu volume e complexidade podem dificultar a implementação de práticas sustentáveis. Como tal, também esta diretiva traz desafios para as empresas elegíveis e, por sua vez, aos gestores de carteiras que as avaliam, mas também oportunidades.
Um dos principais desafios apontados por Ana Santos Duarte é o “foco excessivo na obrigação de reporte e sem compreender como o processo de diligência devida pode ser útil”, afirma. Uma outra, é “assegurar a conformidade com a CSDDD quando se tem cadeias de abastecimento complexas e diversas”. Ainda que admita que não é de todo uma tarefa fácil, a advogada crê que é essencial que as empresas trabalhem em conjunto com os stakeholders, para compreender quais são os seus riscos e, a partir daí, criar uma visão e um roadmap inicial. Um último desafio apontado é o “maior escrutínio público e exposição a riscos reputacionais”. Na visão de Ana Santos Duarte, esta tem um maior “impacto indireto nas pequenas e médias devido às suas relações comerciais”, diz.
Em termos de oportunidades, a oradora enumera várias. Em primeiro lugar, destaca-se “a elegibilidade para investimentos sustentáveis e novas oportunidades de financiamento”, permitindo às empresas captar recursos direcionados para projetos específicos relacionados com sustentabilidade. Esta oportunidade cruza com uma outra mencionada que é a “das empresas se posicionarem como líderes em práticas empresariais responsáveis”, ganhando vantagem competitiva, fortalecendo a sua reputação e sendo, de certo modo, mais atrativas para os investidores. Por último, referir ainda o “incentivo à inovação e adoção de novas tecnologias como ferramentas para implementar o processo de diligência devida”, promovendo soluções mais eficientes no longo prazo.