Lições de investimento de 13 crises geopolíticas

STEFAN HOFRICHTER Allianz GI
Stefan Hofrichter, CFA. Créditos: Cedida (Allianz GI)

TRIBUNA de Stefan Hofrichter, CFA, economista-chefe da Allianz Global Investors. Comentário patrocinado pela Allianz Global Investors.

Grande parte do mundo reagiu de forma clara à invasão da Ucrânia pela Rússia: trata-se de uma violação do direito Internacional, de uma séria ameaça à segurança global e uma catástrofe humanitária. Para os investidores, porém, o panorama é mais incerto. Cada novo desenvolvimento parece afetar o preço do petróleo, assolar os mercados financeiros e toldar as perspetivas de inflação.

Em tempos como estes, alguns investidores confiam numa antiga máxima do mercado: "Comprar ao som dos canhões e vender ao som das trombetas"1. No entanto, será realmente uma boa ideia? Para descobri-lo, analisámos a correlação entre as crises geopolíticas e os mercados financeiros, reunindo mais de uma dúzia de momentos num passado não muito distante que apresentam algum paralelismo com a situação atual. (Veja a lista em baixo.)

Na nossa análise, não encontrámos forma de tirar conclusões claras sobre o efeito das crises globais nas ações, obrigações, matérias-primas ou divisas. Houve momentos em que os mercados recuperaram claramente e momentos em que não o fizeram.2

  • Importantes bull-markets pós-crise: depois das duas guerras no Iraque, por exemplo, os mercados apresentaram um bom desempenho. No entanto, acreditamos que houve fatores que influenciaram de forma mais decisiva estas retomas, nomeadamente o fim iminente de uma recessão (1991) ou a recuperação após a bolha tecnológica (2002-2003).
  • Importantes quedas pós-crise: os mercados estavam sob enorme pressão após a invasão da Geórgia pela Rússia em 2008, o que, porém, terá resultado provavelmente da crise financeira global, e não da crise política.

Em muitas outras ocasiões, os movimentos do mercado de ações não foram espetaculares. Em geral, as ações tenderam – em média – a apresentar um desempenho ligeiramente melhor após o início das crises globais. Ao mesmo tempo, ativos "seguros" como os títulos do Tesouro têm sofrido – em média – ligeiros sell-offs, fazendo disparar as suas yields. No entanto, como explicámos nos exemplos anteriores, o desempenho terá sido influenciado primordialmente por fatores não relacionados com as crises. É esta a importante conclusão que tiramos do passado e que não confirma a ideia de "comprar ao som dos canhões". Em vez disso, os investidores devem tomar as suas decisões de comprar ou vender com base na saúde da economia em geral e nas perspetivas setoriais e de evolução dos ganhos.

Como estão a reagir os mercados à crise na Ucrânia

Desde o início do conflito na Ucrânia, não temos assistido a sinais explícitos de pânico, pelo menos nos principais mercados. O chamado índice do medo – o índice de volatilidade, ou VIX – situa-se atualmente em cerca de 35, um valor bastante superior à sua média de longo prazo (cerca de 20), mas longe dos valores extremos (superiores a 50) a que temos assistido nos últimos anos.

A realidade é que, apesar da perceção dos investidores sobre a volatilidade dos mercados, as movimentações de preços têm sido relativamente contidas desde o início das hostilidades entre a Ucrânia e a Rússia. É verdade que o S&P 500 perdeu mais de 10% do seu valor face ao seu máximo no início do ano, mas as avaliações das ações dos EUA continuam ainda a ser bastante altas, quando analisadas num contexto histórico. Além disso, o declínio nos mercados de ações europeus tem sido menos dramático, enquanto os mercados emergentes – excluindo a Rússia, como é óbvio – poucas variações têm evidenciado.

Já os preços do petróleo mostram uma tendência diferente. Houve um aumento significativo nos preços da energia, com o West Texas Intermediate (WTI) e o Brent Crude a serem negociados acima dos 100 dólares, o dobro do que se verificava há dois anos, o que provavelmente terá repercussões no crescimento económico. No passado, a duplicação do preço do petróleo em dois anos levou repetidamente a uma recessão.

Neste contexto, é legítimo perguntar se os bancos centrais, sobretudo a Reserva Federal dos EUA, irão adiar ou mesmo interromper a anunciada normalização da política monetária. Temos as nossas dúvidas, sobretudo devido às perspetivas de inflação. Importa referir que o aumento do preço do petróleo provavelmente desencadeará uma subida das taxas de inflação superior à esperada. Além disso, as empresas e as famílias poderão continuar a subir as suas expetativas de inflação tendo em conta os aumentos dos preços da energia, o que pode, na verdade, agravar ainda mais a inflação – sendo muito provável que a inflação continue acima da meta traçada pelos bancos centrais ocidentais (2% a médio prazo).

Por tudo isto, continuamos, por enquanto, a ser cautelosos em relação às ações. Os mercados desfrutaram de vários anos de forte desempenho, e a crise na Ucrânia poderá desencadear sell-offs adicionais nas próximas semanas.

Estas são as 13 crises que têm afetado os mercados e objeto da nossa análise

Guerra Fria1981Lei marcial na Polónia
1968Invasão da Checoslováquia
1962Crise dos mísseis em Cuba
1956Invasão da Hungria
1953Revolta na Alemanha de Leste (RDA)
Crise petrolífera1979Choque petrolífero após a revolução iraniana
1973Embargo petrolífero da OPEP
Guerras do Golfo2003Segunda guerra EUA-Iraque
1991Primeira guerra EUA-Iraque
Primavera Árabe2011Revoltas no Médio Oriente
Ação militar russa2014Crise da Crimeia (Ucrânia)
2008Invasão da Geórgia
Agressão da Coreia do Norte2017Tensões EUA-Coreia do Norte

1 Esta citação é atribuída frequentemente a Nathan Rothschild, financiador de Londres, 1810.

2 Fonte: AllianzGI research, Refinitiv Datastream. As taxas de rentabilidade do S&P 500 após o início da Primeira Guerra do Iraque (17 de janeiro de 1991) foram de 19,0% para o período de 3 meses e 16,2% para o período de 6 meses. As taxas de rentabilidade do S&P 500 após o início da Segunda Guerra do Iraque (19 de março de 2003) atingiram os 13,8% para o período de 3 meses e 18,6% para o período de 6 meses. Os resultados obtidos no passado não podem ser encarados como indicadores de resultados futuros.