Inflação, yields da dívida e índices bolsistas

Carlos Bastardo ISEG Imofundos_noticia
Carlos Bastardo. Créditos: Vítor Duarte

Artigo de opinião da autoria de Carlos Bastardo.

Nas últimas semanas, os temas inflação e subida das yields das obrigações do tesouro nos EUA têm dominado as análises económicas.

A yield to maturity (YTM) das obrigações do tesouro a 10 anos nos EUA subiram 25 pontos base (0,25%) no último mês e 78 pontos base (0,78%) no último ano, estando nos 1,62% (dado de 23/03/2021).

Em janeiro de 2020, a YTM das obrigações americanas estava sensivelmente nos mesmos níveis. Nessa altura, período imediatamente antes ao início da pandemia, o índice S&P 500 andava pelos 3250 a 3300 pontos. Hoje, este benchmark está perto dos 4.000 pontos (3910,52 pontos em 23/03/2021).

O Price Earnings Ratio (PER) do índice S&P está hoje significativamente mais elevado que em janeiro de 2020, ou seja, implicitamente as expetativas dos investidores apontam para um crescimento significativo dos resultados líquidos em 2021 em termos médios.

As economias registaram fortes quedas em 2020 e a evolução no primeiro trimestre não se afigura como o desejado, especialmente na União Europeia (UE). Temos assistido a várias dificuldades ao longo do trimestre, especialmente em março, com países como a Alemanha e a Itália, entre outros, a tomarem medidas mais restritivas devido à subida do número de casos positivos do Covid e do número de internamentos.

A diferença do ritmo de vacinação nos EUA e na UE é significativa. Também é bastante diferente o ritmo dos apoios nos EUA e na UE (a bazuca tarda em chegar), o que reflete a grande vantagem de nos EUA termos apenas um governo, enquanto na UE termos 27 governos com distintos interesses políticos e instituições com processos de decisão pesados, logo bastante demorados.

A UE vive neste momento uma subida significativa de casos positivos de Covid e um lento processo de vacinação. A conjunção destas duas situações e a presente tomada de medidas mais restritivas, vai certamente atrasar a retoma económica no 1º semestre ou no pior dos cenários até ao final do Verão, sendo que as economias do sul da Europa serão as mais afetadas dado estarem mais dependentes do turismo.

Contudo, caso se confirmem as estimativas de recuperação económica no 2.º semestre, é provável que exista alguma pressão inflacionista, por via de um maior consumo.

E se tal vier a acontecer, poderá fazer com que as YTM da dívida pública subam, principalmente nos EUA, para níveis de 2% a 2,25% como alguns analistas financeiros internacionais estimam.

Vários investidores, entre os quais alguns dos gurus do mercado obrigacionista, têm nas últimas semanas chamado a atenção para os valores reduzidos da remuneração das obrigações, quer no segmento de investment grade (rating >= BBB- ou Baa3) como de high yield (rating < BBB- / Baa3). Para além da baixa remuneração que este segmento de investimento em ativos financeiros oferece, a questão é que as yields não refletem o risco de alguns emitentes.

E, portanto, se as yields da dívida pública continuarem a subir, logicamente que as obrigações de emitentes com maior risco serão as mais penalizadas.

Na UE, a situação é diferente. Neste momento a YTM do bund alemão a 10 anos ainda é negativa (-0,36%). Será necessário haver mais e melhores evidências do controlo da crise pandémica e da recuperação económica na UE, para que haja uma subida das YTM europeias, tal como tem acontecido recentemente nos EUA.