Artur Vieira, CFA, da Baluarte Wealth Advisors, lembra que a Primeira Revolução Industrial foi um grande salto evolutivo para a humanidade... mas o que está por vir poderá ser ainda mais disruptivo.
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Podemos concordar que a evolução faz parte do nosso ADN e neste caso não me refiro à evolução no sentido darwiniano, refiro-me à evolução que permitiu que várias civilizações tivessem progredido de forma inequívoca ao longo da história, em alguns casos com saltos tecnológicos que tiveram profundo impacto na forma como vivemos nos dias de hoje.
Na contemporaneidade, a Primeira Revolução Industrial foi certamente um dos maiores saltos evolutivos que alguma vez a humanidade viveu. A partir da Primeira Revolução Industrial a nossa qualidade vida conheceu melhorias significativas a quase todos os níveis, permitindo por exemplo que a população mundial prosperasse como nunca antes tinha acontecido na história do planeta azul.
Muito já se analisou e escreveu sobre o impacto económico e social da Primeira Revolução Industrial e das revoluções subsequentes, não sendo certamente minha pretensão acrescentar algo de novo a este tema, mas sim apelar à ideia: se é verdade que a história não se repete, existirá certamente algo nesta com que podemos aprender. As três revoluções tecnológicas identificadas e comummente aceites pelos historiadores, que aconteceram na história recente da humanidade, foram responsáveis por melhorias significativas no bem-estar e no modo de vida do Ser Humano mas como todas as revoluções, tiveram um preço – a disrupção com o passado - e se há coisa que mexe profundamente com a essência do Ser Humano, é a mudança e a incerteza inerente a esta.
A ideia de que estamos a viver no presente uma revolução tecnológica tem ganho cada vez mais apoiantes. Uma revolução intitulada de Quarta Revolução Industrial, mas que apesar do nome inspirado pela Primeira Revolução Industrial, não será movida a vapor mas sim por tecnologia bastante mais evoluída. Os especialistas na matéria garantem que atualmente existe uma combinação sem precedentes entre dois fatores: a capacidade de armazenar enormes quantidades de informação a um custo acessível e a capacidade de usar algoritmos muito avançados que permitem processar informação a uma velocidade nunca antes atingida. A conjugação destes dois fatores aliada ao facto de um conjunto de tecnologias que têm vindo a ser desenvolvidas ao longo de vários anos e que começaram agora a ter uma aplicação prática em vários setores da economia, ciência, saúde, mobilidade e em variadíssimos outros campos, está a levar a que exista um contexto propício para que possamos novamente dar um salto tecnológico notável e dessa forma voltar a criar um contexto disruptivo com a forma como vivemos até aqui. A grande diferença é que desta vez a velocidade da mudança e o impacto nas nossas vidas deverão ser ainda mais profundos do que no passado. Será que estamos preparados para lidar com esta disrupção? Provavelmente não!
Se é certo que esta nova revolução nos permitirá voltar a dar um salto qualitativo em termos de condições de vida, como por exemplo, na resolução de doenças até aqui incuráveis, na manipulação genética, na criação de órgãos artificias, na segurança e velocidade a que viajamos, na substituição do homem pela máquina em tarefas cada vez mais complexas, na forma como transacionamos bens e fazemos pagamentos, na dependência cada vez menor de combustíveis fósseis, na organização das sociedades e dos sistemas políticos, entre outros impactos socioeconómicos e ambientais, também é certo que as mudanças trarão desafios enormes.
Um dos receios generalizados da evolução da tecnologia, em especial da Inteligência Artificial, é a ideia de que as máquinas poderão dominar o Homem, algo que na verdade já aconteceu ao longo das revoluções anteriores e que acabou por se revelar um receio infundado, uma vez que apesar dos avanços tecnológicos serem bastante impactantes nas nossas vidas, essa independência das máquinas ainda está numa fase muito incipiente e ainda longe de ser totalmente alheia à vontade humana.
