O equilíbrio delicado do puzzle económico mundial

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Tiago Rabaça, Almudena Mendaza, Ricardo Seabra e Pedro Barata. Créditos: Vítor Duarte

Delicados equilíbrios e peças em constante movimento marcam o puzzle económico, financeiro e geopolítico mundial. Os três grandes blocos económicos e mercados enfrentam problemas para os quais não têm uma clara resposta e essa indefinição resulta em diferentes opiniões sobre o caminho a percorrer na gestão de investimentos. É neste contexto que a FundsPeople e a Generali Investiments promovem uma discussão entre quatro profissionais do mercado português, para encaixar - ou tentar encaixar - as peças que faltam. 

“Encontramo-nos num equilíbrio frágil entre um soft-landing e uma recessão”, introduz Tiago Rabaça, analista de investimentos na DWM do Millennium bcp. Para o economista, muitos dos indicadores coincidentes mostram um cenário de resiliência, mas o mesmo não se verifica nos indicadores avançados. “Não vemos uma recessão no horizonte para já, mas os riscos estão enviesados para o downside”, aponta. 

Para Pedro Barata, gestor de carteiras na ASK Patrimónios, os dados da inflação têm-se revelado contraditórios. Se o PIB e o desemprego continuam a alimentar a subida de preços, outros indicadores de mercado suportam o caminho oposto. “Desde o mercado imobiliário nos Estados Unidos em implosão, à contração da massa monetária em circulação, passando pelas commodities que deixaram de ser um elemento de pressão”, estes são fatores que o gestor vê como desinflacionários.

Como realça Ricardo Seabra, gestor de ativos no BiG, depois de um momento muito otimista no início do ano, em que já se estava novamente “a refletir no preço um novo cenário goldilocks”, o mercado foi “confrontado com a realidade dos dados que nos mostraram que a inflação é bastante mais pegajosa do que parecia ser”. Mais preocupante, para o gestor, foi o facto de “essa stickiness ter permeado para a Europa onde, originalmente, se pensava que seria uma situação mais relacionada com o lado da oferta”. Para o profissional do BiG, “começamos a ver agora o empurrão dos salários na Europa e é por isso que o BCE está a manter o discurso hawkish, apesar da situação do setor bancário”. Mas Tiago Rabaça relembra: existe um desfasamento no impacto da política monetária. “Em março tivemos apenas o primeiro aniversário da subida inicial de taxas por parte da Fed, e alguma evidência histórica diz-nos que em média o impacto mais forte chega com 12 a 18 meses de desfasamento. É um pouco assustador por tudo o que isso implica em termos macroeconómicos, mas os efeitos totais das subidas de taxas que tivemos em 2022ainda estão para chegar”, alerta. 

Sobre a crise financeira que espreita nos Estados Unidos e na Europa, Tiago Rabaça considera que, neste momento apenas podemos especular sobre o seu resultado “dada a velocidade com que evoluiu a situação”. Contudo, considera que é um fator que, no mínimo, adiciona ao risco de downside através do impacto que tem no apertar das condições financeiras. Algo que Pedro Barata reforça relevando que “se houver uma crise no setor financeiro é possível que em um ou dois meses vejamos um retrocesso na política monetária”. Na Europa, Ricardo Seabra mostra-se satisfeito com a forma como BCE abordou a crise. “Acho que está a gerir muito bem a situação, separando claramente os dois mandatos e os dois problemas. Um deles que vão atacar com as taxas de juro, o outro que será atacado com medidas específicas de liquidez”, explica. 

Almudena Mendaza, responsável de Vendas Ibérica na Generali Investments, faz a ponte entre a macroeconomia e as empresas, ao canalizar a preocupação com o crescimento de vários dos gestores das boutiques do grupo. “Não falo de crescimento em termos de se vamos ou não entrar numa recessão, mas sim quais vão ser, olhando em frente, os catalisadores para o crescimento dos resultados das empresas”, conta. Para a profissional, o cenário económico não tem impactado sobremaneira as empresas, já que “temos observado resultados melhores do que as expectativas e poucas restrições ao nível da capacidade para financiarem a sua atividade”. 

Por outro lado, levanta o tema da correlação entre as classes de ativos tradicionais. “Voltámos a ver um movimento correlacionado desde o início do ano, o que tem sido positivo, é certo, mas muito difícil de gerir”, diz. Para Almudena Mendaza, “num momento em que toda a gente está subponderada em ações, a questão que se levanta é qual é o momento para voltar a entrar na classe de ativos. Talvez seja o momento para voltar a olhar para alternativos e outras classes de ativos para reforçar o tradicional portfólio 60/40”, alerta. 

Mais a Oriente

E porque nem só do Ocidente se fazem as carteiras de investimento, a segunda maior economia do mundo e o seu potencial foi um tema de discussão. “Estamos muito positivos na China, em particular para a segunda metade do ano”, introduz Almudena Mendaza. “O país assumiu que vai crescer agora a um ritmo mais próximo de 6 ou 7% ao ano. É muito menos que no passado, é certo, mas mais do que suficiente quando comparamos com o mundo ocidental. Com a reabertura vão pôr, certamente, todos os seus recursos ao dispor para atingir esses níveis de crescimento. Adicionalmente, os problemas no setor imobiliário estão maioritariamente para trás e poderá ser mais um driver se crescimento”, detalha a profissional. 

Ricardo Seabra mostra-se de acordo e considera que o país poderá ser “um bright spot este ano”. Viu melhores perspetivas “depois de terem mudado de rumo na estratégia COVID, ao mostrarem-se um pouco mais abertos em termos de negócio e também dada a postura menos hawkish em relação ao imobiliário”. Contudo, realça que vê potencial mais como uma aposta de curto prazo do que uma aposta estrutural. “No passado, aquele que foi um tailwind estrutural, vai-se converter num headwind: a demografia. E, além disso, estão também estão a sentir os efeitos da desglobalização”, conta. 

Estes efeitos são também uma razão para Pedro Barata não estar tão positivo para o investimento na economia chinesa. “Há agora uma tendência clara na Ásia para empresas multinacionais se deslocalizarem da China para outros países com mão de obra mais barata”, aponta. E não é o único argumento. “O setor imobiliário na China é ainda uma questão com muitos problemas para resolver e a guerra comercial com os Estados Unidos ainda não terminou. É claro que as expectativas apontam para que o país continue a crescer bem, mas parece-me que demasiadas peças estão em movimento”, conclui.