Hard data vs soft data: o que é que o mercado está a considerar atualmente?

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Créditos: Jan Antonin Kolar (Unsplash)

A elevada volatilidade observada no mercado durante o mês de abril, alimentada pela política de tarifas (e volátil) da administração Trump, trouxe consigo várias sessões de fortes quedas nos mercados de ações. No entanto, a prorrogação de 90 dias concedida pelo presidente dos EUA funcionou como um salva-vidas. A prova disso é que muitos índices bolsistas já apagaram as perdas acumuladas em abril e até alguns, como o DAX, estão a cotar em máximos históricos.

Volta-se a falar de um rally, ainda que com cautela, pois há também quem veja as recentes subidas como a calma que precede a tempestade – mais uma tempestade. Afinal, são muitas as contradições nos dados micro e macro que têm sido divulgados, com um fosso crescente entre o que se conhece no mercado como hard e soft data.

"Uma das disfunções mais interessantes que vimos recentemente foi a do hard data e soft data. Vimos uma crescente desconexão entre ambos: os dados soft, que olham para a frente, são mais pessimistas que os hard, que são dados que analisam o passado", explica Ana Gil, investment specialist de rendimento fixo na M&G Investments.

O que dizem uns e outros

Para esclarecer, o chamado hard data são aqueles que, como explica Angelo Meda, gestor do fundo Banor Mistral, "podem ser medidos numericamente". Dá como exemplos os lucros empresariais ou a taxa de desemprego. Ambos revelaram-se positivos: os resultados empresariais divulgados pelas empresas incluídas no S&P 500 superaram as expetativas em 9%, segundo dados da BofA Securities; e a taxa de desemprego manteve-se em torno dos 4%.

Diferente é o chamado soft data, que espelha mais o sentimento de mercado, como a confiança do consumidor, previsões, inquéritos, expetativas, etc., onde não se regista tanto otimismo. Alguns exemplos: o último valor do índice de confiança do consumidor da Universidade de Michigan, nos EUA, revelou uma queda inesperada para os 50 pontos, quando se esperava um valor de 53. E, segundo dados da FactSet, analisando as transcrições das chamadas de resultados de todas as empresas do S&P 500 entre 15 de março e 15 de maio, verifica-se que 381 (das 500) mencionaram o termo “incerteza” — um valor muito superior à média dos últimos cinco anos (224) e dos últimos dez anos (179).

Ana Gil mostra ainda, como terceiro exemplo, no gráfico abaixo, o fosso entre o dado de emprego e a expetativa quanto à sua evolução. "O soft data tende a prever alterações no hard data com seis meses de antecedência. Agora o sentimento é pessimista e, se a correlação histórica entre ambos se mantiver, a taxa de desemprego poderá atingir os 6% no final do ano. Acreditamos que a Fed deveria ter isso em consideração ao ajustar a sua política monetária", explica a especialista.

É por isso que, embora por agora o hard data resista e pareça estar a mover mais o mercado do que o soft data, o clima observado nas várias previsões que têm surgido aponta mais para a cautela e para uma abordagem seletiva na composição das carteiras. Afinal, como recorda Angelo Meda, "a economia é uma ciência social e não uma ciência matemática".