Impacto económico da guerra na economia a curto e a médio prazo

Carlos Bastardo ISEG Imofundos_noticia
Carlos Bastardo. Créditos: Vítor Duarte

Tribuna de Carlos Bastardo.

A invasão da Rússia à Ucrânia começou há um mês. O impacto na economia dos dois países é muito significativo. Na Ucrânia, a paralisação de muitos setores de atividade e o grau de destruição das infraestruturas e construções pelas bombas e mísseis russos são fatores devastadores para a economia do país. Na Rússia, apesar da subida do petróleo e do gás natural, as sanções ocidentais têm impacto no curto prazo e no médio/longo prazo. A Rússia está a vender petróleo e cereais a vários países como a Índia, com elevados descontos, pois naturalmente necessita de dinheiro.

A Rússia viu o rating da sua dívida descer para níveis próximo do default (D). Para já, pagou alguns cupões de juros de obrigações emitidas em USD a partir de dinheiro em contas congeladas, o que não deixa de ser surpreendente! Se o dinheiro está congelado, como é que os obrigacionistas o receberam? Foi descongelado para que pudesse chegar às contas dos obrigacionistas? Ou continua congelado nas contas dos obrigacionistas? Esta situação pode abrir um precedente e, por outro lado, belisca as sanções. Vamos ver o que se vai passar nos próximos vencimentos de juros e de capital de dívida pública russa.

Mas, se estes dois países são os mais afetados em termos económicos, a Europa também o está a ser.

A dependência significativa do gás natural e do petróleo russo, erro estratégico dos políticos europeus (sobretudo dos alemães) é outro problema que deveria ter sido resolvido desde 2014, altura da invasão da Crimeia pela Rússia e em que Putin demonstrou aí o seu grande apetite em conquistar território.

Mas não são apenas as commodities do setor energético que subiram nos últimos meses. As commodities agrícolas como o trigo, a aveia, os grãos, o milho, o café… evidenciaram crescimentos no último ano entre 30% e 70%.

Os custos de transporte e contentores aumentaram, em alguns casos 3 a 5 vezes em média.

Com os custos de produção a aumentar, naturalmente a inflação irá continuar pressionada. Se antes do início da guerra, a inflação já estava em níveis elevados devido ao facto de a normalização das cadeias de produção e abastecimentos de bens demorar mais do que os bancos centrais e muitos analistas financeiros estimaram há uns meses atrás, com o conflito, as condições para a subida ou pelo menos para a manutenção de uma inflação elevada são bem patentes.

Em fevereiro, a inflação na União Europeia foi de 5,9%.

As projeções económicas para 2022 já estão a ser revistas em baixa. As que já são conhecidas, apontam para uma revisão em baixa do crescimento económico mundial entre 1% a 1,5% este ano. Mas o verdadeiro impacto da guerra só será mais visível dentro de meses, pelo que, a revisão em baixa do crescimento económico poderá ser de maior amplitude.

Por outro lado, a China está a atravessar uma nova onda pandémica, com algumas cidades confinadas. Também para este país, já começaram a ser revistas em baixa as projeções do crescimento do PIB para este ano.

Contudo, as grandes alterações que vamos assistir nos próximos anos vão ser no modelo da economia global. A globalização vai ou já está a ser afetada. A desconfiança entre os blocos EUA, Europa e o eixo China / Rússia vão aumentar. Claro que a evolução do nível de desconfiança vai depender do desfecho da guerra Rússia / Ucrânia, mas o leite já está derramado!...

Mesmo que a guerra termine dentro de semanas, como é que irá decorrer qualquer cimeira entre responsáveis ocidentais e Putin daqui para frente? Vão apertar-lhe a mão, apesar das atrocidades cometidas? Vão confiar no que ele diz, após ter referido antes da invasão que não iria invadir a Ucrânia e todos nós sabemos o que fez no dia 24 de fevereiro de 2022?

Os políticos europeus têm de deixar de ser ingénuos, como têm sido pelo menos desde 2014 (invasão da Crimeia).

A Europa tem que se fortalecer em termos de defesa e tem de diversificar as fontes e os fornecedores de energia. Independentemente de continuar a ser um bloco aberto a outras regiões do mundo, tem de se focar mais na resolução dos principais problemas que existem dentro das suas fronteiras e não perder tempo e dinheiro com temas de menor importância.

Na minha opinião, a estratégia deve focar-se no objetivo de sermos cada vez mais os Estados Unidos da Europa.