Rui Martins (Caixa Gestão de Ativos): “No segundo semestre de 2021 dever-se-á manter uma tendência pró-cíclica de mercados”

mundo world perspetivas global
Créditos: Ben White (Unsplash)

TRIBUNA de Rui Martins, responsável de alocação de ativos na Caixa Gestão de Ativos.

Após um início de 2021 em que muitas economias experienciaram uma moderação substancial na retoma em curso, as perspetivas de uma reabertura mais sustentada na segunda metade do ano são promissoras. No bloco desenvolvido, os progressos na vacinação possibilitaram a diminuição gradual das medidas de confinamento, decretadas para conter a pandemia COVID-19. Em paralelo, os programas de estímulo fiscal têm gerado um impulso adicional à procura agregada. Será provável que, no curto prazo, caso se mantenha a tendência de melhoria da situação pandémica, se continue a assistir a uma evolução robusta da atividade neste bloco. Em comparação, em algumas economias emergentes, os atrasos na vacinação e na redução das medidas de restritividade, continuarão a condicionar o crescimento.

A pandemia COVID-19 gerou choques, tanto na procura, como na oferta, estando a recuperação da procura a ser mais célere do que a da oferta, devido às disrupções nas cadeias de produção globais. Contudo, estes constrangimentos deverão ser ultrapassados à medida que se avança na reabertura das economias. Perante estes choques, de natureza exógena, os decisores políticos, tanto monetários como governamentais, optaram por implementar medidas de apoio à economia sem precedentes. Adicionalmente, as incertezas relacionadas com os riscos latentes advindos da evolução futura da pandemia têm mantido, e deverão continuar a manter, os referidos decisores atentos e mais predispostos a permanecerem com políticas mais expansionistas que em ciclos passados. Desta forma, a evolução do crescimento tenderá a continuar a ser suportada por políticas fiscais e monetárias agressivas, o que deverá gerar um ambiente favorável para um maior otimismo dos consumidores, dos empresários e também dos investidores.

Nos EUA, a maior celeridade na implementação dos planos de vacinação, conjuntamente com a elevada proatividade fiscal da Casa Branca permitiu uma recuperação mais rápida da atividade e da inflação. Após as evidências de um crescimento económico sólido na primeira metade de 2021, em especial o 2.º trimestre, é expectável que a recuperação se mantenha durante o 2.º semestre, embora possa evidenciar algum abrandamento. Perante os avanços no processo de desconfinamento a confiança dos consumidores deverá continuar a aumentar e, consequentemente, o consumo das famílias. Para tal deverão contribuir também as melhorias ao nível do mercado de trabalho e as poupanças geradas pelas transferências ocorridas aquando dos pacotes de estímulo fiscal do último ano, às quais se soma o reforço, a partir de julho, nos apoios às famílias com filhos. A aceleração significativa do crescimento ocorrida nos últimos trimestres, conjuntamente com os efeitos base e as referidas disrupções na oferta, causaram o aumento da inflação, que registou o valor mais elevado em vários anos. Porém, muitos dos efeitos que influenciaram este incremento são considerados temporários, pelo que, apesar de a inflação permanecer provavelmente elevada, poder-se-á assistir a algum abrandamento ao longo dos próximos trimestres.

