Quem nasceu primeiro: os produtos ou a procura por ESG?

Almudena Mendaza, Sofia Jesus, Paulo Pacheco e João Pina Gomes. Créditos: Vítor Duarte

Num pequeno-almoço que juntou a Sycomore e alguns profissionais da gestão de ativos nacional falou-se de como a transição energética pode ter reflexo nos portefólios, mas também da experiência de cada um dos intervenientes quando o assunto é o reconhecimento que já existe (ou não) por parte dos clientes sobre esta temática. Está a criar-se, através da oferta, a procura pelo ESG e pela sustentabilidade nos produtos financeiros, ou já são os próprios clientes que procuram esse tipo de produto?

Para Almudena Mendaza, responsável de Vendas na Generali Investments (grupo do qual faz parte a Sycomore), os clientes de retalho ainda se encontram alheados de todas as questões ESG. Por isso, acredita, o importante é que “os bons gestores consigam fazer uma ligação entre a abordagem ESG e a sustentabilidade dos investimentos”. O facto de existirem oportunidades de investimento reais, como é o caso da transição energética, é o que permite “apresentar boas razões para investir em todos os tópicos que têm sido mencionados: eletrificação com energia solar, metais de transição, mobilidade, etc., são tudo tópicos que fazem parte do futuro”. 

Do lado da Sycomore, explica-nos a responsável, a ideia “é identificar vários tipos de tópicos de transição energética ou ecológica”, pois têm percebido que “é difícil ter uma visão sobre apenas um tópico”. Trata-se de um universo que se está a desenvolver muito e muito rápido, e torna-se muito “restritivo”, por vezes. Nesse sentido, da entidade preferem “desenvolver primeiro estratégias europeias e depois globais, porque muitas destas empresas que investem nestes temas estão a expandir-se posteriormente para os Estados Unidos”. 

Também Paulo Pacheco, responsável pela Gestão de Ativos e pelo ESG, no BPG, não tem como visível o interesse dos clientes de retalho pela temática em análise. “Não vemos os nossos clientes de retalho a perguntar por este tipo de produtos. Como profissionais, que fazemos alocação de ativos temos, sim, de passar informação sobre o tema, bem como conhecimento, mas estes são temas controversos. Tentamos transmitir essa informação da melhor maneira e, por isso, esperamos que essa procura apareça no futuro”, prevê. Do lado dos clientes institucionais o feedback é distinto, mas por via das circunstâncias. “São profissionais e têm também eles que corresponder à regulação sobre o tema. Mas mesmo nos institucionais, é um caminho que já está a ser percorrido, mas que ainda não é mainstream. Estes temas não estão diretamente relacionados com questões geracionais, mas a verdade é que isso conta”, refere Paulo Pacheco, lembrando que no caso de algumas empresas os conselhos de administração são constituídos por pessoas de gerações mais velhas. 

Interesse existe, mas também é preciso criá-lo

As outras duas entidades que participaram neste debate - o ABANCA e a BPI GA - mostraram uma perspetiva ligeiramente mais positiva sobre a aceitação dos clientes quando o tema são os produtos ESG. No caso do ABANCA, João Pina Gomes, responsável pela área de Fundos de Investimento, não hesitou ao responder que veem interesse pelo tema, na entidade em que trabalha. Mas talvez um facto em específico o justifique: “Temos de ter em conta que na entidade em que trabalho o ESG é colocado como uma das prioridades do negócio”, começou por referir. Se o assunto é o investidor português de retalho, em termos genéricos, o profissional não tem dúvidas de que este “não está na vanguarda da onda europeia de ESG e sustentabilidade, mas cada vez se vê mais e mais procura”. No ABANCA, concretamente, João Pina Gomes aponta que recebem algumas questões sobre o tema, “e a maioria dos clientes são clientes de retalho”. Para além da gama “alargada” de fundos que oferecem que são classificados como artigo 8º e 9º, também no segmento de banca privada providenciam “mandatos que são também eles sustentáveis”. 

Sofia Jesus, gestora de ativos da BPI GA, também acredita que a procura está a aumentar, e pode testemunhar isso na primeira pessoa. “Quando lançámos os fundos artigo 9º SFDR na BPI Gestão de Ativos, existiu efetivamente procura por esses fundos”, começou por referir. No contexto da banca privada, a procura também se sente por “fundos classificados como artigo 8º e 9º da SFDR, por exemplo”. Para a profissional, nas reuniões, a questão da sustentabilidade até acaba por surgir muito mais relacionada com a perspetiva de gestão de risco, do que como um tema per se. “Quando se investe, existem riscos ao quais se está exposto. Entre eles, riscos climáticos, divididos em riscos de transição e físicos. Hoje em dia é muito difícil ir uma reunião e não falar de como tudo isto está integrado numa estratégia”, comenta. Na perspetiva de Sofia Jesus, “no final do dia, a classificação dos fundos em artigo 8º ou 9º acaba por ser uma consequência natural de todo este processo”.