João Ricardo Nóbrega, advogado da Raposo Subtil e Associados, Sociedade de Advogados, disseca o impacto previsto da DMIF II no sistema jurídico português, no que toca aos benefícios permitidos.
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Artigo de opinião de João Ricardo Nóbrega, advogado da Raposo Subtil e Associados, Sociedade de Advogados.
Por iniciativa do Conselho Nacional de Supervisores Financeiros (CNSF) foi posta à consulta pública nos primeiros meses de 2017 o anteprojecto da transposição da Directiva dos Mercados de Instrumentos Financeiros - Directiva 2014/65/UE (DMIF II) e do Regulamento dos Mercados de Instrumentos Financeiros – Regulamento (EU) nº 600/2014 (RMIF), que preconizam alterações relevantes na regulação dos mercados de instrumentos financeiros, comercialização de produtos bancários, destinadas a reforçar a proteção e confiança dos investidores, redução de áreas não regulamentadas e reforço dos poderes das autoridades de Supervisão. De salientar que integram este pacote legislativo, para além da DMIF II e RMIF, uma Diretiva Delegada da Comissão que completa a DMIF II, dois regulamentos delegados e diversas Normas técnicas de regulamentação e de execução, previstas em regulamentos delegados ou de execução da Comissão. De salientar que o prazo de transposição da DMIF II pelos estados-membros para a legislação nacional foi fixado para o passado dia 3 de julho de 2017, sendo expectável que o RMIF, que terá aplicação directa no nosso Ordenamento, entre em vigor na mesma data que a Directiva.
Não é novidade que a génese deste novo quadro legal assentou na falta de resposta que a anterior legislação revelou em face do novo panorama de estruturas de intermediação financeira e da evolução dos mercados de capitais. Com efeito, a crise financeira que se vivenciou desde 2008 veio revelar a fragilidade do próprio quadro regulatório, havendo, em consequência que adoptar novos procedimentos e condutas aptas a devolver a confiança aos investidores, obstaculizando condutas menos correctas e mitigando riscos, visando, ultima ratio, a promoção da eficiência e normal funcionamento dos mercados financeiros. Um dos pilares da nova directiva é a Protecção dos Investidores. Neste particular, sujeitamos à análise no presente artigo a matéria referente às novas regras aplicáveis ao pagamento ou recebimento de benefícios – Inducements- decorrentes da DMIFII. Em primeiro lugar, importa dar nota que este regime se encontra disciplinado actualmente no art. 313º do Código dos Valores mobiliários. No que concerne ao background que motivou as principais alterações que adiante se versará, podemos apontar a necessidade que o legislador europeu identificou relativamente ao reforço da protecção dos investidores, nomeadamente em matéria de incentivos, proibição de incentivos a favor dos serviços independentes de consultoria e novas regras sobre deveres organizacionais e de conduta. Em suma, visa-se que os intermediários financeiros (IF) cumpram com os seus deveres de lealdade com os seus clientes, não prejudicando a qualidade dos seus serviços por via do recebimento ou pagamento de incentivos.
Neste âmbito é proposta a alteração ao art. 313º do CVM, no sentido de proibição de benefícios ilegítimos e reforço dos deveres de divulgação de informação, propondo-se, ainda, o aditamento de 3 novos artigos ao CVM referentes a: (i) Benefícios Permitidos - 313ºA - define os requisitos que legitimam o pagamento ou recebimento do benefício, desde que se reforce a qualidade do serviço ao cliente, nomeadamente pela prestação de serviço adicional proporcional ao nível de benefícios recebidos; não se beneficie diretamente a empresa destinatária do benefício sem qualquer vantagem concreta para o cliente e justificado pela oferta de uma vantagem contínua em relação a um benefício contínuo. (II) Proibição de benefícios ilegítimos na prestação de serviços de consultoria para investimento independente ou de gestão de carteiras - 313º B - o IF não pode aceitar ou receber para si qualquer remuneração, comissão ou benefício pecuniário ou não pecuniário, pago ou concedido por terceiro em relação à prestação do serviço aos clientes, com exceção de benefícios não pecuniários não significativos; os IF´s deverão também, no quadro dos seus requisitos em matéria de organização, instituir uma política que garanta que os pagamentos recebidos de terceiros são concedidos ou transferidos aos clientes e, por fim, só devem aceitar benefícios não monetários não significativos desde que sejam razoáveis e proporcionais, reforçando a qualidade do serviço (por exemplo sessões de formação); (iii) Benefícios permitidos relativamente a recomendações de investimento – 313º C – A realização de research por terceiros para os IF´s que prestem serviços de gestão de carteiras ou consultoria para investimento não é considerado benefício ilegítimo desde que seja auferida como contrapartida de pagamentos efetuados diretamente pelo IF através dos seus recursos próprios ou por via de pagamentos a partir de uma conta destinada ao pagamento de research com base em fundos dos clientes. Estamos em que as soluções preconizadas sobre esta matéria irão contribuir, de forma muito positiva, para o melhoramento das relações entre IF´S e respectivos clientes, reforçando a qualidade e transparência dos serviços prestados, bem como a confiança dos investidores.