O universo de oportunidades que a tecnologia representa para as carteiras de investimentos

Apesar da forma como utilizamos o termo tecnologia quando falamos de investimentos, relacionado com semicondutores, computação ou dados, a definição do termo é muito mais ampla do que isso: ciência cujo objeto é a aplicação do conhecimento técnico e científico para fins industriais e comerciais. Aquele indivíduo que tivesse a possibilidade de viajar no tempo da revolução industrial para os tempos de hoje ficaria fascinado com o que chamamos de tecnologia na atualidade, mas não estaria menos impressionado com a evolução exponencial que a tecnologia da máquina a vapor estava a imprimir à sociedade de então. Mas a verdade é que "a tecnologia está em tudo, hoje em dia”, como expõe Raul Afonso, economista-chefe na MFO num debate promovido pela DNB Asset Management, com Mikko Ripatti, responsável ibérico da entidade gestora nórdica, Vítor Ribeiro, sócio da Future Proof e Nuno Sousa Pereira, CIO da Sixty Degrees.

Mikko Ripatti mostra-se plenamente alinhado. "A tecnologia hoje em dia representa quase 30% do MSCI World mas, se pensarmos bem, quase todas as empresas do MSCI World envolvem tecnologia. Acredito que, por exemplo, os bancos que serão os vencedores no futuro serão os que inovam em tecnologia. A mesma coisa nas energias renováveis", diz. E segundo Raul Afonso, até o McDonald's, uma empresa do setor alimentar, “tem um sistema que prevê quantos Big Mac vai vender à hora do almoço. Isso resulta de um algoritmo, é tecnologia. O negócio que viva à parte da tecnologia está condenado".

Setor pouco homogéneo

Contudo, apesar da transversalidade da tecnologia o foco da conversa é no conjunto das empresas que assim são classificadas. Um conjunto que é tudo menos homogéneo. Como explica Vítor Ribeiro, "está disponível e temos a possibilidade de investir numa abordagem mais defensiva ou mais agressiva em setores e subsetores muito diferentes da tecnologia. Devemos recorrer a esses subsetores conforme as necessidades e os objetivos dos investidores”.

Muito embora estejam sempre a surgir novos negócios e novas empresas e o profissional acredite que “quando falamos de inovação, por exemplo, pode ser um fator importante que faça despoletar outro tipo de tecnologias e outros tipos de setores”, “há uma parte do setor da tecnologia que está já muito mais madura. Esta parte consegue repassar os custos de inflação e mostra balanços muito fortes. Isto faz com que consigamos ter carteiras bem diversificadas com a tecnologia, quando há um par de décadas não era tanto assim."

Já para Nuno Pereira, que olha mais para o setor como um todo, a preocupação que tem sobressaído é a falta de diversidade nos índices. “No Nasdaq 100, muitos investidores acreditam que estão a comprar 100 empresas, mas sete dessas empresas pesam mais de 50%. No S&P 500, vemos que os retornos vêm quase todos, este ano, do setor da tecnologia”. Para o CIO "as mega-empresas, muito grandes e concentradas, acabam por absorver a maior parte dos fluxos de entrada no setor, sem que os investidores estejam muitas vezes alerta para esse facto, o que faz com que haja uma grande distorção”.

Como explica, estas “empresas têm capacidade financeira e balanço para adquirir concorrentes. Têm conseguido manter o crescimento porque sempre que veem uma área com potencial, compram os players bons nessa área e integram-nos no seu negócio. Mas são tão grandes, até quando vão conseguir manter esse crescimento?”, questiona. O especialista aponta o caso prático da realidade virtual no caso do Facebook, “que não correu assim tão bem” e alerta para o tema da inteligência artificial que tem recebido o mesmo nível de atenção.

Finalmente, deixa outro grande ponto de interrogação em redor do investimento no setor da tecnologia. "Dado o peso da tecnologia atualmente nos índices, o tamanho dessas mega-empresas que representam a maior fatia dos fluxos de entrada, e os drivers de crescimento que podem não ser suficientes para justificar os múltiplos a que transacionam hoje, até que ponto investir em tecnologia, só porque é o futuro, é o caminho certo para o investimento?"

The winner takes it all

Mikko Ripatti levanta outra questão relevante: será que os líderes dos últimos 20 anos conseguirão proteger o seu reinado? Como finlandês que é, não podia deixar de recordar a hegemonia da Nokia. “Houve uma época em que a Nokia teve mais de 40% de quota de mercado de telemóveis a nível global. Foi a quinta  marca mais valiosa do mundo e a empresa europeia com maior capitalização de mercado. No seu auge, vendia 13 telefones por segundo, 24 horas por dia e 7 dias por semana”, recorda.

Nesta posição de liderança, aparentemente robusta, não conseguiram prever o impacto que o nascimento do iPhone e do sistema Android da Google teria no seu negócio. “A Nokia não conseguiu acompanhar essa evolução. Grandes mudanças podem acontecer e vão acontecer, e os investidores precisam de ficar atentos. Há um pouco do efeito winner takes it all em muitas áreas da tecnologia. Os que conseguem dominar levam para casa  grande parte dos lucros do setor”, aponta. “É um setor onde as mudanças tendem a acontecer muito rapidamente, e faz com que investir no setor tenha que ser de forma ativa, onde os gestores trabalham e dedicam recursos para identificar as melhores tendências", complementa.

Raul Afonso, por seu lado, também vê um grande efeito de winner takes it all. "Num mundo cada vez mais digital, quando falamos de mercados muito competitivos, basta uma diferença muito marginal para uma empresa conquistar quase todo o mercado. Por exemplo, tem-se observado isso nas últimas épocas de resultados entre a Uber e a Lyft”, refere. Segundo o economista, conquistada a liderança do mercado o negócio floresce ainda mais com base, no que chama “externalidades de rede”. “Quanto mais pessoas utilizam uma rede, maiores são os custos para a abandonar", diz.

Adicionalmente, mostra o seu acordo com a diversidade de abordagens de investimento que se pode ter no setor. Há empresas mais concentradas em negócios inovadores e outras empresas que, mais maduras, têm estado em permanente inovação. "Ser mais agressivo acaba por permitir capturar novas tendências que estão a florescer, mas temos visto alguns grandes players mostrar a capacidade para abraçar a transição e de estarem sempre presentes nas tecnologias emergentes. Não é preciso acertar em todas. Quem tem mais recursos consegue construir um portefólio de negócios mais diversificado e menos agressivo. Vemos a Microsoft, por exemplo, que desde a década de 90 até hoje tem-se conseguido reinventar", aponta.