João Brion Sanches (Norfin): “Ao longo de 20 anos podemos dizer que contámos com praticamente todos os investidores institucionais em Portugal como clientes”

João Brion Sanches - Norfin
Vitor Duarte

Em dezembro de 2018 a Norfin aparecia no mercado com uma das novidades que marcaram o fim de ano no mercado nacional. A Arrow Global comprava a totalidade da empresa de gestão de ativos imobiliários, tornando-se dona, em Portugal, da Whitestar e da Norfin.

João Brion Sanches, um dos fundadores da entidade e CEO, conta à Funds People que, antes da compra por parte do grupo inglês, tinha chegado um momento de decisão crucial na empresa. “Esta questão apareceu quando confrontados com o tema da sucessão do negócio e, analisadas outras questões, decidiu-se que teria de se passar por uma profissionalização da gestão”, conta. Para esta profissionalização, diz o CEO, ou se transformava “a gestão em capital”, ou se encontrava “um acionista de referência”. Ainda sem estarem exatamente à procura de solução, a Arrow bateu-lhes à porta. “Eu e os meus sócios tínhamos a noção de que uma empresa que quer avançar para o futuro tem de ter líderes jovens e com pensamentos mais modernos”, reitera. O negócio foi um win-win. A Norfin ganhava uma gestão profissionalizada com sinergias de negócio, e a Arrow passava a ser dona em Portugal da líder de mercado em gestão de dívida – a Whitestar – mas também da líder em gestão imobiliária independente - a Norfin.

Embora esteja prevista uma sucessão, que se pretende calma e ponderada, a médio prazo, o CEO da entidade revela que desde a aquisição tem havido “tempo de nos conhecermos mutuamente, com uma relação excelente entre as duas comissões executivas. Temos também atualmente um CIO conjunto – da Whitestar e da Norfin – o que fornece uma visão integrada do grupo”, conta.

Várias fases do negócio

A entidade nasceu no final da década de 90, altura em que o investimento imobiliário ainda era pouco preconizado em Portugal. “Nascemos com um fundo de escritórios, só para investir em Lisboa, investindo em prédios inteiros. Era para nós importante controlar a qualidade do ativo e, por isso, ter uma maioria. Na altura isto foi inovador, pois nenhum fundo o fazia”, declara. O sucesso ao longo dos anos foi sendo evidente, acompanhado pelo incremento do investimento neste tipo de ativo: “Em Portugal,  o investimento em imobiliário passou de um número inferior a 2% nas carteiras institucionais, para próximo dos 7%/8% atuais”, enfatiza. Na cronologia da entidade seguiu-se um fundo de logística e, depois, a construção do famoso campus de justiça.

“Fomos fazendo fundos atrás de fundos, sempre com investidores institucionais, na sua maioria portugueses”, recorda, especificando. “Ao longo de 20 anos de história podemos dizer que contámos com praticamente todos os investidores institucionais em Portugal como clientes: fundo de pensões do Banco de Portugal, fundo de pensões da Caixa Geral de Depósitos, e os fundos de pensões da maior parte dos outros bancos”, aponta o CEO.

Vários segmentos, e abordando também toda a curva de risco: foi sendo esta a senda seguida pela entidade nos investimentos que executava. Quando chegou a crise financeira, e no período que abarcou os anos de 2009 a 2014, começaram a falar com os grandes bancos em Portugal. Começaram a fazer consultoria imobiliária para esses bancos, no fundo, product managament, pois essas entidades bancárias estavam “a receber uma grande quantidade de ativos imobiliários de dações em pagamento” que a Norfin acabou por gerir. “Andámos a fazer isto durante cinco anos, gerindo numa média anual de cerca de 250 milhões de euros de ativos. Na prática vocacionámos metade da empresa para este novo negócio, o que fez com que atravessássemos a crise sem ter de despedir ninguém, acabando mesmo por contratar”. Os ativos da Norfin foram crescendo até 850 milhões em 2009, e em 2009 atravessam um período de estabilização que dura dois anos, tendo em 2010 voltado a crescer, com o maior impulso em 2012 até aos 1.200 milhões de euros que temos hoje em gestão.

Findo esse período, em 2013, passaram a gerir o primeiro fundo de arrendamento habitacional em Portugal. “Fizemos uma proposta aos bancos de criar um fundo de arrendamento habitacional; essa ideia veio a ser bem acolhida pelos bancos, acabando estes por fazer um concurso a todas as sociedades gestoras do mercado. Ganhámos esse concurso para gerir o primeiro fundo de arrendamento habitacional  detido integralmente pelos sete maiores bancos portugueses”, lembra. Um fundo que começou com 200 apartamentos e que, rapidamente, arrendava 100. “Fizemos um aumento de capital do fundo e, mais tarde, foram criados dois fundos a partir deste. Hoje em dia esses dois produtos gerem 4.500 apartamentos, e estão 93% arrendados.  Um fundo em que as receitas suplantam largamente os custos, e que distribuem aos bancos entre 2%  a 3% líquidos por ano”, assinala.

A terceira etapa da entidade determinou o seu regresso ao mercado, desta vez com um enfoque em investidores internacionais. “Desde 2014 que achámos que valia a pena comprar coisas em Portugal, e já não havia muitos investidores institucionais portugueses para o fazer no país. Os investidores internacionais, por seu lado, estavam a descobrir Portugal nessa altura. De um leque alargado de investidores com quem reunimos existiram 3 ou 4 com quem começámos a comprar escritórios e  carteiras de ativos de seguradoras”, diz o CEO. Formalmente, 2017 foi o ano em que lançaram o último fundo regulado, no caso para um investidor alemão. Um veículo que tem sido preterido pelos investidores internacionais. “O que temos feito é criar sociedades anónimas, já que este tipo de investidor internacional não quer um fundo regulado. O que acontece é que dentro destas sociedades anónimas nós temos uma procuração para gerir os ativos”, conta.

Profissionalização do imobiliário

Com experiência suficiente no mercado para traçar uma visão segura sobre a classe de ativos, João Brion Sanches está seguro de que “o imobiliário passou a ser uma classe de ativos de investimento”. Desta feita, começam a existir “agentes especializados em cada segmento: habitação, escritórios, centros comerciais, etc”.

Nesse sentido, as novidades aparecem em Portugal numa classe de ativos a fervilhar. “Já se fala por exemplo muito do ‘build to let’, ou seja, o desenvolvimento imobiliário apenas para arrendamento. Isto porque existe uma conjugação de factores muito grande que impulsiona esse tipo de negócio: taxas de juro baixas, os investidores a procurarem ativos com uma rentabilidade maior, mas com risco diversificado, etc.” Por outro lado, lembra também, profissionalizou-se o imobiliário.  “Existe capital institucional para isso, o que se reflete nos negócios realizados. Os próprios utilizadores estão mais exigentes no imóvel que compram ou arrendam”, alerta. Sumariamente, João Brion Sanches é conciso sobre aquilo que vê no futuro do sector: “No fundo acho que tudo o que é capital intensivo, vai ser gerido em termos profissionais, o que acontecerá com o imobiliário”.