Na Europa, à queda histórica da atividade registada no 1.º semestre de 2020, seguiu-se uma recuperação significativa no 3.º trimestre, todavia, perante a deterioração da situação pandémica e o aumento das medidas de confinamento, a economia voltou a contrair no último trimestre do ano transato e no 1.º de 2021. No entanto, esta queda foi menos expressiva que a ocorrida na 1.ª metade de 2020, o que evidenciou a adaptação das empresas e das famílias à nova realidade resultante da pandemia, o contributo do crescimento global e o suporte dos apoios gerados pelos governos. A evolução económica no 2.º semestre do ano será em grande parte determinada pelo sucesso na imunização da população, na medida em que possibilite a redução das restrições decretadas. Os progressos recentes na vacinação e na evolução da situação pandémica permitem antecipar que a tendência de diminuição das medidas de contenção registada nos últimos meses se mantenha e, inclusivamente, aumente. Desta forma, espera-se que a economia acelere o seu ritmo de recuperação, apoiada também pelos fundos de recuperação, com a implementação dos Planos Nacionais de Recuperação e Resiliência, no âmbito do programa Next Generation EU. Os dados mais recentes sugerem que a atividade já se encontra numa trajetória de melhoria, que deverá ser impulsionada pelo regresso gradual a uma maior normalidade durante os próximos meses, em especial nos de verão, com o PIB a voltar ao nível pré-pandemia na viragem do presente ano. À semelhança dos EUA, a inflação na Europa também aumentou de forma acentuada nos primeiros meses de 2021, embora em menor magnitude, refletindo a subida dos preços da energia e um conjunto de fatores temporários, como as alterações fiscais, os efeitos de base e o impacto da alteração das ponderações do cabaz de inflação. Estes efeitos poderão continuar a sentir-se durante o resto do ano, destacando-se, na segunda metade do ano, o efeito do fim do corte do imposto sobre o consumo na Alemanha. Adicionalmente, a evolução da inflação deverá ser suportada pela recuperação da procura e por disrupções na oferta.

No que respeita à economia chinesa, esta manteve uma evolução positiva, apesar de surtos localizados de COVID-19. Este país foi o primeiro a sentir os efeitos da pandemia na atividade, mas também o primeiro a revertê-los. O crescimento tem sido impulsionado pela recuperação do investimento e das exportações, com os dados recentes a mostrarem uma melhoria também ao nível do consumo. É importante ter em atenção que está previsto ocorrer em 2022 o Congresso Nacional do Partido Comunista Chinês, pelo que o governo deverá estar predisposto a apoiar a procura interna, através da promoção do investimento. Em paralelo, perante o contexto positivo, é expetável que a política monetária seja gradualmente menos acomodatícia, com o objetivo de controlar os desequilíbrios macroeconómicos existentes, tais como o elevado endividamento do sector público empresarial e dos governos locais. Em relação às tensões com os EUA, não será expetável que, na fase atual de recuperação global, qualquer um dos países promova a sua escalada.

Principais classes de ativos

Ao longo dos últimos 12 meses, a recuperação da recessão causada pelo Grande Confinamento, decretada para conter a pandemia, gerou um maior suporte para os ativos de risco, nomeadamente a ações e a segmentos de crédito de menor qualidade creditícia, em detrimento dos considerados como de refúgio, como é o caso de obrigações de governos.

Atualmente, uma boa parte desta recuperação inicial já ocorreu, com as economias dos EUA e da China com um nível de atividade igual ou superior ao registado antes da pandemia. Os dados mais recentes confirmam que o contexto económico global se continua a caracterizar como extremamente robusto, o que suporta a perspetiva de que o crescimento, apesar de poder evidenciar algum abrandamento, continuará a ser um dos mais elevados das últimas décadas, envolvente na qual, de acordo com o que a evidência histórica demonstra, as classes de maior risco apresentam os melhores desempenhos. Para além do crescimento económico robusto, estaremos também perante leituras de inflação relativamente elevadas que, atendendo aos níveis extremamente baixos nos quais as yields dos governos de melhor qualidade creditícia ainda se encontram, em especial a componente real, deverão suportar a manutenção da tendência de aumento das taxas de juro de maturidades mais longas observada nos últimos trimestres.

