Guia do investidor para acompanhar as eleições alemãs

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Créditos: Christian Wiediger (unsplash)

Este domingo, 26 de setembro, realizam-se as eleições gerais na Alemanha. Um encontro com as urnas que vai marcar o fim da era Merkel. E, possivelmente, uma mudança de governo. As gestoras internacionais analisam as eleições alemãs do ponto de vista do investimento com as principais implicações para as carteiras.

O que esperar das sondagens

Hoje, as sondagens apontam para uma vitória do Partido Social Democrata (SPD) ou da conservadora União Democrata-Cristã/União Social Cristã (CDU/CSU). Mas não estaremos perante uma maioria absoluta. Possíveis cenários de coligação abrem-se.

Podemos estar à beira de um momento histórico na política alemã, como aponta Tilmann Galler, estratega dos mercados globais da J.P. Morgan AM. As sondagens colocam o social-democrata Olaf Scholz (SPD), o atual ministro das Finanças, como favorito, seguido por Armin Laschet, da coligação democrata-cristã formada pela CDU e pelo seu partido irmão bávaro, a CSU, e Annalena Baerbock, candidata do partido ecologista os Verdes. O que Galler considera mais provável é que os três terão de unir forças para formar um governo de coligação. “Algo insólito nos últimos 60 anos da democracia alemã”, destaca.

Mas não é assim tão simples. “A CDU/CSU pode não concordar em fazer parte de uma coligação liderada pelo SPD. “E o SPD também não seria a favor de uma aliança”, defende François Rimeu, estratega sénior da La Française AM. Então, as três coligações mais prováveis que prevê são:

    Semáforo: Coligação do SPD, Verdes, FDP, com Olaf Scholz como chanceler.

    Vermelho-Vermelho-Verde: Coligação do SPD, Verdes e da esquerda, com Olaf Scholz como chanceler.

    Jamaica: Coligação CDU/CSU, Verdes e com Armin Laschet como chanceler.

Efeito sobre as ações

Para as ações, o resultado pode ser transcendente. O único risco é, segundo Galler, a formação uma coligação de esquerda que inclua o partido de extrema-esquerda Die Linke. “Se assim for, espera-se que a política económica alemã sofra uma grande mudança: a intervenção do governo será mais pronunciada e as políticas de redistribuição da riqueza serão implementadas”, explica. Ou seja, assistir-se-ia a um aumento da despesa pública, do salário mínimo e dos impostos, e a um aumento significativo da regulação do setor industrial. Isto poderia fazer descarrilar o crescimento do país e gerar nervosismo nos mercados de ações.

Mas, neste momento, não é o cenário base que os gestores preveem. “A necessidade de formar uma coligação que contenha os Verdes e os liberais reduz o risco de fortes medidas de aversão ao mercado”, defende Martin Wolburg, economista sénior da Generali Investments Partners.

Onde pode haver mais movimento é nas despesas em infraestruturas. “A insuficiência das infraestruturas alemãs é uma questão há muito pendente”, afirma Wolburg. As estimativas do défice da infraestrutura situam-se entre 450.000 e 500.000 milhões de euros.

Todos os partidos querem abordar a questão do investimento público, ainda que em graus diferentes. Os Conservadores são os menos determinados em termos de números e querem focar-se na digitalização e modernização da administração. Pelo contrário, os Verdes tencionam fazer investimentos públicos adicionais de 500 mil milhões de euros nos próximos dez anos. Tecnicamente, será gerido através uma empresa instrumental fora do orçamento. Os planos de infraestruturas dos Verdes recebem apoio público de vários institutos. Existe o acordo de que as atuais taxas de juro baixas devem ser aproveitadas para investir em atividades futuras. “Consideramos provável que esta ideia (embora provavelmente reduzida) chegue a qualquer acordo de coligação que inclua os Verdes”, aponta Wolburg.

Efeito sobre as obrigações

No entanto, as grandes mudanças podem ser notadas nas obrigações. Aqui o resultado da eleição pode inclinar a balança, explica Galler. Um novo governo composto pela CDU/CSU e, em particular, pelo FDP, um forte defensor das medidas de austeridade e dos critérios estabelecidos no Tratado de Maastricht, poderia mitigar os riscos dos spreads associados à União Monetária.

Pelo contrário, um governo progressista implicaria um novo ajustamento dos spreads entre as obrigações dos países periféricos e as obrigações federais alemãs, motivado pela intenção de aumentar as despesas públicas na Alemanha, pelo apoio as uns limites de défice e de dívida menos rigoroso na UE e à aceitação das transferências fiscais.

E este é o cenário em que avançaríamos se no final o líder das sondagens governasse. O manifesto eleitoral dos sociais-democratas deixa claro que o partido de Scholz considera a austeridade fiscal como o caminho errado no ambiente pós COVID-19. No enquadramento constitucional alemão, os sociais-democratas podem tentar esgotar todas as possibilidades de aumentar os níveis de dívida para financiar o gasto público. “Os investidores obrigacionistas devem, portanto, preparar-se para um aumento dos níveis de emissão de obrigações soberanas alemãs, o que pode colocar uma pressão ascendente sobre as rentabilidades das obrigações", prevê Wolfgang Bauer, gestor da equipa de obrigações da M&G.

Ganha o ESG

Uma frente que poderia ganhar em vários cenários, de acordo com Amundi, é o ESG. Dado que é provável que os Verdes participem em qualquer coligação governativa, espera-se que isso impulsione a sustentabilidade. É evidente que é preciso ter em conta que isso poderá dificultar a obtenção de uma norma ESG à escala da UE, uma vez que, tradicionalmente, os Verdes são contra a energia nuclear.

No entanto, as ações alemãs são atrativas para a Amundi com foco nas indústrias que estão em transição para o objetivo de zero emissões líquidas até 2045. Em termos mais gerais, setores como a energia verde e o automóvel poderiam ser interessantes, dada a atenção prestada à transição para a mobilidade elétrica. É um ponto em que Rimeu concorda: “Mencionaram que querem assegurar a transição para uma economia de emissões zero com 100% de energias renováveis até 2035. Pretendem ainda que os carros elétricos substituam os carros de combustão até 2030”.

Mas os Verdes também entrariam no tabuleiro de xadrez geopolítico. Por exemplo, são contra o controverso gasoduto Nord Stream 2 que virá da Rússia através do Mar Báltico e que o governo de Merkel continua a defender. Mostraram abertamente o seu apoio aos grupos da oposição na Rússia, na China e na Bielorrússia. “No contexto da rápida subida dos preços da energia na Europa e da desglobalização, esta postura política pode levar a uma nova pressão sobre os preços do gás a médio prazo, com consequências positivas para a inflação”, explica Rimeu.