Após o impacto negativo inicial das tarifas anunciadas por Donald Trump no Dia da Libertação, os mercados recuperaram algum do terreno perdido. Esta melhoria é em grande parte atribuída ao progresso nas negociações comerciais, em particular o acordo preliminar entre os EUA e a China alcançado em Genebra. De acordo com a MUFG Research, o pacto inclui uma redução parcial das tarifas e uma maior coordenação bilateral, o que ajudou a acalmar as tensões e a reavivar o apetite pelo risco.
Na mesma linha, Ioannis Angelakis, estratega de crédito do Bank of America, confirma esta maior apetência dos investidores por ativos de risco. O relatório Follow the Flow indica que se registaram fluxos positivos para fundos de ações, de crédito corporativo e de mercados emergentes, ao passo que os fundos do mercado monetário registaram saídas e a dívida pública apenas registou entradas. "Vemos uma clara preferência por vencimentos curtos, em linha com a nossa tese de investimento", resume.
No entanto, este otimismo renovado foi parcialmente ensombrado pela descida da notação soberana dos EUA pela Moody's, que retirou a última notação de triplo A ao país, suscitando preocupações entre os investidores mundiais quanto à saúde fiscal do país. Estes episódios realçam a fragilidade do atual ambiente e reabrem um debate fundamental: trata-se de um novo ciclo em alta ou apenas de uma recuperação técnica passageira? Para responder a esta questão, analisamos três sinais fundamentais apoiados por dados recentes e análises internacionais.
1. Liderança de mercado mais alargada
Um bull market sustentável exige uma participação alargada. Durante grande parte de 2024, as subidas concentraram-se em grandes ações tecnológicas (especialmente seis das Sete Magníficas). Agora, a J.P. Morgan Asset Management vê uma recuperação mais ampla. Até agora, em 2025, as subidas incluem setores cíclicos e de valor:

A Neuberger Berman concorda. Nas suas perspetivas para o segundo trimestre de 2025, salienta que as revisões positivas dos resultados abrangem mais setores, especialmente na Europa. Este facto está relacionado com a recuperação industrial, que favorece as ações mais cíclicas.
Ao mesmo tempo, a Janus Henderson e a Morningstar indicam que os investidores favoreceram os setores defensivos. De acordo com os seus dados, estas ações subiram 5,2% no ano, enquanto as cíclicas caíram 7,9%. A Morningstar também destaca a força dos setores de bens de consumo básicos e dos serviços públicos. Por outro lado, setores como os transportes e as small caps corrigiram, com exceção das ações europeias, que obtiveram rentabilidades positivas.
As previsões apontam para que os setores cíclicos recuperem a liderança nos ganhos até 2027. De um ponto de vista técnico, o indicador Zweig Breadth Thrust sugere ganhos. No entanto, ainda não confirma uma tendência sólida.
2. Resiliência económica e políticas monetárias
As decisões monetárias continuam a influenciar a evolução do mercado. Em abril, a Reserva Federal manteve as taxas inalteradas. Jerome Powell deixou em aberto a possibilidade de cortes no segundo semestre de 2025, se a desinflação se instalar. Nos EUA, a inflação subjacente mantém-se elevada. Em contrapartida, na Europa, o BCE considera que "o processo de desinflação está bem encaminhado".
Neste cenário, a Schroders prevê um crescimento global moderado de 1,7% em 2025, que poderá acelerar para 2,4% em 2026. A gestora espera que os bancos centrais mantenham uma abordagem cautelosa para evitar novas pressões inflacionistas. Esta cautela poderá favorecer a estabilidade, mas poderá limitar a subida dos mercados.
A aparente força da economia norte-americana tem pontos fracos. Neuberger Berman adverte que esta resiliência é sustentada por fatores frágeis. Entre eles está o efeito riqueza gerado pela bolsa. Este pode inverter-se se o mercado estagnar. A entidade alerta também para a pressão sobre as famílias. Cita a queda dos rendimentos reais, a redução da despesa pública e sinais de stress laboral. Além disso, a deterioração do setor imobiliário e a curva invertida dão à Reserva Federal menos margem de manobra em caso de abrandamento económico.

Nesta linha, Luis de Guindos, vice-presidente do BCE, alertou para os riscos em matéria de obrigações e de ações. De acordo com o Financial Stability Review de maio de 2025, os movimentos das taxas de juro geram volatilidade nas obrigações.
Observa também que as valorizações das ações continuam a ser muito sensíveis às expetativas económicas. Se as tensões se agravarem, poderão surgir correções abruptas. Por conseguinte, é necessária uma vigilância ativa para preservar a estabilidade financeira.
3. Valorizações razoáveis e confiança empresarial
Andrew Slimmon, diretor da Morgan Stanley, recorda-nos que os fundamentais ainda não justificam um rally sustentado. Atualmente, menos de 45% do S&P 500 está a negociar acima da sua média móvel de 200 dias. O posicionamento institucional mantém-se cauteloso: 36% dos gestores estão subponderados em relação às ações dos EUA e os níveis de liquidez são superiores a 5%, os mais elevados desde 2020, de acordo com o Bank of America.
Slimmon e a Capital Group também salientam que, historicamente, após quedas de 15% ou mais, o S&P 500 registou um retorno anual médio de 14%. Quando as descidas atingiram os 20%, a rendibilidade foi de 19%. Neste contexto, o bull market que começou em 2022 seguiria a sequência descrita por John Templeton: começa com pessimismo, cresce com ceticismo e amadurece com otimismo. Atualmente, essa fase de maturação parece ter sido interrompida.

A esta aparente contradição junta-se um outro fator: os mercados parecem mover-se numa “terra de ninguém”, como refere Angelo Meda, gestor do fundo Banor Mistral. A menor volatilidade, a descida do petróleo, a atitude cautelosa da Fed e o baixo posicionamento dos investidores permitiram que os mercados recuperassem o que perderam em abril. No entanto, continua a existir uma forte dissonância entre os indicadores duros, que mostram força, e os indicadores suaves, que apontam para uma deterioração.
De acordo com Angelo Meda, os mercados afastaram rapidamente o risco de recessão antecipada na sequência das tarifas de abril, mas a incerteza continua a afetar os setores industriais, onde as despesas de capital permanecem moderadas.
Neste contexto, os índices poderão mover-se lateralmente, mais influenciados pelas expetativas do que por dados objetivos. Embora o regresso de um bull market não possa ser confirmado, os atuais sinais apontam para uma possível consolidação da tendência. No entanto, os especialistas estão divididos, embora concordem que a manutenção de uma alocação diversificada e prudente continua a ser essencial para navegar os riscos ainda presentes.