John Surplice e a sua teoria de quality transition

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John Surplice. Créditos: Cedida (Invesco)

Segundo John Surplice, responsável de Ações Europeias da Invesco na Henley, no mercado de ações existem três formas de fazer dinheiro. A primeira é investir em compounders, isto é, em empresas líderes, muito bem posicionadas e com um Retorno sobre o Capital Investido (ROIC) no primeiro quartil dentro do seu setor. A segunda é investir em função do ciclo económico, ou seja, tendo em conta a evolução macroeconómica e fazendo uma boa gestão dos timings do mercado. Mas, para Martin Walker, cogestor do Invesco Pan European Equities, fundo com Rating FundsPeople em 2022, existe uma terceira via, que é, talvez, a mais eficaz: apostar nas empresas enquadradas no que ele denomina de quality transition (transição de qualidade).

Tal como explicava num pequeno-almoço recentemente organizado pela gestora, o sucesso reside na exploração de anomalias nas avaliações onde existe potencial e vontade da empresa para fazer melhor. “A longo prazo, o potencial de rentabilidade das empresas que se enquadram neste conceito de transição de qualidade é maior que o das compounders, ou seja, empresas que já estão estabelecidas nesse primeiro quartil pelo ROIC, sendo precisamente o tipo de ações em que os investidores se devem focar. No entanto, apostar em negócios do segundo e terceiro quartil que podem prosperar no primeiro é mais rentável”, afirma. Mas… quanto mais rentável pode ser identificar estas empresas e investir nelas com uma visão a longo prazo?

Resultado da sua análise

De acordo com a sua análise, cujos resultados são apresentados no gráfico seguinte, as empresas com um ROIC no primeiro quartil, que conseguem manter esta posição, oferecem, em média, um retorno anual de 5%. Por outro lado, as empresas quality transition que estão no terceiro quartil em termos de ROIC, empresas de qualidade, com uma valorização atrativa e que têm aproveitado as suas forças para melhorar o seu negócio e saltar para o quartil superior, geram um retorno anualizado médio de apenas o dobro (10%). “É um potencial de rentabilidade superior que é mais difícil de capturar. Em muitas ocasiões significa investir em negócios que não contam com o favor do mercado nesse momento. É isso que tentamos fazer e o que todos os gestores ativos querem conseguir fazer”.

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Caso prático: Carlsberg

Um caso prático de uma empresa que se enquadraria neste conceito de quality transition defendido por Surplice é a cervejeira dinamarquesa Carlsberg. “É um exemplo clássico. Trata-se de uma empresa com margens muito reduzidas e praticamente sem crescimento, que não estava presente em alguns mercados emergentes mais atrativos. Além disso, após o início da guerra na Ucrânia, a empresa anunciou a sua retirada da Rússia, com um consequente impacto na sua faturação. Era uma empresa que parecia andar ao sabor do vento, e, no entanto, conseguiu construir muito bem a sua marca. Na China tem já 7% da quota de mercado e conseguiu saltar do terceiro quartil do ROIC para o primeiro”, assinala Surplice.

Como identificar a quality transition

Assim, a próxima questão a ser feita é que fatores são necessários para identificar com sucesso estas empresas. E aqui o gestor é muito claro: “É uma combinação de uma análise rigorosa, disciplina, paciência e engagement, algo fundamental para saber quais são as alterações que estão a ser realizadas pela direção para impulsionar o negócio”. Na sua opinião, o sucesso de um investimento não consiste em construir uma carteira com uma determinada exposição setorial ou fatorial. “É mais uma questão de efetuar uma análise pormenorizada das empresas e do seu posicionamento no mercado, visando encontrar empresas de qualidade que possuam forças competitivas que lhes permitam tirar partido e que também estejam a negociar a preços atrativos”, sublinha.

Para Surplice, o value, que é a filosofia que defende desde que iniciou a sua carreira, não é comprar empresas com ratings de investimento muito baixos baratas, mas sim bons negócios cotados a múltiplos atrativos. “Desde o início da crise financeira, houve uma série de acontecimentos extraordinários que alteraram consideravelmente o comportamento normal dos mercados (crises de dívida, Brexit, COVID-19,...). Mas o value investing é o que sempre funcionou para mim. A crise atual revelou oportunidades de investimento muito interessantes. Hoje podes comprar bons negócios pagando praticamente nada por eles. O contexto é muito complicado, mas é importante não capitular. Num cenário de recuperação, algumas empresas vão voar”, conclui.