OCDE: "O uso e a disponibilidade de financiamento de títulos corporativos em Portugal permaneceram bastante limitados"

Lisboa Portugal
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“Avaliação da OCDE sobre o Mercado de Capitais de Portugal 2020: Mobilizar o mercado de capitais português para o investimento e o crescimento" é um estudo da OCDE divulgado recentemente que resulta num conjunto de recomendações para o mercado de capitais português e que, segundo a CMVM, “constitui um contributo valioso para a sua dinamização, um desígnio reforçado pelo atual contexto pandémico, bem como para o alargamento de oportunidades para os investidores”.

Entre os diversos segmentos do mercado analisados por este organismo internacional, o mercado de obrigações corporativas não financeiras português esteve também sob o foco da análise e a conclusão: “O panorama do investidor para obrigações de empresas em Portugal é distintamente diferente da maioria dos pares europeus”.

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Em Portugal à data de análise (2019) as instituições financeiras detinham 68% da totalidade dos títulos de dívida de longo prazo (prazos maiores que um ano) emitidos por empresas não financeiras, seguindo-se as seguradoras e fundos de pensões que em conjunto detinham 17% e as famílias que detinham 6%. De forma distinta, como aponta a OCDE, ao nível da UE, as companhias de seguros e fundos de pensões, por via da forma como estes títulos encaixam numa gestão de portefólios em ligação com as responsabilidades esperadas, detinham 38% do total de títulos de dívida de longo prazo (BCE, 2020), sendo que, como está patente no relatório, “a sua presença como detentores de títulos traz padrões de divulgação mais elevados que ajudam a aliviar as lacunas de informação no mercado”.

Como visível na imagem, o investimento direto dos investidores de retalho em títulos corporativos é, regra geral, muito baixo em todos os mercados. No entanto, segundo a OCDE, “os produtos de investimento coletivo podem ajudar a ampliar a base de investidores e permitir que investidores de retalho participem do mercado de títulos corporativos”. A entidade reporta que em Portugal, no final de 2019, existiam 145 fundos de investimento coletivo e que estes, embora incluam nas suas carteiras “uma ampla gama de instrumentos”, apresentavam 3,8 mil milhões de euros ou 29% dos ativos investidos em títulos corporativos nacionais e estrangeiros. “As obrigações cotadas no Luxemburgo, Alemanha e Irlanda representaram 23%, 19% e 17% do total dos investimentos em obrigações, respetivamente. Apenas 3,4% (130 milhões de euros) dos investimentos em obrigações de empresas foram alocados em obrigações de empresas nacionais. No entanto, dos fundos investidos em obrigações estrangeiras, cerca de 180 milhões de euros (4,7%) foram investidos em obrigações emitidas por empresas portuguesas no estrangeiro (CMVM, 2020)”, pode ler-se no relatório.

Limitações

A OCDE comenta, adicionalmente, que “desde a crise financeira global de 2008 e a subsequente crise da dívida soberana na área do euro, o setor bancário português tem passado por uma mudança estrutural que também conduziu a uma desalavancagem do setor empresarial. Embora este desenvolvimento tenha proporcionado uma oportunidade para desenvolver alternativas de financiamento de dívida, baseadas no mercado, o uso e a disponibilidade de financiamento de títulos corporativos permaneceram bastante limitados”.

Recomendações

“Considerando a dependência da dívida de curto prazo do setor empresarial português em relação a outras economias avançadas, uma utilização mais ampla do financiamento por obrigações de empresas poderia ajudar a alongar os prazos, aumentar a resiliência e facilitar os investimentos de longo prazo”, pode ler-se no relatório. Posto isto, e atendendo ao estado atual do mercado de obrigações de empresas em Portugal e aos desafios que as empresas enfrentam no acesso ao financiamento de longo prazo, a sua concretização exigirá “uma abordagem holística” que inclua os seguintes possíveis caminhos.

  • Criação de um mecanismo de classificação de crédito apropriado, em particular,  para empresas de média dimensão que não têm acesso a provedores internacionais de classificação. Modelos, como aqueles em que os bancos centrais desempenham um papel central no fornecimento de serviços de classificação, podem ser avaliados como um mecanismo confiável e credível”.
  • Introdução de um quadro especial para a colocação de títulos privados por empresas menores, seguindo exemplos de sucesso noutros mercados europeus. “Um exemplo promissor para o mercado português poderia ser o enquadramento do mercado de mini-obrigações (mini-bonds), que proporciona um processo simplificado em que as empresas de menor dimensão apenas podem emitir obrigações a investidores qualificados através de vendas diretas ou veículos de propósito específico para titularização”.
  • A iniciativa anterior poderá ser proveitosamente apoiada pela criação de um segmento dedicado na Bolsa de Lisboa à cotação de obrigações, cuja negociação apenas é permitida a investidores qualificados.
  • Considerar medidas para promover a emissão de títulos de empresas estatais e listagem no mercado doméstico, o que ajudará a expandir o mercado e melhorar a liquidez.
  • Com vista a reforçar a coordenação entre as autoridades competentes e a assegurar uma execução eficiente das atribuições, o plano deve atribuir responsabilidades e funções de forma clara ao Banco de Portugal, à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e a outras autoridades públicas.
  • De forma a reconhecer e encorajar o empenho dos participantes da indústria no desenvolvimento do mercado nacional de obrigações de empresas, o plano pode também incluir uma proposta de criação de uma entidade do setor privado que represente exclusivamente bancos de investimento, corretores de obrigações e outras instituições financeiras com atividade no território nacional no mercado de obrigações.
  • Proporcionar flexibilidade aos emitentes de obrigações com prospecto, bem como aos emitentes de obrigações admitidas à negociação num mercado europeu no que respeita aos critérios de autonomia financeira ditados pelo direito comercial português.