Especialistas da Pioneer Investments, Deutsche AM e NN Investment Partners falam sobre as ferramentas que faltam ao BoJ para continuar a estimular a economia e manter viva a chama de reflação.
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O propósito do Banco do Japão com a sua decisão de colocar em terreno negativo as taxas no início de fevereiro era travar a valorização do iene. No entanto, nestes dois meses aconteceu precisamente o contrário: o iene valorizou cerca de 9% no seu caminho contra o dólar. “Como acontece por vezes no mercado de divisas, as razões não estão totalmente claras, mas há algumas coisas que conseguimos descortinar”, explica Tanguy Le Saout, diretor de obrigações europeias da Pioneer Investments.
De que coisas está ele a falar? Em primeiro lugar, refere-se ao facto da Abenomics no final de 2012 ter como principal propósito debilitar o iene para devolver competitividade ao sector exportador japonês. “Muitos investidores estrangeiros compraram ativos nipónicos (especialmente ações) e fizeram a sua cobertura de exposição a iene. Agora, no entanto, ao ter caído o Nikkei 225 e ao ter-se fortalecido o iene, parece que os investidores estão a desfazer-se dessas posições e a fechar a cobertura em ienes, colocando mais pressão compradora sobre a divisa”, explica o especialista. Le Saout comenta desta forma, que, ao terem caído as taxas reais dos EUA, a rentabilidade real nipónica (a diferença entre a rentabilidade nominal e a taxa de inflação) também impulsionou a divisa.
Existem outros dois factores que aos olhos dos especialistas estão a contribuir para o fortalecimento da moeda. Um deles é que as estimativas sobre o preço justo do par dólar/iene (algumas situam-no abaixo dos 100 yenes) encontram-se abaixo dos níveis atuais. O outro, tem que ver com o facto do dado de superávit por conta corrente nipónico publicado em fevereiro ter sido mais elevado num ano. “Um superávit por conta corrente geralmente é bom para a divisa”, diz.
Considerando este cenário, será possível que o BoJ volte a intervir? Da Pioneer descartam a hipótese, pelo menos no curto prazo. Da Deutsche AM, os co-responsáveis de obrigações globais, Joe Benevento e Joern Wasmund, chamam a atenção para a escassa margem de manobra do BoJ para implementar outra fase de QE, de longe o de maior dimensão de todos os que foram implementados pelos bancos centrais nos últimos anos: “No Japão não sobram muitas obrigações que o sector privado esteja disposto a vender. Isto significa que, para continuar o QE, o BoJ poderá ter que comprar ações (depois de ter começado a comprar ETFs no ano passado) ou qualquer outro ativo em que possa pôr as mãos”.
Sobre a efetividade das taxas negativas no Japão, ambos os especialistas opinam que “tem sido cada vez mais claro nos últimos meses que não é uma solução mágica, especialmente em economias relativamente grandes como a Zona Euro ou o Japão”.
Fim da magia?
Mas suponhamos que estes sinais são um ponto de inflexão nestes quatro anos de Abenomics. Da NN Investments Partners, o economista sénior Willem Verhagen e o estratega Maarten-Jan Bakkum descartam a ideia de que a apreciação do yen seja uma prelúdio de tempos mais difíceis para a economia nipónica: “É justo dizer que o Japão está a ir no caminho certo, para sustentar o momento positivo do crescimento, mas a força deste momento tem-se declinado nos últimos seis meses e agora existem riscos de queda”. Neste cenário, os dois especialistas acreditam que “a economia poderá necessitar de alguns estímulos para melhorar as probabilidades de uma reflação bem sucedida”.
Segundo Verhagen e Bakkum, estas probabilidades de êxito vão depender de dois factores. O primeiro, que se cumpra o propósito do manifesto do BoJ em ativar o ciclo virtuoso pelo qual os japoneses deixam de poupar para gastar. “A variável crucial aqui é o excesso de poupança corporativa. Os negócios japoneses disfrutaram de um incremento substancial da rendibilidade que lhes levou a aumentar o seu ritmo de gastos com a procura laboral, tanto sobre o capex como sobre os salários”, explicam os especialistas. Apesar destes sinais, comentam que o ritmo de gastos não ultrapassou o crescimento de poupança das empresas, que continuam a representar 8% do PIB. “Não pode acontecer uma reflação sustentada até que uma grande quantidade de dinheiro corporativo comece a trabalhar. No entanto, a probabilidade de que isto aconteça diminuiu devido à forte apreciação do iene e à queda da bolsa”, aclaram da NN Investment Partners.
O segundo factor que deve ser cumprido é “um incremento equilibrado dos lucros, dos preços e dos salários”. Os especialistas recordam que, desde da chegada de Shinzo Abe ao poder, os desequilíbrios nestas três variáveis eram praticamente irreconhecíveis. “Essencialmente, o BoJ gerou uma séries de choques positivos, um de cada vez, para nivelar os lucros e os preços através de uma forte depreciação da taxa de câmbio, na esperança de que isso fizesse com que as expectativas se desancorassem do seu equilíbrio deflacionário”, recordam o economista e o estratega. Para eles, esta estratégias funcionou verdadeiramente, já que em meados de 2015 conseguiu-se que as expectativas da inflação subissem para cerca de 1%, permitindo que o banco central começasse a sua tarefa de normalizar os lucros, os preços e os salários.
No entanto, nos últimos meses vimos a apreciação do iene e a queda do preço da energia a afetar diretamente os salários e a inflação; além disso, o crescimento nominal dos salários, como consequência da renegociação anual entre sindicatos e empresas (Shunto em japonês) tem sido decepcionante, de 0,3% em comparação com os 0,7% do ano passado. “Isto pode ser, por si só, uma expressão da queda das expectativas de inflação ao mesmo tempo que aumentou a incerteza, e provavelmente também tenha um papel relevante, a queda da rentabilidade corporativa”, explicam Verhagen e Bakkum.
A conclusão dos especialistas é que “umas expectativas de inflação mais baixas são uma ameaça para a credibilidade do BoJ e incrementam o risco de que a sua medida favorita para estimular a inflação não alcance o objetivo de 2% para setembro de 2017”.