Márcio Carreira Nobre, of counsel da TELLES, acredita que o mercado de Portugal poderá ficar em desvantagem devido a um diferente entendimento quanto à questão dos bridge loans.
Independentemente do circunstancialismo económico, regulatório ou financeiro de cada época, há uma preocupação que estará sempre presente nas mentes daqueles cuja atividade passa por gerir o património de terceiros: atrair o investimento procurando soluções cada vez mais rentáveis. Nesta linha, os bridge loans a fundos de capital de risco são uma importante ferramenta das entidades gestoras na medida em que permitem reduzir o tempo decorrido entre as chamadas de capital aos investidores e o retorno desse investimento bem como permitem aos investidores conhecer antecipadamente as chamadas de capital.
Os bridge loans embora não sendo propriamente uma ferramenta nova no mercado, foram reconhecidos nos últimos anos, pelos reguladores na União Europeia, como uma ferramenta ao dispor das entidades gestoras de fundos de capital de risco, na gestão dos compromissos de capital assumidos pelos investidores, uma vez que foram excluídos do cálculo do efeito de alavanca.
A exclusão dos bridge loans deste efeito de alavanca é importante porque confere maior flexibilidade às sociedades de capital de risco enquanto sociedades gestoras, na medida em que o recurso a crédito nestes casos não afeta a contabilização dos limiares relevantes (i.e. podem ter ativos sob gestão até 100M€ com recurso ao efeito de alavanca ou 500M€ sem recurso a esse efeito). Quando esses limiares tenham sido ultrapassados de forma definitiva, as sociedades de capital de risco enfrentam uma de duas opções: (i) desinvestem ou (ii) convertem-se em sociedades gestoras de fundos de capital de risco ou sociedades de investimento em capital de risco, consoante o caso. Esta última opção acarreta obrigações regulatórias que se traduzem em custos acrescidos e maior complexidade.
De acordo com o Regulamento (UE) n.º 231/2013 são expressamente excluídos do cálculo do efeito alavanca os acordos de crédito que estejam assegurados pelos compromissos contratuais de injeção de capital assumidos pelos investidores, desde que tenham uma natureza temporária. Contudo, ficou por definir como e quando esses bridge loans devem ser considerados no conceito de “alavanca”. Aqui, o legislador comunitário apenas clarificou que os financiamentos “revolving” não são considerados temporários e, por isso, serão contabilizados no cálculo do efeito alavanca. Essa não definição da “natureza temporária” foi intencional (ESMA/2011/379) na medida em que confere às autoridades competentes de cada país alguma liberdade na aplicação do conceito.
Em jurisdições como a França e Luxemburgo a tendência do mercado e reguladores tem sido clara no sentido de aceitar como temporários os financiamentos com prazo de vencimento até 364 dias, i.e., inferiores a um ano.
Em Portugal, o enquadramento jurídico permite um entendimento equivalente. O Decreto-Lei n.º 58/2013 que, entre outros, regula o regime da contagem das operações de crédito, define como de “curto prazo” os créditos contratados com vencimento que não exceda um ano. Ora, por natureza, um financiamento que se pretenda temporário será sempre um financiamento de curto prazo. Assim sendo, entendemos que os financiamentos (com prazos inferiores a um ano) de compromissos de capital a fundos de capital de risco devem ser excluídos do cálculo do efeito de alavanca.
Um entendimento diverso deste colocará, necessariamente, o mercado de private equity em Portugal e os seus agentes em clara desvantagem face às demais jurisdições europeias. Num momento em que com a ocorrência do Brexit muitos players estão a realinhar o seu posicionamento e estratégias, é fundamental que Portugal não perca competitividade, fruto do desalinhamento com outros mercados da União Europeia.