A figura do agente financeiro não tem parado de crescer na Europa. Analisamos os modelos que existem no Reino Unido, em França, na Alemanha e em Itália e como a chegada da Retail Investment Strategy pode afetar o setor.
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A figura do agente financeiro tem cada vez mais importância no setor do investimento coletivo. Um impulso que veio a partir de duas vias: por um lado, motivado pela reorganização do setor bancário; por outro, porque o profissional encontrou na figura do agente uma forma de dar continuidade à sua trajetória profissional.
Como o resto da indústria, este nicho enfrenta três elementos cruciais: a mudança de paradigma das taxas de juro; a nível regulamentar, as entidades têm de enfrentar a curto e médio prazo a Retail Investment Strategy e o seu impacto no sistema de retrocessões; por fim, o auge da tecnologia. Tudo isso afeta a oferta de produtos e serviços que as entidades oferecem. Mas a RIS vai, sem dúvida, definir como vai evoluir o sistema de cobranças no futuro.
Reino Unido e Países Baixos
Neste contexto, é inevitável ver o que aconteceu noutros países, como no caso do Reino Unido. A RDR (Retail Distribution Review), que entrou em vigor em dezembro de 2012, implicou um ponto de viragem na indústria da gestão de patrimónios.
Lá, os IFA (Independent Financial Advisors) cresceram muito desde a chegada da RDR. Segundo os dados recentes publicados pela Andbank, os IFA gerem 80% da poupança pessoal e familiar no Reino Unido. “Atualmente, há 27.839 consultores que trabalham em 5.062 empresas, embora nos primeiros anos após a sua entrada em vigor o número de agentes tenha diminuído devido aos elevados requisitos de qualificação exigidos pela norma nestes últimos oito anos. Mas a tendência mudou, voltando a aumentar o número de agentes financeiros em detrimento do número de consultores ligados a entidades bancárias, que desceu quase 40%”, explica Luis Crespo, subdiretor da Área de Agentes da entidade.
Uma das maiores críticas a este sistema é o facto de que, apesar de trazer consigo uma maior independência, provocou uma lacuna na consultoria, deixando órfãos os clientes com menos património. Os Países Baixos são, juntamente com o Reino Unido, outro país adiantado relativamente à MiFID II, e, em concreto, quanto à proibição da cobrança de retrocessões de terceiros. De facto, foram um pouco mais longe que o Reino Unido, proibindo qualquer tipo de incentivo em produtos ou serviços financeiros.
Europa Continental
A primeira diferença é que o sistema europeu, em comparação com o Reino Unido, está sujeito à regulamentação MiFID, que, por agora, permite a cobrança das retrocessões. No entanto, isto pode mudar com a chegada da RIS, que, entre as suas medidas mais polémicas, inclui a proibição das retrocessões nos serviços de pura comercialização de produto. Por agora, parece que, com a chegada das eleições europeias, este pacote de medidas não vai ser aprovado até ao final de 2025 e não será uma realidade até 2027, segundo Gloria Hernández, partner da finReg360.
Como na maior parte da Europa Continental, a distribuição de fundos em França é principalmente gerida pelo modelo de banca universal, que domina quase 86% da indústria. Por outro lado, o setor de seguros é muito atrativo nos produtos de vida devido aos seus grandes benefícios fiscais. A figura do consultor independente foi introduzida em França em 2003 e é conhecida por Conseiller en Investissements Financiers (CIF). É semelhante às atuais empresas de investimento independentes que prestam serviços de consultoria para investimento em Portugal, e têm requisitos mínimos para a sua atividade.
A Alemanha é outro mercado muito bancarizado, mas onde o setor de consultores independentes também está a crescer. Existe uma figura semelhante aos IFA que oferece planeamento financeiro e presta o serviço de consultoria aos seus clientes nos seus investimentos. Há cada vez mais consultores orientados para um modelo de retrocessão, e os clientes estão dispostos a pagar pelo serviço se este for excecional. Por outro lado, existem os gestores independentes.
Da mesma forma, em Itália, o setor de distribuição dominante também é o bancário. Há três setores distintos: o de retalho, gerido diretamente pelos bancos, que representa cerca de 50%; os Promotori Finanziari vinculados, figura semelhante aos agentes vinculados em Portugal, que dependem totalmente dos produtos do banco a que estão vinculados; e, por fim, a banca privada. Neste último, o regulador italiano CONSOB (Comissione Nazionale per le Società e la Borsa) aplica rigorosamente a proibição de pagamentos de terceiros desde a entrada em vigor do MiFID I. Há mais de 53.000 consultores registados, segundo um relatório do IEB.
EUA
Olhando para fora da Europa, no modelo americano, existem tradicionalmente dois tipos de entidades: por um lado, as entidades de banca privada, cujo modelo está muito centralizado na tomada de decisões e em diretrizes; por outro, o broker/dealer, profissionais financeiros ou sociedades dedicadas a comprar e vender títulos, semelhantes aos agentes financeiros. Atuam como intermediários e devem estar registados na Autoridade Reguladora da Indústria Financeira (FINRA), que opera sob a supervisão da SEC, mas que não é um organismo governamental.
Também surgiu a figura dos consultores de investimento registados (RIA): profissionais financeiros registados na SEC. A principal diferença entre estes e os anteriores é operarem sob o dever fiduciário, dando prioridade aos interesses dos clientes. Existem sistemas de pagamento explícito em ambos, em que é explicado ao cliente de forma transparente o que é cobrado pelo serviço.
O que se pode aprender na Península Ibérica?
Em conclusão, embora haja diferentes figuras na Europa, é inegável que a figura do agente e consultor independente no mundo continental está a evoluir a um grande ritmo. E Portugal e Espanha têm potencial de crescimento para se aproximarem dos modelos existentes noutros países. Com várias tendências, por um lado, o nível para aceder à banca privada está a baixar cada vez mais, por outro, estão a surgir ofertas mais personalizadas. A concentração no cliente e a demonstração do valor acrescentado oferecido serão, sem dúvida, a chave para a evolução do futuro modelo de comissionamento.