O Banco Central Europeu cumpriu o corte de taxas telegrafado na reunião de abril, mas elimina do seu comunicado a referência a futuros cortes. As gestoras internacionais já alertam: sabemos a direção das taxas, mas não a velocidade.
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O BCE cumpre o guião telegrafado na reunião de abril: reduz as taxas em 0,25% para situar a taxa de depósito em 3,75%. Estamos perante o primeiro corte desta taxa de juro na União Europeia desde 2019 e o ponto final do ciclo de endurecimento monetário iniciado em julho de 2022. Com isto, o BCE já é o quarto banco do G10, após o SNB, Riskbank e Bank of Canada, a iniciar o seu ciclo de flexibilização. A decisão surpreendeu poucos, mas o dado mais relevante da reunião de junho é a alteração que introduziram no comunicado: elimina a referência a futuros cortes.
Em vez de “se a avaliação atualizada do Conselho de Governo [...] aumentar ainda mais a sua confiança de que a inflação está a convergir para o objetivo de forma sustentável, será apropriado reduzir o atual nível de restrição da política monetária”, o texto refere que “o Conselho de Governo vai continuar a aplicar uma abordagem dependente dos dados e de cada reunião”. “A declaração sobre a decisão de política monetária foi clara: o Conselho de Governo não se compromete de antemão a seguir uma trajetória de taxas determinada”, salienta Felix Feather, economista na abrdn.
Por isso, a mensagem das gestoras internacionais é de não celebrar antes da vitória. “Lagarde não se quer comprometer de antemão com novos cortes. Está a adotar a abordagem gradual e prudente, como os demais bancos centrais, e vai reavaliar a situação, reunião a reunião. A velocidade e o calendário dependerão dos dados de inflação”, insiste Nicolas Forest, diretor de Investimentos da Candriam.
Uma pausa em julho?
Como bem assinala Nicolas, o BCE tem elevado as suas previsões de inflação para 2024 e 2025, o que implica que este corte inicial poderá não assinalar o início de um ciclo de flexibilização sustentável. E é uma interpretação com a qual Ulrike Kastens, economista da Europa na DWS, concorda, esta visão de que a previsão implica cortes muito graduais das taxas de juro.
Na gestora alemã preveem uma pausa em julho, antes de o BCE voltar a fazer cortes em setembro e dezembro. E assim o interpretam também na Fidelity International. A trajetória das taxas do BCE dependerá da evolução dos dados daqui para a frente e da Fed, a qual Ahmed também acredita que não poderá fazer cortes este ano dada a rigidez da inflação americana. “É provável que as recentes surpresas em alta dos salários e da inflação mantenham os membros do Conselho numa posição prudente”, argumenta.
“Os riscos inclinam-se para menos cortes, principalmente devido a uma inflação rígida dos serviços, um mercado laboral resistente, condições financeiras menos estritas e considerações de gestão de riscos do BCE”, comenta Konstantin Veit, gestor na PIMCO, que prevê mais dois cortes em 2024.
Não é o típico ciclo de cortes
Este não é o típico ciclo de cortes, alerta Ann-Katrin Petersen, estratega chefe de investimentos para Alemanha, Áustria, Suíça e Europa Oriental do BlackRock Investment Institute. "Este corte foi bem telegrafado, mas o ciclo de corte não. Não se trata de um regresso ao mundo que conhecíamos, em que a inflação estava consistentemente bem abaixo da meta de 2%. Com os mercados de trabalho ainda tensos e a produtividade fraca, as pressões internas sobre os preços podem manter a inflação próxima ou acima de 2%", argumenta.
O conceito de dado-dependência continua a reinar. "Continuaremos a acompanhar de perto as expetativas de inflação, a evolução salarial e a inflação dos serviços. São indicadores-chave da persistência da inflação que determinarão o ritmo e o alcance do ciclo de corte de juros do BCE", comenta Gurpreet Garewal, estratega de macro, rendimento fixo e soluções de liquidez da Goldman Sachs AM.
Inflação e salários
"A decisão dependerá dos próximos dados económicos, principalmente da inflação e da evolução salarial, como Lagarde voltou a afirmar durante a conferência de imprensa", concorda Mauro Valle, responsável de rendimento fixo da Generali AM, parte do ecossistema da Generali Investments. Ele espera que o cenário económico europeu confirme a tendência de recuperação após a fase de estagnação dos trimestres anteriores, mas não é percebido como forte o suficiente para gerar um risco de inflação.
“Alguns membros do comité querem observar avanços significativos no futuro antes de apoiar outro ajuste de taxas de juro. A outros pode agradar que a Reserva Federal dos EUA se una à trajetória da normalização antes de se aventurarem demasiado”, acrescenta Dave Chappell, gestor sénior de fundos de Obrigações na Columbia Threadneedle Investments. E exatamente outro ponto que salienta Monica Defend, responsável do Amundi Investment Institute, é até que ponto o BCE pode divergir da Fed. “Acreditamos que a margem de divergência é limitada, visto que os sinais que estão a aparecer sobre o abrandamento dos EUA darão à Fed mais margem de manobra”, opina.