Emanuel Vieira, CFA (Partners2U): “Se na economia se espera uma evolução positiva, nos mercados de capitais essa evolução pode já ter acontecido”

Emanuel Vieira
Emanuel Vieira, CFA. Créditos: Vítor Duarte

TRIBUNA de Emanuel Vieira, CFA, consultor de investimentos da Partners 2U.

O rumo geopolítico pós-Trump indicia melhor entendimento entre os blocos ocidentais, talvez para melhor competirem com o crescendo da China em termos económicos, militares e presença em grandes instituições mundiais. Os indícios que surgem de alguns entendimentos, tais como o recuo nas tarifas entre EUA e União Europeia e o acordo para acabar com guerra da subsidiação nas construtoras de aeronáutica e até, esmorecem o destaque em crescendo da China no panorama mundial.

Os estímulos fiscais associados aos estímulos monetários deverão permitir uma recuperação económica mais visível nos Estados Unidos e Europa com a reabertura das economias a permitir um aumento do consumo (apelidado por alguns como consumo de vingança), quando comparada com a evolução do primeiro semestre. Na Ásia não se espera uma divergência tão elevada uma vez que as principais economias asiáticas não foram tão condicionadas pela pandemia no primeiro semestre, sendo até possível uma ligeira surpresa negativa devido à reorientação do consumo nos mercados ocidentais para produtos e serviços domésticos em detrimento do comércio online com mais peso de produção na Ásia.

Posicionamento em classes de ativos

Se na economia se espera uma evolução positiva, nos mercados de capitais essa evolução pode já ter acontecido. É possível que os mercados de capitais comecem agora a ajustar-se a outros fatores que já não afetarão a economia este ano, tais como os guidelines dos Bancos Centrais. Nesse prisma a recente surpresa causada por Jerome Powell no seu tom mais hawkish do que seria esperado deixa antever o regresso da volatilidade no segundo semestre de 2021.

As alterações de alocação que se verificaram nos últimos dias apontam uma maior probabilidade de um cenário de inflação controlada (ainda que mais alta do que nos últimos anos) e uma normalização ténue da política monetária da Fed. Este cenário tenderá a beneficiar empresas com elevada capacidade de crescimento, mas com preços aceitáveis (growth at reasonable price) uma vez que as taxas de desconto passarão a ter um peso mais significativo. Neste registo também se tornará mais caro o investimento em obrigações com proteção contra alta inflação (inflation linked) ainda que se mantenha uma acentuada assimetria positiva neste tipo de investimentos, e as obrigações do tesouro norte-americano poderão voltar a ter um papel mais relevante na redução da volatilidade dos retornos dos portefólios, com ou sem cobertura cambial. Este é um cenário que poderá ser menos benéfico para alguns ativos de refúgio como o ouro, ou até a bitcoin.

Como o cenário referido não é certo, continuamos a considerar importante ter alguma exposição a ouro e inflation linked, mas a curto prazo consideramos que as Small Caps norte americanas poderão beneficiar de um pico inflacionista de curto prazo derivado da total reabertura da economia norte-americana e que os mercados mais representados por grandes tecnológicas dependentes do comércio e publicidade online se retrairão um pouco.

Riscos

Um cenário menos provável é o da inflação descontrolada acompanhada de um crescimento anémico das principais economias. Neste cenário tanto ações como obrigações em geral tenderão a perder valor em termos reais, penalizando também portefólios equilibrados e que pretendem dar maior grau de estabilidade para investidores menos tolerantes ao risco. Este é um risco generalizado para os investidores, mas também para a indústria da gestão de ativos e serviços associados ou concorrentes.

Outro risco que nos preocupa é o elevado grau de endividamento das economias atuais, nomeadamente ao nível das empresas. Devemos recordar que em 2020 o mercado de dívida corporate congelou, com falta de liquidez até no mercado monetário, e que desde então o nível de endividamento médio das empresas é superior. Este é um risco associado principalmente a um segmento de mercado, mas que poderá afetar outros como os mercados acionistas.

Fundo de investimento

Entre os fundos de investimento que consideramos interessantes adicionar a um portefólio equilibrado para a segunda metade de 2021 estão o Alger SICAV-Alger Small Cap Focus e o T. Rowe Price US Smaller Companies Equity. Ambos se focam no mercado de ações norte-americanas de baixa capitalização bolsista.

Temas em destaque

A agenda política misturada nos incentivos fiscais que por sua vez assentam/dependem dos estímulos monetários têm naturalmente algum peso na evolução dos mercados de capitais. Como tal não podemos deixar de procurar aprofundar conhecimentos sobre a forma como o tema ESG (ou ASG em português – Ambiente, Social e Governação da Empresa) espelha tais políticas na evolução dos preços dos ativos e nas estratégias das empresas.