Investidores nacionais, incentivados ou esquecidos?

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A indústria dos fundos de investimento tem sido marcada, nos últimos anos, por algumas reformas fiscais (no caso dos Organismos de Investimento Coletivo – “OIC”) e alterações dos respetivos regimes jurídicos (no caso dos Fundos de Capital de Risco – “FCR”), que tiveram como principal objetivo dinamizar o investimento estrangeiro e tornar Portugal um destino de investimento atrativo, mormente, no setor imobiliário.

No caso particular dos OICs, a reforma operada em 2015 (com implicações não só no enquadramento fiscal, mas também ao seu regime jurídico) veio alterar drasticamente o paradigma da tributação em torno destes veículos que, até então, contemplavam um sistema de tributação à entrada, passando, portanto, a equiparar-se aos FCR que conferem um sistema de tributação à saída, ou seja, na esfera dos próprios participantes.

Com efeito, é incontornável que as referidas alterações e reformas colocaram Portugal ao nível dos seus congéneres europeus no que respeita à competitividade fiscal em torno destes veículos o que, concomitantemente com as demais alterações fiscais que têm vindo a suceder-se (regime dos residentes não habituais, golden visa, etc), tornaram Portugal um destino de excelência para os não residentes.

Não deixando de aplaudir o mérito destas alterações que, saliente-se, tiveram um impacto positivo por demais evidente na economia portuguesa, impõe-se chamar à atenção para alguns aspetos que decorrem da sua implementação os quais, ainda que óbvios, importa reiterar pela sua relevância.

O primeiro é empírico, ou seja, se os incentivos e regimes fiscais mais favoráveis dirigidos aos investidores não residentes não forem mantidos ou mesmo ampliados, não devemos esperar que o investimento estrangeiro se mantenha com a mesma intensidade, ou seja, estas medidas têm impacto imediato e correlativo na decisão do investidor estrangeiro em investir ou não em Portugal e devem, portanto, ter um crescimento dinâmico ao longo do tempo acompanhando as necessidades do investimento. A segunda é que não devemos esquecer que também o investidor português deve ser incentivado (e não esquecido) a investir mais e melhor em Portugal.

Ora, não sendo este o fórum para discutirmos a (excessiva) tributação ao nível das pessoas singulares em Portugal, o que é facto é que se olharmos, por exemplo, para os OICs (por uma questão de simplicidade apenas abordaremos os OICs de investimento imobiliário, deixando de fora os mobiliários) ou para os FCR, verificamos que uma sociedade residente em Portugal tem um enquadramento fiscal muito menos atrativo quando comparado com o de uma sociedade não residente, senão vejamos.

Em termos muito genéricos, uma pessoa coletiva não residente que obtenha rendimentos decorrentes de unidades de participação (UPs) detidas num OIC (de investimento imobiliário) português, será tributada (à saída) à taxa de 10% através do mecanismo de retenção na fonte  a título definitivo aquando da distribuição. De igual modo, quaisquer mais-valias obtidas pela venda das UPs ou o seu resgate, serão tributadas à taxa de 10% em Portugal.

Por sua vez, no caso de uma pessoa coletiva com residência em Portugal, a mesma será sujeita a retenção na fonte na distribuição de rendimentos derivados de UPs, à taxa de 25%, mas neste caso a retenção na fonte assume a natureza de imposto por conta, ou seja, no final a tributação poderá mesmo ser bastante superior aos 25% (atingindo um máximo de 31,5%). As mais-valias derivadas da venda das UPs ou o seu resgate, também elas são tributadas a uma taxa final que poderá ascender os 31,5%.

Olhando para o caso dos FCRs, o panorama é semelhante, ou seja, uma pessoa coletiva não residente poderá estar totalmente isenta na distribuição de rendimentos derivados das UPs de um FCR sediado em Portugal sendo que, de igual modo, quaisquer mais-valias decorrente da venda dessas mesmas UPs poderão estar isentas de tributação em sede de IRC em Portugal.

Já no caso de uma pessoa coletiva residente no território português, acabamos por ter uma taxa de retenção na fonte de 10% na distribuição de rendimentos derivados das UPs, contudo, mais uma vez, a mesma assume uma natureza de imposto por conta o que significa que a tributação final poderá ascender a níveis máximos superiores a 30%. Também no caso das mais-valias, incidirá IRC às taxas gerais que, juntamente com as derramas municipal e estadual poderá levar a que o fardo tributário ascenda a 31.5%.

Em suma, parece-nos que as alterações legislativas introduzidas, em particular, no que respeita aos regimes fiscais dos OICs e dos FCRs, foram exclusivamente dirigidas ao investimento estrangeiro, tendo-se perdido uma boa oportunidade de procurar atrair o investimento português, no mínimo, através da criação de um regime de tributação semelhante ao dos nãos residentes. Não nos podemos esquecer que o investidor português foi, desde logo, o mais afetado durante os anos de crise (e será, certamente, com a crise que vivemos atualmente) e o que por cá permanecerá se o investidor estrangeiro deixar de olhar para Portugal como uma jurisdição atrativa.

Ainda assim, é absolutamente essencial que o legislador não opte pelo caminho aparentemente mais fácil de vir agora onerar ou retirar alguns benefícios já implementados aplicáveis ao investidor estrangeiro. É fulcral para a economia portuguesa ampliar o investimento estrangeiro e já agora, não esquecer os investidores que temos dentro de casa, também eles capazes de catapultar a nossa economia para níveis recorde (como, aliás já se demonstrou nos anos recentes).