Liquidez e qualidade, catalisadores-chave em Dívida Emergente

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(TRIBUNA de Daniel Moreno, gestor principal dos fundos de dívida emergente na Mirabaud Asset Management. Comentário patrocinado pela Mirabaud AM.)

O rendimento em Dívida Emergente viu-se impulsionado, nos últimos anos, pela liquidez e qualidade. A crise de saúde, e as suas consequências para a economia mundial, acentuaram ainda mais os desequilíbrios estruturais sublinhando a relevância destes aspetos nas nossas estratégias de investimento nestes mercados.

Perante este “backdrop”, as estratégias que investem em todas as tipologias de ativos de Ações Emergentes (obrigações, obrigações soberanas, moeda local e dólar) contam com uma vantagem diferencial para obter um equilíbrio entre a liquidez, a qualidade e a volatilidade. Além disso, esta abordagem dotou-nos da flexibilidade para ser muito ágeis no momento de posicionar o fundo de forma rápida e eficaz após os dramáticos acontecimentos dos meses de março e abril deste ano.

Há quatro aspetos estreitamente relacionados com a nossa resposta ao impacto imediato da COVID e as repercussões a longo prazo da pandemia: o aumento da liquidez, a atenção aos ativos de qualidade, os vieses regionais e uma duração superior ao ponto de referência.

Manter a liquidez para ser mais ágeis

As considerações de liquidez devem ser o primeiro aspeto a valorizar antes de tomar qualquer decisão de investimento em relação à dívida de mercados emergentes, especialmente neste novo contexto – determina o foco do investimento e o processo de seleção de ativos. O objetivo é conseguir a harmonia entre a liquidez do veículo de investimento e a dos seus valores subjacentes.

As condições de liquidez foram um dos principais riscos para as obrigações denominadas em dólar e euro, até antes da crise da COVID-19. A experiência de março revelou até que ponto os operadores de mercado estão expostos a ela. Por isso, tomámos a decisão de dar ainda mais peso à liquidez dentro do fundo.

Em consequência, modificámos significativamente a nossa abordagem para as áreas com maior liquidez do universo de investimento, tanto em divisas fortes (euro e dólar) como em moeda local. Por exemplo, as nossas posições fora do índice de referência, que no início do ano constituíam 50% da carteira, agora estão abaixo dos 15%. Além disso, a nossa procura por liquidez significa que 75% da carteira está posicionada em obrigações com um nocional mínimo de 500 milhões de dólares (ou equivalente) e cerca de metade destes tem um nocional de 2.000 milhões de dólares ou mais.

A procura de liquidez também significa que a exposição à dívida em moeda local é fundamental, já que este segmento do mercado representa mais de 80% de toda e dívida emergente. A exposição em moeda local representa agora cerca de 45% do fundo.

Mantemos o nosso foco na qualidade

Dados os prováveis efeitos a longo prazo da COVID-19 na economia mundial, acreditamos que a incerteza dos próximos anos justifica uma maior exposição a ativos de maior qualidade. Para nós, isto traduz-se em países com balanços sólidos e flexibilidade de políticas, em conjunto com empresas com modelos de negócio resistentes que possam abrir caminho para um contexto de maior incerteza económica.

Hoje em dia, o crédito “investment grade” constitui 63% da carteira, com um aumento da classificação média de BBB, comparado com os 37% das obrigações “high yield”. A gap entre as obrigações de “investment grade” e as de “high yield” foi ampliada consideravelmente. Por exemplo, o spread médio do crédito soberano de “high yield” é agora 4,2 vezes maior que o do “investment grade”**. Dadas as implicações da COVID-19 para a economia mundial, o alcance deste spread poderá durar muito mais do que o se esperava inicialmente. No caso de empresas em mercados emergentes, esta diferença é só de 2,5 vezes**, o que é indicativo da qualidade média superior subjacente face ao soberano.

Aumento das oportunidades na Ásia

A pandemia destacou a Ásia de forma positiva: acreditamos que região está melhor posicionada para ultrapassar a desaceleração do crescimento mundial. Como resultado, a nossa alocação à região duplicou cerca de 30%.

Grande parte deste investimento centrou-se na China, que já voltou a ter um forte crescimento, tendo saído da crise da COVID-19 antes da maioria dos países. O Fundo Monetário Internacional está agora mais positivo quanto às perspetivas de crescimento da China, e acreditamos que é provável que este aumento da atividade económica tenha um impacto positivo em toda a região da Ásia. O crescimento do PIB*** de 4,9% registado na China no terceiro trimestre destaca a forma como a pandemia está a acelerar o ritmo a que a sua economia está a alcançar a velocidade da dos Estados Unidos.

A China foi beneficiando pouco a pouco da inclusão de uma série de índices mundiais-chave, sendo o recente dos quais o FTSE Russell World Government Bond Index. Na nossa opinião, isto aumentará a procura por Obrigações da China, que oferece um rendimento nominal e real mais alto do que os equivalentes dos EUA, assim como o potencial de apreciação da moeda. Durante a pandemia, o Banco Popular da China adotou medidas de estímulo que implicaram a provisão de liquidez, mas deixou a política monetária praticamente intacta, o que significa que as taxas de juro reais se mantiveram a um nível mais alto. Isto fez com que as obrigações chinesas se tornassem atrativas para os investidores estrangeiros que procuram lucros num contexto de baixo rendimento.

O risco de duration mudou estruturalmente

Na nossa opinião, a intervenção no mercado por parte da Reserva Federal dos EUA (Fed) alterou fundamentalmente a estrutura de todas as obrigações denominadas em dólares dos EUA, incluindo as obrigações EM Hard CUrrency, especialmente aquelas classificadas como “investment grade”.

Além disso, a volatilidade das obrigações do tesouro diminuiu, já que a Reserva Federal reduziu as taxas para zero e recentemente afirmou que estas não serão aumentadas até pelo menos 2024.

Em consequência, a volatilidade que emana da duration das obrigações denominadas em dólares dos Estados Unidos foi reduzida de forma considerável e, na nossa opinião, provavelmente não será a única medida adequada para avaliar o risco no futuro.

Muitos bancos centrais dos mercados emergentes adotaram também políticas monetárias fáceis e programas de flexibilização quantitativa e prestam um maior apoio aos seus respetivos mercados de obrigações.

Além disso, a procura por rendimento, e, ao mesmo tempo de qualidade, mudou sem dúvida alguma das preferências dos investidores quanto a crédito e vencimento, e muito provavelmente continuará ao longo de 2021. Neste contexto de maior intervenção no mercado e os baixos níveis de inflação, justifica-se uma maior duration, e atualmente estamos posicionados um ano a mais do que o nosso ponto de referência, cerca de sete anos.

Por fim, estamos a investir em obrigações de qualidade em países com balanços sólidos e em empresas com modelos de negócio resistentes que podem suportar um contexto económico prolongado e débil. Isto posiciona o nosso fundo Global Emerging Market Bond para mitigar a volatilidade que possa surgir nos próximos meses. O nosso foco na qualidade e a liquidez também implica que podemos reagir rapidamente perante qualquer mudança na dinâmica do mercado.

Apesar da incerteza, o fundo encontra-se numa posição sólida face a 2021, um ano de grandes oportunidades para os investidores em dívida de mercados emergentes, que acreditamos que se verá impulsionado pela redução dos spreads de crédito e a debilidade do dólar americano.

Fontes

* Ashmore, agosto de 2020, The EM Fixed Income Universe Version 9.0

** Mirabaud Asset Management, 19 de outubro de 2020

*** Tradingeconomics.com.