TRIBUNA de Fabio Sofía, cogestor da estratégia Regenerative Growth I da Mirabaud AM, e Lionel Artusio, co-fundador da Zebra Impact Ventures. Comentário patrocinado pela Mirabaud Asset Management.
O sistema agroalimentar global encontra-se num ponto crítico, após vários anos de funcionamento com tecnologias e métodos de produção ultrapassados. Estima-se que a população mundial irá atingir 10 mil milhões de pessoas até 2050, o que implica um aumento da procura de alimentos de 56% (fonte: World Resources Institute -2018). O sistema de abastecimento alimentar prepara-se para sofrer uma grande pressão quanto ao seu desempenho.
Por outro lado, a sua sustentabilidade também é posta em causa. Atualmente, 30% das emissões globais de gases com efeito de estufa (fonte: IISD) provêm dos atuais sistemas agroalimentares, os quais são também responsáveis por 70% da utilização de água doce (fonte: SDC). Não esqueçamos que, até ao final dos anos 80, o setor dava prioridade ao retorno da produção, sendo o ambiente o principal prejudicado desta exploração excessiva dos recursos naturais. Atualmente, a produção alimentar é responsável por 80% da desflorestação e tem um impacto negativo na biodiversidade (fonte: WWF). No continente europeu, cerca de 60-70% dos solos utilizados para a agricultura estão a deteriorar-se devido a práticas de gestão não sustentáveis.
Neste contexto, coloca-se a questão de saber como deve evoluir o sistema agroalimentar para responder à procura crescente com recursos limitados. Estamos, portanto, num ponto de viragem, em que é necessária uma transformação urgente e de grande alcance para continuar a alimentar uma população em crescimento, reduzindo simultaneamente o impacto do setor agrícola no ambiente.
Agricultura regenerativa, o epicentro da solução
A agricultura regenerativa refere-se a sistemas de produção alimentar que cumprem uma dupla missão: aumentar a produção de alimentos e respeitar o ambiente, cumprindo os objetivos climáticos e aumentando a biodiversidade. As estimativas sugerem que este tipo de agricultura pode reduzir as emissões globais de CO2 em 5-15% por ano, para além de contribuir para uma terra mais resiliente e próspera (fonte: imd).
Este modelo inclui atividades como o pastoreio planeado, a lavoura mínima para cobrir o cultivo, as policulturas, a agroecologia, a permacultura e a agrossilvicultura. Estes métodos resultam em solos mais ricos, que têm um impacto positivo nos perfis nutricionais dos alimentos cultivados.
Para atingir estes objetivos ambiciosos, a agricultura regenerativa tem um aliado fundamental: a tecnologia. Graças a ela, adapta ferramentas tecnológicas, desde os satélites e drones ou machine learning, aos seus processos tradicionais. Assim, por exemplo, a criação de gado bovino pode transformar-se, com uma abordagem mais sustentável, em criação de insetos com elevado valor proteico e baixas emissões de carbono. Outras tecnologias, como o blockchain e a Internet das Coisas (IoT), também contribuem para o desenvolvimento de cadeias de abastecimento eficientes e para a redução do desperdício alimentar.
O novo modelo para o qual caminhamos está a gerar novas oportunidades de investimento em toda a cadeia de valor alimentar global. No mercado da inovação tecnológica agroalimentar, que deverá atingir 700 mil milhões de dólares até 2030, vemos três setores a impulsionar a mudança em torno da resiliência e da sustentabilidade.
Em primeiro lugar, a agricultura de precisão ou agricultura 4.0 procura tirar partido das mais recentes tecnologias disponíveis para melhorar a eficiência dos recursos e da produtividade, entre outros avanços. Por outro lado, o setor da nutrição alternativa assume o desafio de identificar novas fontes de alimentos para satisfazer as necessidades de uma população em crescimento. Por último, a redução do desperdício alimentar implica a otimização da eficiência ao longo de toda a cadeia alimentar, desde a compra até à logística e distribuição, bem como a reutilização de produtos alimentares habitualmente descartados para reintroduzi-los na cadeia, transformados em produtos atrativos.
