Os principais constrangimentos da economia portuguesa

Carlos Bastardo
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O PIB do primeiro trimestre de 2017 cresceu face ao período homólogo de 2016 cerca de 2,8%, acima da média da UE (2%) e cresceu face ao quarto trimestre de 2016 cerca de 1% (acima dos 0,5% da UE).

O crescimento do PIB foi motivado pelas exportações e pela recuperação do investimento, devido sobretudo à canalização de fundos estruturais nos primeiros meses do ano.

Numa perspetiva otimista, caso não ocorram factos negativos até final de 2017, poderemos estimar um crescimento acima de 2% este ano (entre 2,2% e 2,5% consoante as previsões de vários economistas). Portugal é uma economia aberta e de reduzida dimensão, logo extremamente dependente da envolvente externa, do investimento e das reformas (algumas por completar e outras por fazer).

Estamos a viver um bom momento no fluxo turístico (positivo para a imagem do país e para as exportações) e as verbas do programa de investimento do Portugal 20-20 foram distribuídas a um bom ritmo no primeiro trimestre do ano.

Contudo, a médio e a longo prazo, a economia portuguesa mantém constrangimentos, alguns dos quais urge continuar a resolver. A ordem que apresento é aleatória, pois todos eles pesam negativamente na sustentabilidade da dinâmica económica do país.

O primeiro constrangimento é a base do modelo económico: mais peso do consumo privado e menos peso do investimento e das exportações. Este problema está a ser gradualmente corrigido. Hoje as exportações pesam mais de 40% do PIB quando em 2010 pesavam 26%. O investimento é mais complicado de corrigir, em boa parte devido ao segundo constrangimento: o excessivo endividamento do Estado e das empresas.

Relativamente às empresas (do Estado já falei em anteriores artigos), estão em geral muito endividadas. Verificamos que o indicador de autonomia financeira (capitais próprios / ativo) é em média muito baixo. Os indicadores de cobertura dos encargos financeiros pelo resultado operacional (EBIT) ou pelo cash-flow operacional (EBITDA) ficam bastante aquém do desejável e os indicadores que comparam a dívida financeira e o cash-flow operacional (Net Debt / EBITDA) são elevados. A forma de resolver o problema é o reforço dos capitais próprios e encontrar outras fontes de financiamento que não apenas o endividamento bancário. Mas para tal, é necessário mudar a mentalidade de muitos empresários, tarefa que não é fácil.

O terceiro constrangimento é o elevado custo da energia. Com base nos dados do Eurostat, verifica-se que no segundo semestre de 2016, o custo de eletricidade em Portugal era dos mais elevados da Europa (apenas atrás da Dinamarca, Alemanha e Bélgica), 23,64€ por 100 Kwh contra uma média europeia de 20,5€. Por sua vez, o preço do gás natural era em Portugal de 8,26€ por 100 Kwh contra um valor médio europeu de 6,4€. Pagamos a eletricidade e o gás natural mais caro cerca de 15% e 29% respetivamente, o que de facto é negativo para as empresas e para as famílias. E já não falo dos combustíveis, cujos preços também são dos mais elevados da Europa, com uma carga fiscal asfixiante. Este é um fator que não ajuda à competitividade das empresas portuguesas.

O quarto constrangimento é o pilar da educação. A OCDE referiu recentemente que apesar das melhorias nos últimos 15 anos, os alunos portugueses têm uma carga horária escolar pesada, recomendando privilegiar a qualidade do ensino à quantidade de horas de aulas. Eu acrescento mais duas questões: os cursos profissionais deveriam ser mais promovidos (a nível industrial e comercial) e alguns programas do ensino secundário deveriam ser revistos, especialmente o programa de matemática. Para um aluno da área de economia por exemplo, não faz qualquer sentido o atual programa de matemática, em que a matéria dada com mais extensão é direcionada para quem quer seguir engenharia, em detrimento de matérias como a estatística e o cálculo financeiro. Os docentes do ensino universitário da área de economia e gestão sofrem com a falta de bases dos alunos, quando estes chegam a este patamar. Nos 10º, 11º e 12º anos, os programas deveriam ser mais direcionados, tendo em conta as necessidades futuras dos alunos que vão para economia, gestão e finanças (escrevo com conhecimento de causa) e logicamente para os restantes cursos universitários.

O quinto constrangimento é a pouca estabilidade do quadro legal e principalmente do quadro fiscal. Todos os anos assistimos a muitas mudanças e alterações, que obriga a gastar tempo e dinheiro. Porque é que as leis têm que mudar tanto de um ano para o outro? Será que existe alguma correlação com a quantidade de advogados (muitos deles ligados a grandes escritórios) que são deputados?

O sexto constrangimento tem uma natureza estrutural. Muitos empresas são Estado dependentes, subsídio dependentes e banco dependentes. Logicamente que tal deve-se à dimensão excessiva do Estado. Quando o poder económico e o poder político estão demasiadamente interligados, o risco de problemas de governance é grande, aliás como temos visto nos últimos anos.

O sétimo constrangimento tem a ver com algumas decisões de investimento mal direcionadas no passado e cujo fardo financeiro ainda estamos a pagar. Por exemplo, temos uma rede de autoestradas de dimensão superior à necessária (basta ver o reduzido tráfego médio diário em algumas delas) e assistimos ao longo dos anos às chamadas megalomanias quer do setor público como do setor privado. Felizmente que a UE tem endurecido os critérios de atribuição de fundos estruturais, pelo que, o risco de voltarmos a ter projetos de investimento que pouco ou nada contribuem para a economia é hoje mais reduzido. Como se costuma dizer, “depois de casa roubada, trancas à porta”!

Podia referir mais constrangimentos como por exemplo o estado da justiça que carece de uma profunda reforma, mas o artigo já vai longo. Fica para a próxima!