Nas últimas duas semanas, o Japão realizou dois leilões de obrigações de longo prazo pelos quais teve de pagar yields históricas: 3,67% para colocar obrigações a 40 anos e mais de 3% para as emissões a 30 anos.
Por detrás destes números, esconde-se uma procura por parte dos investidores que tem vindo a diminuir (no caso do leilão de 30 anos foi a mais baixa desde 1987), à medida que aumentam as preocupações em torno da situação económica e, sobretudo, fiscal do Japão. "Não é nada de novo, mas voltou-se a colocar o foco na elevada dívida, já que isto pode ser um grande problema quando se tem uma yield de 3% e um rácio de 250% de dívida sobre o PIB", afirma Pilar Arroyo, diretora de Investimentos de Obrigações na M&G Investments.
Tamanha é a preocupação que o primeiro-ministro japonês, Shigeru Ishiba, chegou a afirmar que a situação que o Japão atravessa (no que diz respeito à sua dívida) é "pior do que a da Grécia no seu pior momento". Não é por acaso, um aumento das yields da dívida tem aumentado o montante da dívida do país e elevado ainda mais o seu défice fiscal.
O mercado, além disso, teme que o contexto que o Japão atravessa se estenda para além das suas fronteiras. Por exemplo, é necessário ter em conta que o Japão é o maior detentor de obrigações dos EUA no mundo — segundo os dados do Departamento do Tesouro dos EUA, possui mais de um bilião de dólares em dívida americana. Uma baixa procura de dívida japonesa por parte dos investidores pode obrigar o governo do Japão a comprar a sua própria dívida, reduzindo a sua procura por obrigações de outros países e desencadeando, esse é o grande receio do mercado, outra grande crise de dívida. Mais ainda num contexto em que o outro grande mercado de obrigações do mundo, o dos EUA, também atravessa uma situação complicada, com o consequente aumento das suas yields de longo prazo.
Como travar esta espiral
Para já, o que parece estar a ser ponderado pelo Ministério das Finanças do Japão para travar a escalada da yield da dívida, pelo menos nas novas emissões, é ajustar os seus planos de emissão de obrigações governamentais para o ano fiscal atual, potencialmente reduzindo as vendas de dívida de muito longo prazo, segundo informou a Reuters.
Outra forma de travar a escalada da yield das obrigações seria o Banco do Japão pôr fim à sua política monetária de subida de taxas, especialmente porque as perspetivas de crescimento do Japão não são positivas. "Continuamos a pensar que os riscos para o crescimento, a enorme incerteza que sustenta o iene e a moderação da inflação convencerão o BoJ a adiar até ao início do próximo ano a subida de 25 pontos base da taxa de juro oficial que tínhamos previsto para o verão", explica Paolo Zanghieri, economista sénior da Generali Investments. Para já, na sua última reunião no início de maio, o Banco do Japão (BoJ) decidiu manter as taxas de juro de referência de curto prazo nos 0,5%, ao mesmo tempo que reduziu a sua estimativa de crescimento como consequência das tarifas de 1,1% para 0,5% para este 2025.
A este respeito, é importante recordar que as exportações japonesas para os EUA estarão sujeitas, no mínimo, à tarifa universal de 10%, que sobe até níveis de 20% em setores como o automóvel ou o aço, o que é muito, tendo em conta que o Japão é um país claramente exportador. E o iene também não ajuda muito, tendo sido procurado como ativo refúgio nos últimos meses. "Embora um iene mais forte possa reduzir os custos de importação, também encarece as exportações japonesas no mercado global, o que pode travar a procura. Isto é particularmente preocupante para a economia japonesa, orientada para a exportação, que já mostrou sinais de desaceleração no seu crescimento", lembra Daniel Loughney, responsável de Obrigações na MIFL (Mediolaum International Funds).