Concretamente na classe acionista, a evolução económica favorável perspetivada para os próximos trimestres e as medidas monetárias e fiscais em vigor, conjuntamente com o maior potencial face a soberanos, tenderão a gerar suporte, apesar de apresentar métricas de valorização absoluta relativamente elevadas. No caso específico dos mercados da Área Euro, estes poderão ser favorecidos pela maior exposição a setores que beneficiam da recuperação global, pela aceleração económica da região perspetivada para os próximos trimestres e pelo menor posicionamento relativo dos investidores. Para os dos EUA, deverão contribuir a recuperação mais célere da atividade para níveis pré-pandemia que em outras economias avançadas e o incremento das medidas de estímulo fiscal, embora evidenciem valorizações relativamente mais elevadas. Os índices do bloco emergente, à semelhança dos europeus, apresentam valorizações relativamente mais atrativas, podendo ser dos mais beneficiados pela melhoria da atividade económica global antecipada e pela retórica menos protecionista da nova administração americana.

Na classe de rendimento fixo, perante a reabertura da economia, com a provável manutenção da inflação em valores relativamente elevados face aos registos dos últimos anos, a performance deverá ser influenciada negativamente pela continuação da tendência de subida das taxas de juro de mercado a nível global. Adicionalmente, na medida em que este enquadramento influencie a retórica das autoridades monetárias, o referido aumento das yields poderá também ser sentido na sua componente real, que na Alemanha e nos EUA se situa ainda em níveis negativos e próximo dos mínimos históricos, o que deverá condicionar principalmente a evolução dos mercados de dívida pública. Já no que respeita à classe de crédito, após o movimento de estreitamento substancial verificado, os programas que se encontram a ser implementados pelos bancos centrais deverão continuar a conferir resiliência aos prémios de risco, pelo que, tendo em conta os níveis atuais de spreads de crédito, as rendibilidades dos mercados de high yield poderão superar as dos agregados de dívida pública e dos segmentos de melhor qualidade creditícia.

Deste modo, dever-se-á manter uma tendência pró-cíclica de mercados, visível na performance superior da classe acionista e dos segmentos de crédito de high yield face a obrigações de dívida soberana.

Riscos

A análise sobre evolução da pandemia, em concreto dos processos de vacinação, deverá ser efetuada, não só a nível local ou de um conjunto de países, mas a nível global. Neste âmbito, os países de rendimentos mais baixos ainda não estão atualmente a receber vacinas em quantidade suficiente que lhes permita avançar com sucesso na imunização da sua população. Desta forma, enquanto não se tenham atingido níveis de imunização elevados em todos os países, permanece o risco de surgimento de novas variantes, para as quais as vacinas atuais poderão não ser eficazes, o que terá como resultado possível uma nova vaga a nível global. Neste contexto, a confiança dos agentes poderá ser seriamente afetada pela incerteza resultantes de novas medidas de confinamento.

As leituras mais recentes da inflação evidenciaram uma aceleração significativa a nível global, com a dos EUA a atingir máximos de mais de 20 anos, o que fez ressurgir receios de possíveis pressões inflacionistas. As disrupções em alguns sectores e nas cadeias de valor a nível global têm criado tensões nos preços, que deverão começar a desvanecer-se à medida que a capacidade de produção se normaliza. Paralelamente, a folga ainda existente no mercado de trabalho poderá impedir uma escalada da inflação. Contudo, caso os níveis elevados se demonstrem mais persistentes que o perspetivado ou, inclusivamente, aumentem, os bancos centrais poderão ser obrigados a reverter de forma mais rápida que o antecipado as políticas monetárias acomodatícias implementadas no último ano, o que causaria uma deterioração das condições financeiras globais.

