Que as finanças sejam uma força do bem

CMVM
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Académicos, gestores e líderes juntaram-se num painel promovido pela CMVM ao abrigo da sua conferência anual, com o tema “Tendências de investimento sustentável e responsabilidade empresarial”. Neste painel, Josina Kamerling, diretora de regulação para EMEA no CFA Institute, Pedro Matos, diretor académico do Richard A. Mayo Center for Asset Management, da Darden School of Business da Universidade da Virgínia, Fernando Faria de Oliveira, presidente da Associação Portuguesa de Bancos, Isabel Ucha, CEO da Euronext Lisbon e João Castello Branco, presidente da Comissão Executiva da Semapa partilharam insights, opiniões e revelaram os passos que as instituições que representam têm dado e vão dar no sentido de alinhar o mundo das finanças com mais do que apenas métricas financeiras. A moderação foi responsabilidade de Rita Oliveira Pinto, assessora do Conselho de Administração da CMVM

Captura_de_ecra__2020-10-12__a_s_10“Que as finanças sejam uma força do bem,” foi uma expressão a que tanto Pedro Matos como Josina Kamerling recorreram para simplificar a mensagem que se procura passar, sendo que o primeiro, vivendo e trabalhando do outro lado do Atlântico, reporta em primeira mão o quanto os EUA, a maior economia do mundo, estão muito atrás da Europa quando se fala de finanças responsáveis. “Acredito que muito do que se está a fazer vai mudar a natureza dos mercados. A taxonomia, os standards de green bonds, os benchmarks climatéricos, os requisitos de divulgação ao nível das corporações, são uma força do bem. Os investidores vão se adaptar, mesmo aqueles que não estão baseados na União Europeia, e é especialmente importante em tempos de COVID que o capital e as empresas atuem de forma responsável”.

Captura_de_ecra__2020-10-12__a_s_10Josina Kamerling alerta também para os riscos e desafios que representa a crescente digitalização da economia, e a consequente avalanche de dados. Com tanta informação disponível, nem sempre a melhor, a profissional do CFA Institute alerta para uma preocupação que partilha com os reguladores com os quais contacta por todo o mundo. “O greenwashing é uma verdadeira preocupação”, diz. “Penso sempre no investidor de retalho que depende do seu advisor, que se assume que cumpre o dever com o devido cuidado e responsabilidade. O investidor de retalho não consegue perceber tudo e a educação financeira é importante, mas não é fácil manter essa educação atual. O mundo ESG é complexo. Como é que o investidor sabe que algo é ESG e é a melhor forma de ‘salvar o mundo’ com os seus investimentos? Mas sei que a CMVM está verdadeiramente a trabalhar neste assunto. Um assunto que tem que ser abordado”, comenta.

Do macro ao micro

Captura_de_ecra__2020-10-12__a_s_10Do mercado para a perspetiva corporativa, João Castello Branco recorre a uma expressão antiga, de Henry Ford, para mostrar que uma gestão sustentável não é algo do século XXI: “A business that makes nothing but money is a poor business”. Para o profissional, a sustentabilidade é essencial na estratégia da empresa e é algo que há décadas faz parte a mesma. Sobre o trade off entre rentabilidade e sustentabilidade, João Castello Branco foi assertivo ao afirmar que os investidores querem tudo e não querem abdicar de nada. “Nestas coisas há que ter uma perspetiva de médio prazo. É verdade que no curto prazo pode haver uma certa tensão entre o que é a geração de fluxos de caixa e os investimentos que são necessários para ir na direção da neutralidade carbónica e assegurar que temos um impacto ambiental controlado”, comenta. No entanto, no longo prazo, o profissional vê “uma maior capacidade para criar valor”.

Captura_de_ecra__2020-10-12__a_s_10Já no universo da Euronext, Isabel Ucha salienta que se tem vindo a aprofundar o papel nas finanças sustentáveis enquanto infraestrutura de mercado. “Isto, em particular, desde há cerca de uma ano quando anunciámos o nosso plano estratégico para os próximos três anos, que tem como um dos pilares, precisamente, o ‘enable sustainable growth’”. Têm, portanto, um pilar específico na sua estratégia no qual se comprometem em “facilitar tudo o que seja instrumentos, produtos, serviços e iniciativas para ajudar as emitentes e os investidores a trilhar este caminho”. Isabel Ucha vê tanto os investidores particulares como os investidores institucionais a incorporar rapidamente estes conceitos “na forma como investem e constroem portefólios”.

A banca no caminho da sustentabilidade

Captura_de_ecra__2020-10-12__a_s_10E não são só as empresas industriais, as bolsas e instituições, “o setor bancário tem, indiscutivelmente, um papel determinante na prossecução da agenda da sustentabilidade, e pode dizer-se que está fortemente empenhado nisso”. Quem o diz é o presidente da Associação de Portuguesa de Bancos que destaca como, há cerca de um ano, bancos de 47 países, incluindo bancos a operar em Portugal, aderiram aos princípios da banca responsável. A APB e vários dos seus associados integraram também o grupo de reflexão para o financiamento responsável, criado para promover as práticas de investimento sustentável em Portugal. Segundo Faria de Oliveira, o setor bancário comprometeu-se particularmente em “promover o debate sobre a sustentabilidade e os riscos e oportunidades ESG, promover a gradual integração de critérios ambientais, sociais e de governação na análise de financiamento e investimento, e promover a formação em termos de investimento sustentável”.  Em suma, ninguém está imune a esta onda de sustentabilidade que tem impactado a forma como os investidores, empresas e instituições olham o mundo dos negócios, mas há ainda um caminho grande a trilhar para que as finanças sejam verdadeiramente “uma força do bem”.