Por que as infraestruturas ganham peso nas carteiras de longo prazo?

Carlota Fernández de León (Bestinver), Tavis Cannell (Goldman Sachs Alternatives) e Tania Salvat (BlackRock).
Carlota Fernández de León (Bestinver), Tavis Cannell (Goldman Sachs Alternatives) e Tania Salvat (BlackRock). Créditos: Cedida (Bestinver), (Goldman Sachs Alternatives),(BlackRock)

Nos últimos anos, o setor de infraestruturas tem experienciado uma expansão significativa impulsionada por quatro forças estruturais chave. Tavis Cannell, responsável global de Infraestrutura na Goldman Sachs Alternatives, explica que a primeira delas é “a mudança climática e a tendência para um consumo e adoção ampla de energias mais sustentáveis. Em 2023, os investimentos em energia limpa para a produção e armazenamento de energia renovável, transporte eletrificado e iniciativas industriais limpas alcançaram os 1,8 biliões de dólares, mais de oito vezes o valor da década anterior”.

A segunda força está centrada na aceleração tecnológica. A procura de energia por parte dos centros de dados aumentou consideravelmente desde a pandemia. Os analistas da Goldman esperam um aumento de 160% até ao final da década, impulsionado tanto pela aceleração da IA como por outras necessidades tecnológicas.

A terceira mudança estrutural está relacionada com os padrões variáveis dos fluxos comerciais, à medida que as empresas reconfiguram as cadeias de abastecimento para ganhar resiliência e adaptarem-se às novas realidades geopolíticas. “Isto cria necessidades de transporte e logística que devem ser satisfeitas para se adaptarem às mudanças de localização das instalações de fabrico e armazenamento e, além disso, afeta as rotas comerciais através das quais as mercadorias são entregues aos clientes”, explica Cannell.

Por fim, a quarta força é a demografia, já que, à medida que as pessoas mudam de local e de estilo de vida, os lugares com migração líquida positiva exigem investimentos em instalações tradicionais e digitais.

Um ativo resiliente com estabilidade

Neste contexto, muitos investidores procuram formas de identificar valor num ecossistema de inovação e transformação. “Investir em infraestruturas é investir na base da economia mundial. São ativos tangíveis e reais que oferecem uma combinação de estabilidade, crescimento a longo prazo, proteção contra a inflação e diversificação. A natureza essencial dos ativos e os contratos de longo prazo protegem o investidor face às quedas do mercado. Além disso, vale destacar a vantagem das elevadas barreiras à entrada, da alavancagem limitada e da necessidade dos governos de recorrer a capital privado para desenvolver infraestruturas, criando novas oportunidades de investimento”, explica Carlota Fernández de León, responsável por Investidores Institucionais Internacionais na Bestinver.

Tania Salvat, head of Institutional Business da BlackRock para Espanha, Portugal e Andorra, concorda: “as infraestruturas costumam gerar retornos constantes e previsíveis, o que as torna um investimento atrativo em tempos de incerteza económica. Além disso, oferecem diversificação da carteira devido à sua baixa correlação com outras classes de ativos. É uma classe de ativos resiliente, especialmente pela sua capacidade de fixação de preços em contextos sensíveis à inflação”.

Riscos existentes

Contudo, investir em infraestruturas também acarreta alguns riscos, como os regulatórios, já que mudanças nas políticas governamentais podem impactar esses ativos. Além disso, “estes ativos costumam apresentar menos liquidez em comparação com outros tipos de investimento. Historicamente, as infraestruturas estão ligadas a horizontes de investimento mais longos, embora cada vez existam mais soluções no mercado com prazos mais curtos ou sob formatos evergreen”, comenta Salvat.

