Primeiro semestre de 2025 para o private equity: uma história de duas metades

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Créditos: Michal Lomza (Unsplash)

O private equity iniciou 2025 com o impulso herdado de 2024. Em janeiro, o ambiente parecia favorável: mercados de crédito abertos, dívida mais barata, inflação sob controlo e taxas de juro em queda. O primeiro trimestre manteve a tendência positiva de 2024, com o valor das operações a atingir o seu nível mais alto desde o segundo trimestre de 2022, impulsionado por algumas transações, segundo refere a Bain & Company num relatório recente. As saídas também aumentaram, especialmente através de vendas a compradores estratégicos.

Contudo, esta boa fase foi interrompida no início do segundo trimestre. A incerteza tarifária, que começou em fevereiro, agravou-se após os anúncios de 2 de abril, provocando uma forte volatilidade nos mercados de capitais globais. As consequências fizeram-se sentir rapidamente: em abril, o valor das operações foi 24% inferior à média mensal do primeiro trimestre, e o número de transações caiu 22%. No canal de saídas, o impacto mais visível foi o quase encerramento do mercado de IPO.

Falta de liquidez: uma pressão crescente

Este abrandamento agrava um dos principais problemas do setor: a liquidez. Os fundos de private equity lançados em 2018 nos EUA e Europa Ocidental apresentam rácios de distribuição sobre capital investido (DPI) em torno de 0,6x, quando historicamente deveriam situar-se em 0,8x.

Para os investidores institucionais (LP), isto implica dificuldades para obter retornos, dispor de liquidez ou reequilibrar carteiras. Para as gestoras (GP), representa a necessidade de dividir a atenção por mais participadas, abrandar a captação de novos fundos e adiar a transição das comissões de gestão para comissões por performance, o que impacta na sua capacidade de retenção de talento.

A insatisfação dos LP com saídas parciais é evidente: num inquérito recente, mais de 60% declarou preferir desinvestimentos tradicionais completos, mesmo que isso implique aceitar valorizações abaixo das últimas marcas. Perante esta situação, muitos LP estão a recorrer ao mercado secundário para reequilibrar as suas carteiras ou gerar liquidez. Exemplos recentes incluem a venda de 1.000 milhões de dólares em ativos de PE pelo fundo soberano da China, a exploração de vendas pela Universidade de Yale, e uma operação de 5.000 milhões de dólares pelos sistemas de pensões de Nova Iorque, com a Blackstone como principal comprador.

Apesar do crescimento do mercado secundário, este ainda representa menos de 5% do total de ativos sob gestão em private equity. A pressão para desinvestir é tão elevada que algumas gestoras optaram por vender com descontos, em vez de continuar à espera, assumindo que “tomar o medicamento” é preferível à paralisia.

Captação de fundos: a mais difícil da história recente

A captação de capital continua difícil, apesar do bom desempenho de segmentos como infraestruturas ou secundários. Nenhum fundo de buyout encerrado no primeiro trimestre superou os 5.000 milhões de dólares, algo que não acontecia há mais de uma década.

O contexto é desafiante: mais de 18.000 fundos estão a tentar captar, em conjunto, 3,3 biliões de dólares, o que gera uma proporção de três para um entre a procura e o capital disponível. Ainda não se sabe se o crescente peso do capital privado de investidores particulares (private wealth) conseguirá aliviar esta lacuna.

Os ativos que geram rendimentos previsíveis ganham atratividade como refúgio face à volatilidade comercial. Segundo a Campbell Lutyens, 28% dos LP prevê aumentar a sua alocação a crédito privado, e 20% a infraestruturas. Contudo, 33% indicou estar a abrandar o investimento em mercados privados devido às tarifas, e 8% suspendeu-o completamente.

Historicamente, os investidores institucionais têm sobreponderado os EUA face à Europa. Embora o PIB nominal norte-americano seja 20% superior ao europeu, os ativos de PE sob gestão são 170% superiores. Mas esta preferência poderá estar a mudar: cerca de um terço dos LP europeus e canadianos afirma que reequilibrará a sua alocação a favor da Europa.

Vencer na incerteza

Num ambiente marcado pela volatilidade, a Bain & Company defende que as melhores oportunidades surgem precisamente nos momentos de maior incerteza. Perante a tendência generalizada de adotar uma atitude de espera, a consultora recomenda uma abordagem proativa, especialmente em operações entre sponsors, onde a vontade de vender pode estar enfraquecida.

Com as valorizações sob pressão e poucas perspetivas de expansão dos múltiplos, a criação de valor deve centrar-se no crescimento real do EBITDA. Isto implica reforçar medidas de eficiência, explorar novas vias de receita e tirar partido de ferramentas como a inteligência artificial generativa para aumentar a produtividade.

O alongamento dos prazos de desinvestimento exige também uma atualização dos planos de negócio: as gestoras devem demonstrar aos compradores que ainda existem capítulos de crescimento por escrever. Não basta projetar, é preciso evidenciar.

A Bain conclui que muitas das hipóteses estratégicas do início do ano ficaram obsoletas. Embora o impacto das tarifas possa dissipar-se, este não é momento para passividade. As gestoras que atuarem com rapidez, clareza e disciplina serão as que capitalizarão o novo ciclo. Num contexto incerto e volátil, enfrentar a turbulência é, mais do que uma opção, uma necessidade.