A Europa está a perder protagonismo!

Carlos_Bastardo
Créditos. Vitor Duarte

Contrariando os dados macroeconómicos, a bolsa americana medida pelo índice S&P 500 já esteve neste mês acima do valor antes de começar a cair em março.

A crise pandémica teve consequências nas formas de consumo, na utilização de serviços e nos métodos/meios de trabalho da população, cada vez mais baseados nas ferramentas tecnológicas e canais digitais. Uma vez que este setor pesa bastante no S&P 500 (cerca de 25%), a valorização das empresas tecnológicas tem determinado a subida do índice.

Nas bolsas europeias não tem acontecido o mesmo, uma vez que a dimensão das tecnológicas europeias não se compara à das americanas. E esta é uma situação preocupante. 

Como europeu, é com tristeza que vejo os blocos EUA e China distanciarem-se da Europa e lutarem pela hegemonia económica e tecnológica no mundo. Fazendo uma comparação, a velocidade na tomada de decisões nestes blocos é do tipo TGV, enquanto que na Europa parece ser a de um comboio normal.

Na Europa, existe um modelo complexo e burocrático de tomada de decisões. Além disso, o espartilho legislativo dos últimos anos, com diretivas atrás de diretivas em vários setores de atividade e especialmente no setor financeiro, tem limitado muito a flexibilidade tão necessária em momentos difíceis como os que atravessamos.

É pena que nas instâncias europeias não abundem quadros com experiência passada na gestão de empresas e com conhecimento prático (e não apenas teórico) da economia real. Na falta deles, os tecnocratas e políticos que andam pelos corredores das instâncias europeias, deviam sair mais dos seus gabinetes e visitar as empresas europeias de diferentes setores, falarem com os seus responsáveis, ouvirem o que estes têm para dizer em matéria de competitividade e o que é necessário para que a Europa inverta a tendência de perda de protagonismo.

Na crise financeira, alguns responsáveis europeus defenderam a criação de uma agência de notação de risco europeia para rivalizar com as americanas. Isto porque na altura, as agências de rating fizeram inúmeros downgrades de rating dos países e empresas europeias. Na altura, escrevi um artigo onde referi que o problema não seria resolvido com uma agência de rating europeia. O problema seria minimizado se os relatórios de crédito das agências fossem pagos pelos investidores e não pelos emitentes.

É pena que este desejo de termos entidades europeias com relevo mundial não aconteça em todos os setores e especialmente no setor tecnológico. Seria bom termos uma tecnológica europeia a rivalizar com as congéneres americanas, como acontece noutros setores de atividade: indústria aeronáutica (Airbus versus Boeing) ou indústria automóvel (Daimler, BMW, Peugeot, Renault, Fiat versus GM, Ford e Tesla).

Quando existem empresas americanas que valem mais que o PIB de algumas economias europeias e do que a capitalização das maiores bolsas da Europa, é um sinal claro de que esta perdeu importância relativa no mundo e, por isso, ou muda rapidamente a trajetória dos últimos anos ou a situação irá piorar. Há dias, em conversa com um amigo meu e a propósito destes temas, ele referiu e com razão que a Europa é um Titanic: continuam entretidos a legislar, por vezes, limitando a atividade económica, sem repararem que já estamos a meter água!

A Apple valia em bolsa no dia 22/9/2020 1.912,2 biliões de USD, a Amazon valia 1.557,6 biliões de USD e a Microsoft valia 1.569,7 biliões de USD. As 6 maiores tecnológicas dos EUA representavam cerca de 25% do S&P na mesma data.

O índice S&P 500 em apenas 4 anos, de agosto 2016 a agosto de 2020, passou de uma capitalização bolsista de 18,82 triliões de dólares para 28,94 triliões de dólares. Na Europa, o índice Stoxx 600 que é constituída pelas 600 principais empresas europeias tem cerca de um terço dessa capitalização bolsista.

São números claros do que acontece dos dois lados do Atlântico e que nos devem fazer refletir. É isto que queremos para a Europa?

Só depende de nós europeus manter ou não o atual status quo. Sei que é difícil e que não se muda o gigante aparelho burocrático de Bruxelas de um dia para o outro. Mas se não começarmos já, tipo trabalho de formiguinha, as próximas gerações irão certamente ter mais problemas.