David Simner, gestor da Fidelity International, calcula que a autoridade monetária helvética tenha investido 85.000 milhões de francos na compra de ações norte-americanas que pagam dividendos, com vista a representar 25% do seu balanço.
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Enquanto todos os olhos estão postos no BCE e na Reserva Federal, na procura por maior clareza sobre as suas respetivas políticas monetárias, há um banco central que já há algum tempo passa despercebido e que, no entanto, tem efetuado aquele que é provavelmente o pacote de estímulos quantitativos pouco convencionais menos convencional de todos até agora. Trata-se do Banco Nacional da Suíça (BNS) e quem comenta esta situação é David Simner, gestor de fundos de obrigações na Fidelity International: “O BNS está a comprar ações. Tem já uma carteira que ronda os 85.000 milhões de francos suíços (cerca de 72.700 milhões de euros) em ações e converteu-se num dos maiores proprietários de ações norte-americanas de todo o mundo”, afirma.
Provavelmente, começaram a comprar há dois anos e meio. Se voltarmos atrás no tempo, a princípios de 2015, foi quando se produziu o famoso colapso do franco suíço, precisamente depois da autoridade monetária decidir retirar o seu vínculo ao euro. Portanto, a compra de ações formou parte da nova estratégia do BNS para sustentar o franco suíço. A chave para o sucesso, tal como descreve o gestor, está no tipo de ativos que a autoridade helvética está a comprar, que não são domésticos, à diferença dos outros bancos centrais que efetuaram programas de aquisição de ativos. “A questão é que os lucros que o BCE faz regressam à economia doméstica, o mesmo que acontece com o Japão, os Estados Unidos e o Reino Unido. Todos compram ou comprarão ativos domésticos”, explica Simner.
Em contrapartida, o BNS apenas está a adquirir ativos estrangeiros. O especialista observa que, por um lado, tem adquirido obrigações europeias a curto prazo para que o euro se mantenha mais forte que o franco suíço. “Na realidade, todas as ações que estão a ser adquiridas têm como objetivo controlar o franco suíço, mais do que controlar a inflação nacional, ainda que, obviamente, haja um canal através de uma taxa de câmbio mais débil face ao controlo da inflação”, esclarece o gestor.
No entanto, a parte mais curiosa deste programa de estímulos quantitativos passa pela aquisição de ações americanas, particularmente aquelas que tenham uma política de retribuição ao acionista. Simner cita nomes como Apple, Microsoft ou Exxon Mobil. “Todas pagam dividendos, mas esses dividendos estão a ser extraídos do país porque vão todos para a Suíça, para o Banco Nacional da Suíça. Estou realmente surpreendido com o facto das autoridades norte-americanas não terem notado este movimento”, afirma o gestor. Este concorda que, em contrapartida, apenas agora “o mercado está a começar a dar conta de que o BNS é uma máquina de fazer dinheiro”. De acordo com os dados extraídos do site oficial do BNS, a proporção de ações no balanço da entidade ascende 25% do total (dados de 31 de dezembro de 2016).
O especialista explica que o modus operandi do banco central consiste basicamente “em comprar o S&P 500, mas através de compras individuais de ações”. O volume das transações é tal que, como resultado, o BNS está agora “geralmente no top 20 dos maiores acionistas destas empresas”. Ao observar estes dados, pode perguntar-se por que motivo esta instituição está a adquirir ações norte-americanas e não suíças. Simner também tem resposta para esta pergunta: “o problema da Suíça é ser uma economia pequena. O universo de empresas suíças não é suficientemente grande para implementar este programa ali”. A isto acrescenta-se que, como o principal propósito por detrás destas ações reside em manter de forma artificial a debilidade do franco, o BNS “permite a estas empresas, que são principalmente exportadoras, que possam competir”.
Danos colaterais
Simner alerta sobre as implicações que este programa de estímulos tem tanto para a Suíça como para os Estados Unidos. “É incrível que o franco suíço esteja a ser efetivamente apoiado por ações norte-americanas. É uma situação que me preocupa porque se as ações americanas corrigem 20%, algo que tem precedentes históricos, deixam um enorme buraco no balanço do BNS”.
A outra preocupação do gestor é o facto de, graças a estes estímulos continuados, agora a divisa helvética está a regressar a níveis semelhantes aos dos princípios de 2015. “Se as autoridades suíças pensarem em interromper as suas compras de obrigações e de ações para o franco chegar ao nível de debilidade que procuram, isso poderá afetar os mercados europeus e prejudicar seriamente as curvas europeias. Também poderão distorcer o comportamento do S&P 500”, alerta o especialista. “Para mim, este é um dos exemplos mais explícitos de que o banco central está a criar francos suíços literalmente do nada”, conclui Simner.