(Artigo de opinião da autoria da equipa da Sixty Degrees)
A política monetária expansionista executada, de forma sincronizada, pelos vários Bancos Centrais no último ano, deverá permitir que a economia mundial registe, em 2020, uma ligeira melhoria, mas sem grande exuberância.
A economia americana deverá continuar a destacar-se positivamente face às demais economias desenvolvidas, prolongando o seu ritmo de crescimento e evitando a tão apregoada recessão (“sinalizada” pela inversão da curva de rendimentos durante o 3º trimestre de 2019). O consumo das famílias, que representa mais de dois terços do valor do PIB, deverá continuar a registar um desempenho sólido, assente também na forte dinâmica do mercado de trabalho.
O impacto absoluto da guerra comercial com a China sobre a economia americana deverá continuar a ser reduzido, tal como parece ter sido comprovado pela superação de estimativas económicas ao longo do ano 2019. De facto, as importações provenientes da China pesam apenas 3% no PIB americano, enquanto as exportações dos EUA para a China correspondem a um valor inferior a 1% do PIB dos EUA.
Um dos fatores que consideramos essencial para 2020, passa pela permanente monitorização do mercado interbancário (repo market) americano. A turbulência neste mercado tem obrigado a Fed a intervir ativamente, injetando liquidez, situação esta inédita desde a crise financeira de 2008/9. Não foi ainda apresentada qualquer explicação razoável para a situação que se vive nesse mercado.
Outro risco inesperado, em 2020, poderá ser o surgimento de um segundo processo de destituição do Presidente Trump. O envio, pela maioria democrata no Congresso, do atual processo de destituição para o Senado poderá estar condicionado pela decisão dos tribunais de obrigar o antigo assessor da Casa Branca, Don McGahn, a testemunhar perante o comité judiciário. Os democratas poderão tentar assim acusar o presidente de obstrução à justiça, abrindo caminho para um segundo processo de destituição que provavelmente se prolongaria até às eleições de novembro.
No que respeita à economia da Zona Euro, antevemos um crescimento lento, aquém das restantes geografias avançadas. A política monetária expansionista levada a cabo pelo BCE poderá evitar a recessão, mas continuará a falhar na reativação de um ritmo vigoroso de crescimento económico.
O programa de Quantitative Easing deixou de ser uma intervenção temporária no ciclo económico para se tornar numa detenção permanente da dívida dos Estados por parte do BCE, sob pena de assistirmos a uma subida das yields soberanas que colocaria em cheque os orçamentos dos governos europeus, na sua maioria ainda muito endividados. Em 2020, será anunciada a revisão de política do BCE, executada pela sua nova presidente Christine Lagarde.
A tudo isto convirá acrescentar alguma incerteza em torno da negociação do Brexit. Desde a vitória esmagadora de Boris Johnson nas eleições de dezembro que os sinais de stress do lado da União começaram a fazer-se sentir.
A economia do Reino Unido poderá registar um comportamento positivo em 2020. Os benefícios poderão advir de uma redução na incerteza política, após a vitória com maioria absoluta do Partido Conservador nas eleições do passado dia 12 de dezembro, bem como da potencial expansão de política fiscal defendida pela generalidade da classe política.
O crescimento da economia chinesa deverá registar um ligeiro abrandamento em 2020. As empresas têm potencial para registar um bom crescimento de resultados, tendo em conta os níveis sustentados da procura. Relativamente aos mercados emergentes, em especial na América Latina, espera-se uma recuperação moderada no crescimento económico em 2020. A recuperação do comércio proveniente de um período de maior acalmia na guerra comercial EUA-China deverá ser benéfica para estas economias. Continuamos a acompanhar a evolução da instabilidade social nalguns países, que foram palco de manifestações violentas em 2019. A esse respeito merecerão especial atenção o Chile, a Bolívia, o Perú e a Venezuela.
O dólar deverá ter espaço para continuar a valorizar-se tendo em conta a esperada outperformance da economia americana. A moeda americana deverá continuar a beneficiar do direcionamento dos fluxos de capitais internacionais para os EUA, em fuga das regiões economicamente mais frágeis, como a Europa e o Japão.
Para 2020, a nossa visão para a dívida soberana é desfavorável. Na Europa, o investimento em obrigações soberanas é pouco atrativo, tendo em conta o contexto de taxas de juro historicamente baixas e/ou negativas e o facto de já não constituir um ativo de refúgio no caso de agravamento de problemas económicos no bloco europeu. Nos EUA, a dívida soberana, que ainda apresenta taxas de juro positivas, poderá registar um retorno ligeiramente positivo em 2020, suportado por baixas pressões inflacionistas e pela função de ativo de refúgio em caso de stress. Relativamente à dívida soberana de mercados emergentes, o eventual potencial de valorização (devido a yields iniciais mais elevadas) e potencial benefício em caso de manutenção do cenário de baixa volatilidade, escondem o risco proveniente da eventual apreciação do dólar devido ao aumento do endividamento em moeda estrangeira nos últimos anos, sendo necessária uma seleção criteriosa dos emitentes e dos prazos de investimento.
Neste contexto, mantemos a nossa preferência de médio prazo para o mercado acionista norte americano sem cobertura do risco cambial. No que respeita à evolução dos resultados de empresas, consideramos que a desaceleração verificada em 2019 foi normal à luz dos difíceis comparáveis de 2018, decorrentes do pacote de redução de impostos do presidente Trump. Para 2020 estão reunidas as condições para que as empresas voltem a ver crescer os seus resultados.