Recomendação para o 2.º semestre de 2021

Considerando os riscos latentes anteriormente descritos, as estratégias de investimento multiativos, adaptadas ao perfil de risco do investidor, tenderão a apresentar-se como soluções adequadas para o segundo semestre de 2021, tendo em conta um horizonte de investimento de médio e longo prazo. Estas estratégias de investimento proporcionam uma exposição diferenciada por classes de ativos, geografias e moedas, geradora de um efeito de diversificação associado aos comportamentos distintos que os vários mercados tipicamente demonstram. Neste âmbito, a referida diversidade de alocações permitirá a redução de riscos específicos e a exposição a binómios de rendibilidade / risco potencialmente mais atrativos face a investimentos concentrados numa única classe ou a aplicações de curto prazo em euros, que se prevê continuem indexadas a taxas de juro quase nulas, ou mesmo negativas. Em termos das referidas soluções, a Caixa Gestão de Ativos disponibiliza duas famílias de fundos mistos, os fundos Seleção Global e os fundos PPR/OICVM, com três níveis de exposição distintos às principais classes de ativos que refletem três diferentes perfis de risco. Neste âmbito, na oferta da Caixa Gestão de Ativos encontra-se também o Caixa Investimento Socialmente Responsável – Fundo de Investimento Mobiliário Aberto[1], para um perfil de risco moderado, que representa uma filosofia com as mesmas características de multi-classe e que, adicionalmente, incorpora fatores de sustentabilidade ambiental, social e de governo – ESG (Environmental, Social and Governance).

Complementarmente, de acordo com o perfil de cada investidor e o objetivo de otimização da relação rendibilidade potencial / risco do investimento, as alocações às famílias de fundos de ações globais e mistos podem ser balanceadas com uma exposição a veículos monoativos ou temáticos, também inclusos na oferta da Caixa Gestão de Ativos. Neste âmbito, os fundos de obrigações com investimento diferenciado em dívida pública e privada, os fundos de ações com alocação a geografias e setores distintos e os fundos de classes alternativas como o imobiliário, as infraestruturas ou o private equity constituem soluções a considerar.

Temas de investimento

Dada relevância da pandemia, não só a nível económico mas também a nível social, importa acompanhar a situação epidemiológica e os seus efeitos, não só os seus impactos imediatos mas também a médio e longo prazo. Em concreto, no que respeita à COVID-19, informação sobre o sucesso na imunização das populações, para o que será relevante conhecer a evolução dos novos casos e os progressos da vacinação. Em paralelo, a informação sobre a dinâmica das medidas de confinamento e da sensibilidade da atividade económica a estas.

Adicionalmente, perante o recente aumento da inflação, é de especial importância acompanhar as métricas que permitem aferir sobre o caráter transitório dos valores atuais.


[1] Sociedade Gestora: Caixa Gestão de Ativos, SGOIC, S.A., Sede: Av. João XXI n. 63, 1000-300 Lisboa

Banco Depositário e Entidade Comercializadora: Caixa Geral de Depósitos, S.A.

Podem ser obtidas informações adicionais sobre os Fundo, tais como o prospeto, as informações fundamentais destinadas aos investidores, os relatórios anual e semestral e o valor da unidade de participação, nos locais e meios de comercialização do Fundo e no sítio de internet da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) www.cmvm.pt.

Esta informação é realizada com um objetivo informativo. Não constitui uma recomendação de investimento e não pode servir de base à compra ou venda de ativos nem à realização de quaisquer operações nos mercados financeiros assim como não deve ser considerado a base de qualquer tipo de contrato ou investimento que possa ser realizado. Na preparação do presente documento não foram considerados objetivos de investimento, situações financeiras ou necessidades específicos dos investidores, não tendo existido na sua elaboração a adequação da informação a qualquer investidor efetivo ou potencial nem ponderadas circunstâncias especificadas de qualquer investidor efetivo ou potencial.

A presente informação incorpora a visão desenvolvida pela Caixa Gestão de Ativos, SGOIC, S.A. (empresa do Grupo Caixa Geral de Depósitos) e baseia-se em informação pública disponível e nas condições de mercados à data, proveniente de várias fontes que se creem credíveis, não sendo possível garantir que a mesma esteja completa ou precisa, estando sujeita a revisões, atualizações e alterações futuras sem aviso prévio. Não pode, assim, ser imputada qualquer responsabilidade à Caixa Gestão de Ativos, SGOIC, S.A., por perdas ou danos causados pelo seu uso.