Que factores estão a travar uma escalada das yields da dívida soberana?

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15th Marine Expeditionary Unit, Flickr, Creative Commons

Facto: um índice de dívida soberana global standard registou um retorno total de cerca de 40% nos últimos nove anos. No entanto, a capitalização desse mesmo tipo de índice duplicou. É o caso por exemplo do Bank of America Merril Lynch Global Government Bond Index, que passou de 12,25 biliões de dólares em 2008 para alcançar um valor de 24,5 biliões de dólares em 2017, “um impactante aumento de 113.000 milhões de dólares a cada mês”, aponta Paul Brain, gestor à frente da equipa de obrigações da Newton (parte da BNY Mellon IM).

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Brain recorda que, até 2008, com a crise apenas a começar, todos os economistas previam que se incrementaria o volume de emissões de dívida... e que, como resultado, as yields da dívida teriam que subir para acomodar o excesso da oferta. Os investidores de 2017 sabem que essa previsão não poderia ser mais errada, pois nove anos depois o contexto mundial é de inflação débil e taxas baixas. De onde tem vindo toda essa procura de obrigações?

“Os bancos centrais têm sido os compradores mais vorazes, adquirindo uma média de 100.000 milhões de dólares por mês”, indica o especialista. A isto acrescenta o posicionamento dos investidores ao longo da curva, ao desaparecer a remuneração que há alguns anos se atribuia a liquidez. A estes factores soma-se a recuperação da poupança das famílias, que dirigiu uma parte dos esforços para as obrigações consideradas como mais seguras. Assim, de acordo com dados do Deutsche Bank, dos 1,8 biliões de dólares que poupam a cada ano o conjunto os 27 países da OCDE, “aproximadamente 150.000 milhões de dólares necessitam de ser investidos em ações e obrigações todos os meses” (ver gráfico).

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Os quatro Ds

Paul Brain está consciente de que agora os mercados de obrigações poderão encontrar-se num ponto de inflexão: “Os governos estão a começar a afastar-se da austeridade fiscal, e os bancos centrais estão a começar a abrandar as suas compras de obrigações, e no caso da Fed a reverter todo esse processo”. Também se observou uma certa recuperação da rentabilidade em algumas referências, depois de no ano passado o volume de dívida com taxas negativas ter batido todos os precedentes históricos. Sem ir mais longe, pode dizer-se que as obrigações norte-americanas a um ano regressavam no início desta semana a níveis não vistos nos últimos oito anos.

Apesar destes indícios, o gestor considera, no entanto, que algo não vai mudar e vai existir sim um travão para a escalada da rentabilidades: o contexto de crescimento baixo com pouca inflação. Na sua opinião, há quatro factores (quatro Ds) que explicam esta tendência: o excesso de dívida, a pior demografia, a disrupção tecnológica e a distorção dos preços.

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“Mesmo que a força disruptiva da Amazon esteja a mudar na maneira como se vendem e compram bens, que os baby boomers estejam a abandonar a população ativa, e que se esteja a destruir a relação entre baixo desemprego e inflação, há algo que temos que ter claro: a rentabilidade das obrigações não pode subir demasiado antes que se torne difícil enfrentar estes elevados níveis de endividamento e o crescimento comece a sofrer outra vez”, declara Brain. Na sua opinião, estes factores não vão impedir que as taxas subam dos níveis atuais, mas acredita sim que “pode não tardar que atuem como um tampão” que pare a escalada das yields.