A “digestão” que os Mercados fizeram sobre o destino do BES

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Stéfan, Flickr, Creative Commons

A divisão do Banco BES em dois – “Novo Banco” e “Bad bank” – chegou rapidamente aos “ouvidos” da imprensa internacional, mas não só. A agência de notação financeira Fitch, na sua última nota, ressalva que “o resgate ao BES tem pouco impacto ao nível orçamental, mas reduz a almofada financeira para lidar com eventuais problemas”. No que diz respeito ao impacto que este resgate pode ter ao nível das condições de financiamento de Portugal, a agência de rating entende que isso “dependerá da percepção dos investidores em relação ao sistema bancário”.

Precisamente as percepções dos investidores foram analisadas por alguns profissionais da indústria financeira. João Pereira Leite, diretor de Investimentos do Banco Carregosa, sublinha que a reação que emitem da entidade é “muito parcial”, já que “as acções do BES e da ESFG continuam com a  negociação suspensa”. O mesmo acontece também com “as obrigações hipotecárias e obrigações subordinadas, do BES e do Grupo”, que foram “suspensas esta manhã” (dia 4 de agosto). “Portanto, não podemos estabelecer uma causa-efeito directa”, resume.

Digerir informação

Sendo “muito difícil atribuir quedas ou subidas gerais do mercado à resolução do BdP”, João Pereira Leite, observa que “os títulos da banca têm estado a subir mas tudo pode mudar a qualquer instante”. Realçando um cenário de grande incerteza, o diretor de investimentos do banco infere que “os investidores ainda estão a digerir a informação e não sabem ao certo em que condições o Fundo se vai endividar para injetar os 4,5 mil milhões de euros”. Em conclusão remata: “Quanto custará esta decisão aos outros bancos? Ainda ninguém sabe.”

Impacto limitado

Também João Lampreia, responsável pela área de Research do Banco BiG, afirma que a solução de recapitalização do BES “acabou por ter um impacto relativamente limitado na generalidade dos activos de risco”. No fecho da sessão de ontem, “destacou-se em particular a valorização significativa dos títulos do BCP, pelo que o mercado estará a interpretar o carácter relativamente isolado e/ou ausência de risco sistémico face aos graves problemas ocorridos no BES e que proporcionaram este desfecho - envolvendo perdas quase totais de accionistas e credores subordinados de BES”.

O mercado de dívida, por outro lado, “registou uma evolução favorável – observando-se uma redução das yields de dívida pública nas diferentes maturidades – foi aliás um movimento idêntico em todos os países da Periferia, pelo que o mercado desconta que este tipo de solução poderá de alguma forma isolar o risco Bancário face ao Risco Soberano – desde logo um dos principais propósitos subjacentes à construção da União Bancária no espaço Europeu”, salienta o profissional. A espelhar o optimismo/complacência dos investidores em relação à eficácia da solução de recapitalização proposta para o BES está também “o comportamento muito favorável observado pelo sector financeiro Europeu na sessão – na generalidade liderou o respectivo movimento de alta.

Em termos globais, João Lampreia diz que “a reacção dos activos de risco poderá ter sido excessivamente optimista, ainda que estejamos em crer que este tipo de solução poderá mitigar a interligação entre os riscos Soberano e Financeiro e não pesar excessivamente no erário público, ainda que se verifique um empréstimo do Fundo destinado à recapitalização do Sector Financeiro (Estado) ao Fundo de Resolução que passará a ser o accionista do Novo Banco”.

Divisão do banco: melhor solução

Mais opinativo, Diogo Teixeira, Administrador da Optimize Investments, entende que “a solução encontrada para a resolução do caso BES parece ser a “melhor possível” no contexto actual”. Na perspetiva do profissional, “tendo em conta a dimensão do “buraco” já constatado, ou por conhecer (nomeadamente BES Angola)”, o  financiamento com intervenção do Estado, ou uma nacionalização do banco, “só teriam servido para deslocar o problema para o mercado da dívida soberana, sem dar uma resposta adequada à questão do “moral hazard””.

Fronteira ente sector financeiro e Estado

Destacando ainda o caráter inédito da solução, já que se “acionou pela primeira vez o Fundo de Resolução”, Diogo Teixeira fala da "demarcação de uma fronteira, embora ainda porosa, entre as responsabilidades assumidas pelo sector financeiro e o Estado”. “Se tudo correr bem, o Fundo de Resolução irá recuperar 4,9 MM€ da venda do Novo Banco e reembolsa o Estado. Se tudo não correr tão bem, fica o conjunto dos bancos portugueses responsáveis pela diferença, sem que o contribuinte tenha de assumir qualquer perda”, resume.

Lembrando ainda outro tipo de investidores, “como os de ações ou obrigações subordinadas do BES”, que “teriam preferido outra solução”, o Administrador da Optimize diz que “enquanto investidor, teria sobretudo preferido um envolvimento mais rápido e forte das autoridades de supervisão a partir do momento em que os incumprimentos das regras de resolução dos conflitos de interesses já estavam em praça pública, ou seja a partir do final de Junho”. O profissional conclui dizendo que “uma substituição parcial, e temporária, da antiga administração por elementos do Banco de Portugal teria provavelmente evitado cerca de 1,5MM€ de perdas adicionais, “contratadas” pela antiga administração na primeira quinzena de Julho. Sem essas perdas adicionais, até podíamos sonhar numa resolução “pacífica” do caso BES, sem separação do Banco em duas entidades”.