Numa altura em que tanto se discute se, quando e como poderá a inteligência artificial orientar e monitorizar as reações dos investidores, são bem-vindos todos os ensaios legislativos de maior exigência de conhecimento e independência por banda dos profissionais a quem o cidadão comum confia as suas poupanças.
Na sequência da entrada em vigor da MiFID II, cada Estado-Membro tem adoptado a legislação interna necessária à sua adequada implementação. Entre nós, a CMVM tomou a dianteira com o Regulamento n.o 3/2018, publicado no Diário da República, 2.a Série, N.o 165, de 28 de Agosto de 2018.
Nele o regulador definiu os conteúdos mínimos exigidos a dominar pelos consultores autónomos e colaboradores dos Intermediários Financeiros (IF) no âmbito da prestação de serviços de consultoria para investimento, gestão de carteiras por conta de outrem, informações a investidores sobre produtos financeiros e serviços de investimento principais ou auxiliares e fixou também as qualificações e aptidões profissionais exigidas a estes profissionais.
Como densificação dos critérios e patamares enunciados, o diploma do regulador dos mercados impõe, como formação contínua, 130 horas anuais para os consultores autónomos e 80 horas para os colaboradores de bancos e demais IF.
Aos intermediários financeiros impõem-se as obrigações de assegurar a formação contínua dos seus colaboradores em mínimos anuais de 30 horas (para as actividades de consultoria de investimento ou gestão de carteiras por conta de outrem) e 20 horas (para a prestação de informações a investidores), mas atribuem-se-lhes duas importantes prerrogativas: a faculdade de fixação de um número inferior de horas de formação ou mesmo a dispensa total.
Quanto à avaliação e certificação de conhecimentos, ela pode ser interna ou externa aos próprios intermediários financeiros e deve assegurar a realização de provas presenciais adequadas ao conjunto de conhecimentos em causa e exigir aproveitamento de pelo menos 70% documentalmente comprovável perante a CMVM, a solicitação desta entidade. E, se estiver salvaguardada a qualidade da avaliação, diz o Regula- mento que as provas relativas às acções anuais de formação poderão ser não presenciais.
Ordena a mesma lei que aos consultores autónomos se aplique o regime que rege os colaboradores dos intermediários financeiros que prestam consultoria para investimento, sendo aqui válido também, mutatis mutandis, a disciplina enunciada quanto às exigências referentes às qualificações e respectiva avaliação e certificação de conhecimentos.
Para o requisito experiência profissional adequada, fixa-se o mínimo legal de seis meses a tempo inteiro ou o equivalente a tempo parcial.
A demonstração de conhecimentos deverá conter apresentação do(s) programa(s), datas, horas e participantes da formação e uma informação da unidade de controlo do cumprimento que dê conta da correspondência dos conteúdos às exigências a que se refere o Regulamento ou apresentação de certificado(s) de conhecimentos obtidos de modo idêntico ao descrito para os intermediários financeiros e com uma nota informativa da unidade de controlo do cumprimento que dê conta da respectiva correspondência. Anotamos outrossim que as possibilidades preditas de comprovação de conhecimentos são sem prejuízo da frequência futura de acções de formação anuais e até à entrada em vigor do Regulamento, como o próprio diploma legal ressalva.
A entrada em vigor do Regulamento CMVM n.o 3/2018, acontece a dois tempos: um já aconteceu cinco dias após a sua publicação (ou seja, dia 2 de Setembro de 2018) e outro está para acontecer, pois para os consultores autónomos e para os colaboradores dos IF o início de vigência começa só seis meses após a entrada em vigor (ou seja, dia 2 de Março de 2019).
Esta vacatio legis visa, de seguro, permitir aos profissionais em causa a capacitação devida para a nobre actividade de informar e auxiliar os investidores não profissionais nas tomadas de decisão.
Numa altura em que tanto se discute se, quando e como pode(rá) a inteligência artificial orientar e monitorizar as reacções dos investidores, são bem-vindos todos os ensaios legislativos de maior exigência de conhecimento e independência por banda dos profissionais a quem o cidadão comum confia as suas poupanças. Honrar a confiança é palavra de ordem!