A agrotecnologia abre um leque de oportunidades de investimento
O avanço da transformação do sistema alimentar global é muito significativo, mesmo apesar das correções em 2022 devido à recessão dos mercados internacionais. Se estabelecermos um paralelismo com o setor da energia há algumas décadas, encontramos oportunidades sem precedentes. Além disso, o atual panorama macroeconómico abre caminho para o crescimento de empresas que oferecem soluções sustentáveis também mais acessíveis, resilientes e de adoção mais rápida que a das suas análogas.
Para aproveitar esta grande oportunidade, a Mirabaud Asset Management e a Zebra Impact Ventures, uma empresa suíça de capital de risco, uniram forças para travar as alterações climáticas e a perda de biodiversidade, investindo em inovação tecnológica amiga da natureza. O resultado desta colaboração é a estratégia de private equity Regenerative Growth I, que investe em empresas que já oferecem soluções para o sistema alimentar.
Elena Villalba, diretora-geral da Mirabaud Asset Management para Portugal, Espanha e América Latina comenta: "Esta colaboração alinha-se com a nossa estratégia a médio prazo para os ativos privados: selecionamos entidades que tenham a cultura e a experiência necessárias para estabelecer parcerias de sucesso. Ao centrarmo-nos em estratégias de nicho com uma forte orientação para a sustentabilidade, queremos oferecer aos nossos clientes oportunidades únicas, não só para obterem um potencial de retorno real, mas também para contribuírem para a proteção do nosso planeta de forma tangível, com sentido de responsabilidade para com as gerações futuras. A estratégia, classificada como Artigo 9º ex SFDR, centra-se em 20-25 empresas naturtech principalmente europeias com uma alocação indicativa de 70% para a fase de crescimento (série B), uma vez que se tratam de empresas com tecnologia consolidada, tendência positiva registada nas receitas e feedback comercial positivo. Os restantes 30% destinar-se-ão a empresas mais recentes (série A+) que ofereçam soluções altamente inovadoras. O objetivo indicativo é captar 125 milhões de euros".
Por sua vez, Fabio Sofía e Lionel Artusio identificam quatro empresas ativas nestas áreas que consideram particularmente interessantes:
A Pachama, uma empresa que opera no mercado de créditos de carbono com o objetivo de normalizar o processo de verificação e criar uma ligação eficiente entre a oferta e a procura. A empresa treina modelos de machine learning utilizando imagens de satélite, radares e parcelas para estimar o carbono armazenado nas florestas, atualmente e no futuro.
A BettaF!sh, uma empresa alemã que propõe um novo modelo agrícola em resposta à sobrepesca. A empresa desenvolveu uma tecnologia que transforma algas de cultura, regenerativas e nutritivas em produtos do mar à base de plantas como, por exemplo, o atum vegan. Estima-se que o mercado das alternativas ao peixe atinja 1.360 milhões de dólares até 2032, com uma taxa de crescimento anual composta (CAGR) de 5,5% (fonte: GMI).
A Koa Impact, uma empresa que opera no mercado da produção de cacau reciclando a parte do fruto que normalmente é deitada fora. Esta startup, sediada na Suíça, utiliza a energia solar para extrair a polpa do cacau diretamente no Gana, obtendo deste recurso um valor acrescido para os próprios agricultores, para a indústria alimentar e de bebidas. Com a polpa de cacau, a Koa produz novos ingredientes gastronómicos e industriais. Além disso, processa as cascas e transforma-as em biocarvão para os agricultores.
A CleanGreens desenvolve um sistema aeropónico baseado na tecnologia de alta pressão concebido para estufas, adequado para diferentes espécies de vegetais de folha e ervas aromáticas. Estima-se que o mercado aeropónico registe uma CAGR de 9,9% de 2020 a 2026.
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