As gestoras internacionais analisam os vencedores e vencidos da tensão nas valorizações do crude.
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Não é a única tempestade que o petróleo vive na sua história recente. Recordemos a crise nos preços a nível global de 2014. Naquela altura um argumento favorito dos analistas era que a quebra seria um tailwind para as economias europeias, principalmente importadoras desta matéria-prima. Mas, e agora? Que consequências tem um preço tão baixo do crude para o crescimento global? Como em todos os eventos de tais magnitudes, há vencedores e vencidos.
O impacto na procura pela paralisação mundial em resposta ao COVID-19 une-se à tensão na oferta pela disputa entre a Arábia Saudita e a Rússia, duas superpotências no mercado do crude. Segundo as estimativas de Philippe Waechter, responsável de Investigação Económica da Ostrum AM (Natixis IM), a produção deverá reduzir-se entre 30 a 40 milhões de barris por dia para reequilibrar gradualmente o mercado.
Assim, as gestoras preveem que a pressão para que os países da OPEC+ cortem a produção continuará. Mas até isto não será suficiente. No último CIO Flash da DWS afirmam que estes cortes, de 12,5 milhões de barris por dia nos países que formam a OPEC, não vão bastar para compensar o colapso na procura causado pela crise do COVID-19. No Credit Suisse, o seu diretor global de investimentos, Michael Strobaek, coincide: “A volatilidade nos preços acelerará o rebalanceamento do mercado de crude; não podem esperar que os cortes da OPEC+ façam efeito. Estão a forçar encerramentos imediatos na produção”.
A médio prazo, também há desafios. Os avanços dos preços do petróleo estão limitados, assegura James Trafford, analista e gestor de fundos de Fidelity International. “Deve-se reduzir o armazenado, a capacidade sobrante deve voltar a ser ativada e o consumo de petróleo na economia vai, provavelmente, estabilizar em níveis inferiores aos que existiam antes da crise”.
Também é preciso vigiar estas zonas
A primeira zona onde o impacto está bem identificada: as divisas de países exportadores de petróleo e a dívida high yield americana pelo seu elevado componente de empresas de exploração de crude. Nas ações, o sector energético apenas representa 4% dos lucros do S&P 500, segundo a DWS, e 6% do MSCI AC World Index. Por países, o sector é notório na Rússia, mas também no Reino Unido.
Na DWS ressaltam os efeitos indiretos no crescimento económico à medida que as empresas de crude cortam o seu gasto. Os bancos canadianos e americanos, com exposição via empréstimos, também estão em risco. Além disso, é preciso ter em conta o efeito psicológico nos consumidores, negócios e investidores, que não devem ser subestimados. Há uma grande diferença em relação à queda dos preços de 2014-2016. Naquela época, era interpretado como uma boa notícia, mas agora, quando as pessoas estão confinadas nas suas casas, esse impulso ao sentimento económico é improvável.
Este é o principal problema desta crise nos preços, já que quem mais poderia beneficiar não o pode fazer agora. “Beneficia os países importadores de petróleo, já que um grande custo para a economia foi reduzido drasticamente. Um baixo preço do petróleo é também bom para os consumidores… os que ainda precisam de comprar petróleo. A indústria das linhas aéreas, que normalmente seria favorecida com um preço tão baixo do crude, lamentavelmente não pode aproveitar a situação atual”, afirma Randeep Somel, diretor de investimento em ações de M&G.
Os emergentes no olho da tempestade
Onde mais se sentirá a diferença entre economias vencedoras e vencidas será nos mercados emergentes já que são países onde se nota claramente o impacto dos produtores de crude na sua economia enquanto os importadores vão notar a menor pressão na sua balança de pagamentos. “Os países com grandes balanços, com fortes aforros e ativos financeiros serão mais fortes. Para outros, com um balanço mais débil, é uma questão de quanto vão durar as reservas de divisas em diferentes graus de ajuste fiscal e externo. É provável que os países com moedas pegged (ligadas a uma divisa mais forte, como o dólar) necessitem de mais reservas de divisas do que os que podem ajustar as suas taxas de cambio”, explica Claudia Calich, gestora de mercados emergentes da M&G.
Os dois países com sua economia na corda bamba são os grandes players do sector: a Arábia Saudita e a Rússia. O crescimento da Arábia Saudita é dominado pela produção de crude, e a sua moeda, o riad, está ligada ao dólar americano há décadas. A seu favor tem o facto de ser um produtor de crude de baixo custo, pelo que têm alguma margem para atuar. Mas, quanta?
Calich vê outros países em maior risco. Na sua opinião, o Equador é um dos mais vulneráveis com a queda dos preços e, ao ser uma economia dolarizada, não tem flexibilidade para se ajustar. A isto soma-se um déficit fiscal grande, dinâmicas políticas complexas e eleições em 2021 com receio do regresso de medidas populistas. A gestora teme que o país venha a enfrentar uma crise de liquidez. Na África o foco está na Nigéria e em Angola.
Mas Alejandro Arévalo, gestor de dívida de mercados emergentes da Jupiter AM, recorda que nem todos os países emergentes dependem do crude. Nações como a Egipto, a Geórgia, a Índia, a China, a Indonésia e as Filipinas até beneficiam dos preços baixos. Por sua vez, começou a acrescentar exposição à Rússia. “O país claramente está numa melhor posição do que estava durante a crise de 2014: tem uma divisa flexível, um menor rácio de dívida/PIB, e normas fiscais que vão ajudar a economia a lidar melhor com os preços baixos do petróleo. Também está menos exposta a saídas de capital devido às sanções”, argumenta.