Foi uma hora de conversa entre Mário Pires e Jorge Silveira Botelho, onde fortes convicções foram partilhadas sobre inflação ou estímulos dos bancos centrais.
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Cenários económicos no pós-pandemia. Foi o tema que juntou recentemente à conversa Jorge Silveira Botelho, responsável de Investimentos da BBVA AM Portugal, e Mário Pires, responsável de Negócio Institucional da Schroders em Portugal e Espanha.
Num webinar promovido pelo BBVA, os dois conhecidos profissionais do setor da gestão de ativos tiveram oportunidade de traçar cenários para os próximos tempos. Falaram de temas como a inflação, os estímulos dos bancos centrais, ou até cenários para as classes de ativos. Trazemos-lhe alguns insights dos temas mais macro abordados.
A ideia de uma forte recuperação económica vindoura foi partilhada pelos dois, que concordaram nos mesmos números de crescimento. Mário Pires explicou que o cenário central de uma forte recuperação é sustentado na casa britânica por três grandes pilares. “Os fortes estímulos por parte das autoridades monetárias e governos, o êxito do plano de vacinação dos principais blocos económicos e, por último, a extraordinária capacidade de adaptação das empresas”, iniciou. Num cenário que projeta os países desenvolvidos a liderar, e o setor dos serviços “a ter um papel importante”, prevê que “a economia global cresça 5,9% este ano e 4,3% no próximo ano”.
Há um cenário que neste momento temos de ter em cima da mesa que é o cenário de sobreaquecimento.Dizendo-se muito em linha com o prognóstico de Mário Pires, Jorge Silveira Botelho adicionou um risco a considerar. “Claramente o tema do output gap que se vai fechando à medida que a economia vai crescendo fortemente comporta riscos. Por isso, há um cenário que neste momento temos de ter em cima da mesa que é o cenário de sobreaquecimento. Isto tem a ver com o facto dos estímulos à economia serem muitos; tem de existir algum tipo de moderação, pois esse risco pode existir”, afirmou o CIO da BBVA AM em Portugal.
Inflação conjuntural
O tema do sobreaquecimento rapidamente conduziu ao tema da Inflação, e as preocupações sobre a sua aceleração foram consideradas pelos dois intervenientes. “No que toca à inflação há um tema conjuntural que é completamente transitório, e que tem a ver com o arranque da economia muito rapidamente”, começou por esclarecer o profissional do BBVA. Das matérias-primas, passando pela agricultura, existiram vários setores que se ressentiram, mas a progressão da economia, referiu, foi trazendo ajustamentos nas commodities. “Foi o caso do óleo de soja, do preço da madeira ou até do cobre. Subiram muito e agora ajustaram-se. O que vemos é que no preço de outras commodities, como a eletricidade, esse ajustamento poderá demorar ainda mais algum tempo”, frisou.
Embora o cenário da pandemia se tenha assemelhado a um cenário de guerra, lembra, “não houve destruição da capacidade, mas sim uma interrupção. À medida que a economia abre a capacidade normaliza-se”.
Estruturalmente, por outro lado, o CIO da BBVA AM destacou que as forças desinflacionistas e deflacionistas continuam muito fortes. De certeza maneira, acrescentou, “ganharam mesmo uma nova dimensão com toda esta questão da pandemia e a revolução 4.0”. Temas como a robotização, a inteligência artificial ou até as impressões 3D, apontou, “provocarão uma realocação de fatores com um foco na produtividade, e com efeitos altamente desinflacionistas”. Inclusive nos serviços, a digitalização vai ter um impacto muito grande, transformando-os em bens que são muito mais transacionáveis, como acontece por exemplo com as áreas da saúde e da educação.
Em cima da mesa há, portanto, muitas questões conjunturais a afetar a inflação e, Mário Pires, fez um convite a olhar-se para o pré pandemia. “Vemos que antes da pandemia se atribuíam poucas probabilidades a um aumento da inflação. Para além do que o Jorge referiu, a ausência estrutural da inflação assenta em quatro vetores, conhecidos como os quatro D. A dívida que aumentou, é certo, o que impede que as taxas possam subir. Por outro lado, a desigualdade, com a pandemia a aumentá-la e o desemprego a subir. Por último, a demografia e a digitalização. Estes quatro fatores juntos fazem-nos pensar que uma vez passado o período de recuperação económica, estas quatro forças vão continuar a operar, sendo forças muito poderosas”, pontualizou o responsável da Schroders.
Retirada de estímulos... como?
Inevitavelmente, a política monetária entra nesta equação. Mário Pires sublinha que “daqui em diante será muito importante perceber a forma como os Bancos centrais vão retirar os estímulos à economia”. Da Schroders acreditam “que estes estão preparados para assumir uma taxa de inflação mais alta sobretudo se comparado com períodos anteriores”.
Jorge Silveira Botelho recorda, contudo, que “esta tendência dos bancos centrais acomodarem tudo e todos já é longa”. Assim, é da opinião de que “daqui em diante o que será mesmo importante monitorizar são as compras de ativos que os Bancos centrais vão fazer. O resto é mais secundário”. A intenção, comenta, é focarem-se “em conseguir que exista alguma inflação, para que se permita uma reestruturação passiva da dívida”.
Com a experiência de 2008 e 2009, na opinião de Mário Pires, “os bancos centrais aprenderam a lição da importância dos estímulos, mas também a de não retirar tão rapidamente esses mesmos estímulos”.