Os fundos que olham para universos mais focados, como o setor da tecnologia ou saúde, estão longe de mostrar uma abordagem uniforme. O investimento em segmentos de mercado tão específicos como estes pedem um olhar treinado na sua seleção.
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Muito se tem falado do investimento temático nos últimos meses. As estratégias focadas nos setores de tecnologia e saúde sobressaíram num mercado atolado em volatilidade e incerteza. Isto, não só por representarem tendências seculares de crescimento, mas também porque as consequências da pandemia que atravessamos foram especificamente benéficas para o negócio das empresas destes setores. Contudo, mesmo o investimento em segmentos de mercado tão específicos como estes, pedem um olhar treinado de quem tem a experiência e está ciente das distintas abordagens com que se pode investir num tema. Mais defensivo ou mais arriscado? Mais concentrado ou mais diversificado? Quão diversificado é efetivamente diversificado? São só algumas das perguntas que Marta Martins, da GNB Gestão de Ativos, Eduardo Monteiro da BPI Gestão de Ativos, Tiago Gaspar do Banco Carregosa e Mikko Ripatti da DNB Asset Management responderam e discutiram num encontro promovido pela entidade gestora nórdica.
Para Tiago Gaspar, o setor de empresas de saúde é vasto o suficiente para requerer uma abordagem seletiva. “Preferimos abordar o mercado através de empresas que produzem equipamentos clínicos. Dentro do setor, estas empresas apresentam-se com cash-flows mais estáveis e com muito menor incerteza do que a indústria farmacêutica, por exemplo”, introduz. Para o selecionador de fundos do banco do Norte de Portugal, o entusiasmo que se constrói em torno de potenciais novos medicamentos só gera volatilidade. “Não procuramos grandes tiros, mas sim algo recorrente, bem como empresas que promovam um sistema de saúde mais sustentável”, acrescenta. E, porque a diversificação é importante, mas risco de sobrediversficação existe, o profissional descarta o recurso a ETF para explorar o tema. “Os ETF acabam por ter limitações ao nível da dimensão das posições e ter que incluir nas suas carteiras empresas que têm tamanho, mas não o potencial a longo-prazo”.
Já na gestão de patrimónios da BPI GA, a abordagem de investimento em temas específicos é veiculada por um misto de ETF e investimento direto. Falta, segundo Eduardo Monteiro, o fundo ativo perfeito para corresponder à visão da casa. “Teria que ser um fundo muito rigoroso, com processos quantitativos muito bem definidos e, idealmente, evolutivos. Uma componente de inteligência artificial na ponderação os diferentes temas e subtemas. É naturalmente algo difícil de construir, mas é um desafio intelectual interessante”, explica. Relevante também, para o profissional, é o limite de capacidade em estratégias muito focadas. “Se uma entidade gestora não tem os seus limites definidos à partida nem vale a pena continuar a conversa”, exclama. Contudo, focando no tema da tecnologia, considera também que o mercado tem hoje um perfil que dilui estes riscos em comparação com o que se passava no final do século passado. “Na altura, tínhamos um peso muito grande de determinadas empresas cujos earnings e receitas eram limitados. Havia uma dicotomia muito grande entre a ponderação nos índices e os resultados gerados. Hoje em dia, as empresas de tecnologia pesam muito, mas também geram muito dinheiro o que faz com que a capacidade seja menos uma limitação.Neste tema em específico preocupam-me mais as questões regulatórias que podem afetar empresas que se estão a tornar muito grandes”, esclarece.
“No investimento temático, seja em saúde ou tecnologia, é muito importante perceber como é definido o universo do fundo, quando falamos de capacidade”, comenta Mikko Ripatti. Para ilustrar, o responsável de vendas da DNB AM na Península Ibérica destaca a abordagem mais indireta da forma como executam o investimento em tecnologia na casa de investimentos nórdica. “Quando os temas ficam muito quentes, isso impacta a valuation das empresas e o nosso fundo de tecnologia tem um enfoque muito grande nessa valuation. Não é um fundo value, mas o valor intrínseco é algo muito importante para os nossos gestores. Assim, quando olhamos para a Tesla, por exemplo, vemos um ativo que está muito caro, mas podemos investir no tema através dos produtores dos componentes eletrónicos que fazem cada vez mais parte dos veículos, à medida que estes se tornam mais e mais autónomos. Investimos no tema, pagando menos do que nos custaria a Tesla. A Amazon é outro exemplo. O segmento mais rentável desta empresa é o segmento de webservices. Poderíamos comprar Amazon aos múltiplos que está, mas preferimos fazê-lo através de provedores de serviços e equipamentos para serviços cloud”, explica.
Marta Martins vê na capacidade uma questão crítica, mas também na diversificação, seja em termos de nomes individuais, sejam em termos de subsegmentos dos temas, e na pureza da abordagem das estratégias. No entanto, na GNB GA olham mais para gestores com uma visão mais holística do mercado que podem ter ou não um viés para determinados temas com maior potencial, como seriam os da tecnologia e saúde. As características dos fundos que selecionam, sejam mais focados ou não, são transversais e requerem uma análise muito diligente. “Há que perceber se a filosofia e o processo de investimento são mantidos ao longo do tempo. Só se os gestores se mantiverem fiéis à filosofia podemos perceber se os resultados são consistentes. E sendo nós investidores em gestão ativa, gostamos de ver um tracking error mais elevado e uma geração de alfa consistente. Isto requer que analisemos questões como há quanto tempo as equipas de gestão trabalham juntas e como executam esse trabalho. Por vezes, os gestores dizem-nos que pensam ou agem de forma diferente, mas só com o tempo e um acompanhamento diligente podemos perceber se assim é”, esclarece.
Quão diversificado é muito diversificado?
Para Tiago Gaspar, e como já referido numa abordagem de investimento temática é preferível ter um fundo concentrado do que muito diversificado. “Um fundo muito diversificado acaba por incluir ativos em carteira que só servem para diluir o tema e deixa de ser uma abordagem tão fiel. Mas também, cada caso é um caso e a melhor forma de construir a carteira terá que ver com tema em si. Se falamos de uma temática mais jovem, a diversificação acaba por ser mais relevante, no sentido em que não sabemos qual a empresa que vai proliferar, mas a que fizer, compensará as que vão ficar pelo caminho. Já em temas mais maduros, a abordagem poderá ser diferente. A Microsoft, por exemplo, é uma empresa diversificada em si mesma pela diversidade de fontes de receitas”.
Marta Martins mostra-se de acordo e comenta que a diversificação é “sempre importante do ponto de vista do risco”. Contudo, realça também que não é por se requerer a diversificação que não se investem em carteiras concentradas. “É muito relevante perceber o ponto ótimo na diversificação. Não é só uma diversificação por nomes dentro da carteira, mas sim a exposição a diferentes fatores e temas. Dentro de abordagens mais focadas, como a temática da saúde ou tecnologia, é importante perceber quão maduro é o tema e a dimensão e profundidade do universo, e disso dependerá o peso nas carteiras”.
Na mesma linha, Eduardo Monteiro destaca a importância da diversificação no sentido do controlo do risco. “É importante avaliar o contributo de cada fundo, ação ou tema para o risco total. Quanto mais pequeno é o tema, mais a carteira deve estar concentrada”. Já no que se refere aos setores em que se centra a discussão, o profissional da BPI GA observa alguma complementaridade. “Pela análise que temos feito, os setores da tecnologia e da saúde funcionam muito bem em conjunto pela sua descorrelação, muito embora este ano estejam ambos os setores a subir. A subir de forma diversificada”.