Os indicadores da banca de 2022 são robustos

Carlos Bastardo
Carlos Bastardo. Créditos: Vítor Duarte

TRIBUNA de Carlos Bastardo.

Este é o meu 120º artigo mensal da newsletter FundsPeople. É verdade! Foi há 10 anos que a convite da Carolina Vieira, iniciei este processo que já vai longo. 

O país estava numa grande crise e encontrava-se sob proteção dos credores, uma vez que em maio de 2011 o governo socialista da altura não teve outra alternativa que não solicitar o apoio de 78 mil milhões de euros financiado pela troika.

Desde 2011 e até 2015, o país fez algumas reformas impostas pelos credores. Contudo, desde que a troika saiu do país, as reformas que o país necessita para crescer anualmente bastante mais do que tem acontecido neste século, pouco evoluíram.

Com a evolução favorável do turismo, particularmente nos anos de 2018 e 2019, a economia portuguesa evoluiu favoravelmente. Com os seus prós e contras, a verdade é que o turismo arrasta consigo muitas atividades a jusante e a montante.

Quando a economia portuguesa e europeia estava a recuperar da crise financeira, eis que surge a crise pandémica no início de 2020 e a invasão da Ucrânia pela Rússia em fevereiro de 2022.

Nestes 10 anos, escrevi sobre vários temas que considero importantes, desde a evolução macroeconómica, a banca, os mercados financeiros, a poupança, o problema estrutural da pirâmide de idades (baixa natalidade, população das mais envelhecidas da Europa e do mundo), as reformas que o país necessita fazer em diferentes áreas, entre outros temas que foram abordados nos 119 artigos anteriores.

Tendo trabalhado na banca muitos anos (inicialmente em auditoria, mas depois mais de 25 anos em mercados financeiros e private banking), achei que seria interessante falar neste artigo sobre alguns indicadores da banca, numa altura de subida das taxas de juro e de arrefecimento do crescimento económico.

Vou falar da banca em geral, com base na síntese de indicadores do setor bancário da APB relativa a setembro de 2022.

O ativo do setor bancário atingiu em setembro de 2022 um valor de 463 mil milhões de euros, sendo que os empréstimos a clientes representavam 54,6% desse valor. Os depósitos de clientes representavam 69% desse valor.

Desde o final de 2017 (cerca de 5 anos antes face a setembro de 2022), o ativo do setor bancário subiu 21,5%. Os empréstimos a clientes cresceram no mesmo período cerca de 9,5% e os depósitos de clientes cresceram cerca de 28%.

Perante esta evolução do crédito e dos depósitos, o rácio de transformação (crédito / depósitos) baixou de 92,5% em 31/12/2017 para 79% em 30/09/2022.

Relembro que no período antes da crise financeira, alguns bancos nacionais chegaram a ter um rácio de transformação superior a 130% em média, chegando em alguns casos a 160%.

Existem várias razões para esta descida significativa do rácio de transformação: com a crise financeira e mais particularmente após o resgate do país, os bancos tiveram de desalavancar, vendendo ativos, reestruturando o seu financiamento, implementando processos de análise e controlo do crédito mais exigentes e gerindo com base numa legislação europeia mais restritiva em termos de controlo de rácios de solvibilidade e da sua atividade em geral.

Os bancos têm hoje uma situação confortável e muito diferente da que tinham há 10 anos. O rácio common equity Tier 1 (CET1) do setor estava nos 14,6% em setembro de 2022 (13,9% em 31/12/2017). O rácio de solvibilidade total estava em 17,1% em setembro de 2022 (15,2% no final de 2017).

Ao nível económico, o produto bancário estava em 30/09/2022 nos 8.231 milhões de euros, menos 23,6% que em 31/12/2017. A margem financeira totalizava 5.186 milhões de euros em 30/09/2022, um valor 15% abaixo do registado em 2017. Naturalmente que o prolongado período de taxas de juro próximo de zero teve efeitos negativos na margem financeira. 

Apesar deste facto, os bancos souberam adaptar-se à realidade, desenvolvendo processos de corte de custos e de ganhos de eficiência. O rácio cost-to-income (custos operacionais / produto bancário) estava em setembro de 2022 nos 49,9% quando em 2017 era de 52,8%.

Com o início da subida das taxas de juro, os bancos em geral têm um fator positivo para ganhar mais dinheiro e um fator negativo de terem de reforçar as provisões face ao incumprimento do crédito. De todas as formas, o valor das imparidades face ao produto bancário passou de 31,6% em 2017 para 6,3% em setembro de 2022 e o custo do risco desceu de 0,98% para 0,21% no mesmo período.

O valor bruto dos NPL (Non-Performing Loan), ou seja, o crédito não produtivo, passou de 37 mil milhões de euros em 2017 para 10,8 mil milhões de euros em setembro de 2022. O rácio de cobertura de NPL passou no mesmo período de 49,4% para 53,6%.

Portanto, é evidente o bom estado de saúde da banca em 2022, quando comparado com a situação de há 10 anos. Evidentemente que tal não desobriga o management dos bancos de continuar a atuar em função das dificuldades que poderão ocorrer na economia durante este ano.

Os bancos europeus têm estado a apresentar os resultados do 4º trimestre e do ano de 2022 e genericamente, foram bons. A cotação das ações dos bancos reflete isso mesmo nos últimos meses, especialmente desde outubro de 2022.