Um receio mais relevante e que parece não ter uma resolução óbvia é a substituição da mão-de-obra humana pelas máquinas. É verdade que é fácil traçar um paralelismo deste receio com o que aconteceu nas revoluções já aqui mencionadas; a grande diferença desta vez, é o nível de sofisticação das tarefas que a Robótica e a Inteligência Artificial já atingiram e a velocidade a que continuarão a evoluir no futuro. O desafio não é parar a evolução mas sim prepararmo-nos para poder viver num contexto em que a educação, a informação e a capacidade de interagir com máquinas inteligentes será essencial para poder vencer.
Entre as tecnologias identificadas como altamente disruptivas e consideradas como as que poderão liderar esta nova revolução, estão: a Inteligência Artificial e Robótica, Internet das Coisas, Veículos Autónomos, Blockchain e Impressão 3D. As aplicações de cada uma destas tecnologias são infindáveis e por isso torna-se difícil de as elencar aqui. O destaque vai para aquela que está intimamente ligada ao tema financeiro do momento: Bitcoin. A tecnologia em causa é a Blockchain.
Blockchain é certamente das inovações tecnológicas que maior impacto terá no setor financeiro e que tem atraído grande atenção dos investidores, em especial porque esta é a tecnologia por detrás da criptografia e das criptomoedas, mas a tecnologia não se esgota aqui. Blockchain é um sistema público e descentralizado de registo de transações (designada por Base de Dados Distribuída) que foi criado com introdução da Bitcoin. Contudo, esta tecnologia tem hoje outras aplicações no sistema financeiro (e não só) como por exemplo, em processos de pagamento, compensação e liquidação, incluindo na transferência e liquidação de fundos, títulos, commodities e derivados. A tecnologia já começou a ser utilizada neste tipo de transações por empresas de referência da indústria da gestão de ativos.
Há quem compare o impacto que esta tecnologia terá no futuro ao impacto que a Internet teve no nosso passado recente, uma vez que poderá revolucionar a forma como fazemos todo o tipo de transações ao nível da segurança, custo, tempo, descentralização, transparência e rastreabilidade. O facto de o sistema Blockchain não ser controlado por governos ou bancos é algo que agrada às novas gerações, cada vez mais descontentes com o estado dos sistemas políticos. Além disso, todos os participantes do sistema têm acesso ao livro-razão, no qual todas as transações são registadas, sendo também os próprios participantes do sistema quem valida as transações. A segurança e transparência são também fator chave, sendo asseguradas por algoritmos avançados que dão credibilidade ao sistema. Por último, os intermediários financeiros são eliminados por via da criação de contratos inteligentes que se fazem cumprir por si próprios, algo que também poderá redefinir a necessidade da intervenção dos tribunais na resolução de contratos em processos jurídicos complexos, que criam entropia e custos na economia.
Esta tecnologia ainda não foi amplamente testada a uma escala global e o seu potencial ainda não está totalmente comprovado mas a verdade é que a sua disseminação poderá permitir que os serviços financeiros cheguem a todos em condições únicas, algo que hoje ainda não acontece com cerca de 20% da população mundial e dessa forma, entre outras coisas, ajudar a erradicar a pobreza no mundo. Existem ainda muitos desafios à sua implementação de forma generalizada e por vezes as tecnologias evoluem mais depressa do que as leis que permitem a sua utilização. Por outro lado, a segurança de um sistema deste tipo é crucial para que possamos usufruir dos seus benefícios sem que o mesmo possa ser posto em causa.
Certamente que será difícil prever os impactos que uma revolução tecnológica poderá ter no nosso futuro, mas a história é sempre um bom guia nestes casos, em especial se mantivermos alguma abertura de espírito para as mudanças que certamente acontecerão. Não existindo uma bola de cristal, poderemos sempre contar com impactos positivos que se irão refletir em melhorias significativas na qualidade vida da população mundial. Contudo, a disrupção provocada pelos avanços tecnológicos trará, pelo menos durante um período de transição, grandes desafios à nossa capacidade de adaptação a uma nova realidade, como por exemplo o desafio do que iremos fazer com o tempo disponível que as novas tecnologias nos irão oferecer. As novas gerações estarão desde já mais preparadas para poder tirar partido dos avanços tecnológicos e tal como no passado conseguirão partipar da mudança com um menor nível de resistência. De qualquer forma o desafio afetará toda a gente e o modo como nos prepararmos e respondermos à mudança irá posicionar-nos para o futuro.