A rentabilidade esperada dos investimentos em infraestruturas pode variar consoante os setores e os perfis de risco dos projetos subjacentes. Os projetos brownfield, nos quais os ativos subjacentes já foram construídos e, por isso, têm um perfil de risco mais baixo, tendem a gerar retornos menores do que os projetos greenfield, onde se deve considerar o risco de promoção de construir o projeto do zero. Segundo Salvat, “geralmente, as rentabilidades no setor de infraestruturas são considerados atrativas devido à estabilidade dos retornos que geram e à previsibilidade dos seus cash flows. Costumam situar-se entre os 5-9% para fundos core, podendo atingir níveis de rentabilidade de dois dígitos nos setores value add e oportunístico”.

Oportunidades para investidores de longo prazo

Os ativos mais interessantes atualmente para investimento podem agrupar-se em quatro grandes áreas. Cannell detalha cada uma delas: energia e serviços públicos — incluindo energia tradicional e renovável, armazenamento de energia, resiliência da rede, bioenergia, captura e armazenamento de carbono, e mobilidade verde.

Em segundo lugar, transporte e logística, que inclui estradas tradicionais, aeroportos, ativos ferroviários, fretamento e aluguer de aeronaves e logística e armazenagem especializada.

Em terceiro lugar, os ativos digitais, como torres de comunicação, fibra ótica, ativos de redes sem fios e centros de dados.

E por fim, a economia circular e infraestruturas sociais, que abrangem desde serviços tradicionais como a reciclagem e gestão sustentável de resíduos, até novas categorias, como empresas de cuidados de saúde e educação adaptadas às mudanças demográficas.

Atualmente, “a transição energética está a gerar oportunidades nas energias renováveis (solar, eólica), armazenamento e distribuição de energia (baterias, redes inteligentes) e transporte sustentável (carregamento de veículos elétricos). Também existe potencial em setores como as infraestruturas digitais ou hídricas. A chave está em construir carteiras diversificadas que possam aproveitar múltiplas oportunidades”, aponta Carlota Fernández de León.

Os investidores no mercado de infraestruturas

Mas que tipo de investidores estão de olho neste setor? Os investidores institucionais, como fundos de pensões e seguradoras, são os mais ativos no mercado de infraestruturas devido à sua capacidade de comprometer grandes quantidades de capital a longo prazo. Segundo Tania Salvat, “as seguradoras estão a desempenhar um papel cada vez mais relevante ao mobilizar capital do setor para ajudar a financiar a necessidade de investimento em infraestruturas e tornar possível a transição energética. Além disso, vemos que os investidores privados também estão a demonstrar um interesse crescente”.

A incorporação de novos veículos de investimento que facilitam o acesso às infraestruturas e o atrativo binómio rentabilidade-risco da classe de ativos está a fazer com que cada vez mais gestoras de patrimónios estejam a investir no setor. Carlota Fernández de León acrescenta ainda “investidores privados de elevado património e family offices, que procuram diversificação e oportunidades de investimento a longo prazo. Além disso, bancos e empresas de construção/operação podem investir em projetos de infraestruturas como parte da sua estratégia de crescimento ou para garantir o acesso a ativos estratégicos”.

Motivações dos investidores

Na hora de decidir investir num fundo de infraestruturas, os investidores costumam considerar variáveis como a estabilidade dos retornos, a diversificação geográfica e setorial, e o impacto das políticas regulatórias. Segundo Carlota Fernández de León “também é importante a reputação e experiência da gestora, cujo tamanho e marca podem influenciar o acesso a melhores oportunidades. A transparência no acesso à informação e aos gestores, a disponibilidade de comunicação no idioma do investidor e uma carteira diversificada em tipos de infraestruturas e geografias também são cruciais para mitigar riscos e garantir o sucesso do investimento”.

Para 2025, espera-se que o mercado de infraestruturas continue a crescer, impulsionado pela necessidade de modernizar infraestruturas existentes e desenvolver novas para acompanhar a transição energética e a digitalização. Além disso, prevê-se que os investimentos em infraestruturas tecnológicas, como centros de dados e redes de telecomunicações, continuem a ser uma tendência relevante.