Sete motivos que fazem acreditar que os componentes do crescimento global estão a mudar

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Leo Reynolds, Flickr, Creative Commons

“O receio de que a economia global volte a cair em recessão perdeu de alguma forma o enfoque. Embora o crescimento global se tenha estabilizado perto dos 3% em meados de 2016, a sua estrutura está a enviar sinais convergentes de uma mudança profunda”, afirmam Pascal Blanqué e Philippe Iturbide, diretor de investimentos e responsável global de análise e estratégia da Amundi, respetivamente. Ambos detalham os processos de transformação em marcha que acreditam que o mercado subestima.

Mais motores endógenos

“Há uma mudança do comércio global para motores de crescimento mais endógenos. O crescimento global não se está a despenhar, simplesmente está a regressar a casa”, dizem. Para ilustrar esta afirmação, o par de especialistas estabelece uma comparação entre o comportamento de valores e sectores do MSCI Europe expostos a economias europeias ou desenvolvidas em geral (incluem os sectores de energia, equipamento, alimentação, bebidas e tabaco, e tecnologia), comparativamente com títulos expostos a  mercados emergentes (real estate, bens e serviços ligados ao consumo, meios de comunicação e seguradoras).

Os especialistas observam que ambos os subgrupos registaram um comportamento similar entre  2011 e 2013, e que o primeiro se comportou melhor do que o segundo desde 2013. “Pode observar-se este comportamento relativo desde o começo da correção nos mercados emergentes depois do tapering da Fed e, mais recentemente, com o aumento das dúvidas em torno da economia chinesa”, explicam.

Novas descorrelações

“Estão a desenvolver-se notáveis descorrelações – numa série de fragmentos – entre a fabricação e serviços, entre países desenvolvidos e emergentes e dentro desses mesmos países, e ainda ao longo de cada bloco”, declaram da Amundi.

O mito da globalização

“A ideia de que a globalização significa comércio global – um poderoso paradigma nas últimas três décadas – está a desaparecer, assim como a confusão entre a contribuição para o crescimento global  e a contribuição para o comércio global”, dizem Blanqué e Ithurbide. Na sua opinião, o Brexit é o último exemplo da colisão destes conceitos.

A história emergente tem sido mal entendida

“Embora não seja surpreendente nos países mais desenvolvidos – onde se têm estabelecido forças internas de procura desde há muito tempo – o paradigma estendeu-se por todo o mundo emergente, como um motor económico para os políticos e como um tema de investimento”, observam os especialistas.

Dão como exemplo o debate sobre a efetividade da mudança de modelo económico na China. Na opinião de Blanqué e Ithurbide, os investidores interessados na China “estão prestes a chegar a conclusões mediante a procura de uma redefinição do paradigma conceptual e prático deste universo a nível macro/financeiro e de crescimento, a nível de categorias conceptuais maiores (como a “global emergente” que já não tem sentido, bem como as classificações que só têm por base os países ou as regiões)”.

Outra conclusão dos especialistas é que os índices destas regiões oferecem uma representação mais própria do passado do que do presente. “Ao estarem normalmente ponderados por capitalização, estes índices inclinam-se mais para o risco e são bastante mais sensíveis ao ciclo do que os índices de mercados desenvolvidos”, explicam.

Confusão conceptual

“A comunidade investidora tem estado com um sentimento bull relativamente ao comércio global durante as últimas três décadas. Adquirir mais exposição às tendências endógenas é uma nova fronteira; mais especificamente, os mercados emergentes e o seu potencial de crescimento serão vistos através das lente da diversificação do modelo de crescimento empresarial, do reequilíbrio da economia, e das dinâmicas de motores autónomos ou isolados”, dizem.

Os dois especialistas decompõem em três grupos principais o PIB mundial, para justificar esta necessidade de identificar as novas fontes de crescimento. Em primeiro lugar, observam que quase 60% do crescimento global “está ligado ao consumo das famílias”. Em segundo lugar observam que são as economias desenvolvidas, particularmente os seus motores de consumo interno, que estão a guiar o crescimento global. Finalmente, constatam que esta dinâmica se está a estender ao mundo emergente.

A dificuldade para delimitar estas tendências, segundo os especialistas, pode explicar a confusão entre o crescimento global e a contribuição para o comércio global.

Menos guerra de divisas, por favor

Tendo em conta esta mudança de dinâmicas, a recomendação dos especialistas é que “as autoridades deveriam, portanto, centrar-se menos na gestão das divisas (desvalorização), e mais na preservação e fortalecimento destas forças internas. Os investidores deveriam fazer o mesmo quando selecionam os seus títulos”.

Mudança das valorizações

Como consequência desta endogamia, Blanqué e Ithurbide acreditam que as valorizações deveriam “incorporar um prémio de risco mais caro por causa da qualidade”. Por sua vez, isto deveria refletir “a relativa escassez desses títulos num padrão de mudança de crescimento global, assim como deveriam refletir a sua natureza defensiva num contexto de incerteza crescente”.

O diretor de investimentos e o responsável global de análise e estratégia da Amundi finalizam a sua análise com duas conclusões. Na primeira referem que as tendências endógenas são “uma temática global que afecta tanto os países desenvolvidos como os emergentes e que tem prejudicado numa maior extensão a fronteira entre as economias desenvolvidas e as emergentes”. A segunda conclusão é de que esta endogamia é um “tema sustentável que tem alterado a percepção do paradigma do crescimento e portanto a sua interpretação, assim como a determinação das estratégias de investimento”.