Do consumo discricionário à tecnologia na Europa de Leste: quão grande pode ser o regresso à bolsa europeia?

pequeno almoço generali
Almudena Mendaza, Francisco Louro, Luis Sancho e Guilherme Neves. Créditos: Vítor Duarte

Uma pausa na atratividade do tema das obrigações trouxe a lume uma recente mesa redonda em que as ações europeias foram o enfoque. Apesar do esplendor que o S&P 500 ofereceu em 2023 - com a alavanca das chamadas 7 Magníficas - a Europa tem pontos atrativos no seu mercado acionista. Talvez a pergunta que se afigura é: onde? Num debate promovido pela Generali Investments houve espaço, precisamente, para perceber esse onde, mas, também, a mecânica do como chegar a esses pontos de valor. 

Na opinião de Almudena Mendaza, responsável de Vendas na Generali Investments, a verdade é que a Europa está a demonstrar pontos interessantes de investimento, e é preciso olhar para eles deixando de lado os paradigmas de outrora. “O ponto de discussão passa por pensar numa perspetiva diferente sobre a Europa, já que escolher entre growth ou value continua a ser a eterna discussão. Nos últimos sete ou oito anos, sensivelmente, estivemos errados na forma como decidimos alocar investimento a ações europeias, olhando para um estilo específico de investimento”, começou por introduzir a profissional. Embora seja consensual que o estilo growth teve um crescimento significativo nos últimos anos, a responsável enfatiza que essa etiquetagem das empresas fez esquecer que “muitas das percebidas como value também oferecem boas oportunidades”.

É nesse sentido que Almudena Mendaza recorda que na Aperture, uma das boutiques do grupo que representa, tiveram de mudar um pouco o seu posicionamento sobre o tema, abordando-o num sentido que apelida de “behavioral finance” e “pensando em empresas que possam surpreender o investidor”. Aponta o caso da ASML como um exemplo dessas empresas. “Queremos cada vez mais investir numa perspetiva blend e, em simultâneo, encontrar empresas ligadas à inovação. Somos um pouco obcecados com essa ideia de encontrar inovação. E quando falo de inovação não é apenas tecnológica. Trata-se, sim, de uma questão de mindset das empresas”. 

EUA vs. Europa: olhar os nichos

Obviamente que o inevitável confronto entre as valuations da Europa em comparação com os EUA também é tema, e ajuda a contextualizar a atratividade das bolsas de ambas as regiões. Guilherme Neves, gestor na Invest Gestão de Activos, acredita que, genericamente, as ações europeias estão mais baratas, pois “a economia dos EUA é mais dinâmica e tende a exibir mais crescimento, existindo também nos EUA empresas com fortes vantagens competitivas”. Tendo em conta a experiência que tem em carteiras relativamente concentradas, como o próprio apelida, o gestor diz conseguir encontrar empresas europeias “com boa qualidade e valuations baratas”. Onde? Não está positivo em todos os setores, mas o do consumo discricionário europeu é um bom exemplo de superioridade face aos EUA. “Não vejo nenhuma LVMH no S&P 500”, diz convictamente. Adiciona à lista também importantes empresas europeias de saúde, industriais e em setores mais value, nomeadamente em “algumas empresas energéticas”.

Para Francisco Louro, diretor de Investimentos na Bluecrow, as valuations mais elevadas nos EUA face à Europa também devem ser contextualizadas. “Olhando para o S&P 500 percebemos que este tem um P/E de 23, enquanto que os índices europeus têm de 13. Mas se retiramos as sete magníficas e as tecnológicas do S&P 500, e se olharmos setor a setor, o prémio não é assim tão mais elevado”, iniciou. Lembrando que a Europa também tem o seu conjunto de empresas comparáveis às 7 Magníficas, as chamadas GRANOLAS - que inclui empresas como a LVMH, Novo Nordisk, L’Oréal, Nestlé, etc. -, o profissional frisou a importância que para si tem olhar para lá do óbvio. “Se olharmos para certos nichos encontramos empresas com negócios de altíssima qualidade, como acontece, por exemplo, no setor da saúde. É o caso da Straumann AG na Suíça ou a CarlZeiss Meditec na Alemanha. Se estas empresas fossem cotadas nos EUA, estariam provavelmente a negociar com múltiplos mais elevados. Existem empresas muito boas na Europa, mas a verdade é que se tem de escavar um pouco mais fundo para as encontrar”, enfatizou. 

A título de exemplo referiu a importância que tem ultimamente atribuído a empresas da Europa de Leste, nomeadamente no setor da tecnologia. “Existe quase um boom neste setor já que alguns destes países construíram ecossistemas muito atrativos, devido à flexibilidade das leis laborais e fiscais como é o caso da Polónia”, adiantou, referindo que, por isso, tem aumentado a sua exposição à Europa. 

Empresas europeias melhores do que a sua economia 

Luis Sancho, responsável de Investimentos na BBVA AM, adicionou à conversa um ponto de relevo: “As empresas europeias geram uma maior parte das suas receitas no estrangeiro face ao que geram internamente”. Uma ideia que também o leva a querer distinguir o estado da economia face ao das empresas. “As empresas europeias estão em melhor forma do que a economia europeia per se”, sublinhou. 

Falando de algumas das marcas e empresas mencionadas por outros membros do painel, Luis Sancho enfatiza a dificuldade que os EUA têm “em replicar certas marcas de luxo que a Europa apresenta”. Se se falar da economia de ambas as regiões, a história já é diferente. “Claro que se compararmos o desempenho da economia europeia com a dos EUA, os EUA estão em melhor forma. Os EUA têm custos energéticos mais baixos, custos de trabalho mais reduzidos, a tecnologia prevalece…”, refere. Embora o profissional não queira exatamente passar a ideia de que está sobreponderado na Europa, para si uma coisa é certa. “Devemos tratar a Europa tendo em mente que lá existem muito boas oportunidades”, concluiu.