Carlos Bastardo, no seu artigo mensal, analisa o contexto atual e o futuro da dívida pública portuguesa.
Estando o rating da dívida soberana portuguesa na fronteira entre o junk e o investment grade, uma das questões que convém refletir é porque as agências de rating internacionais (com exceção da agência canadiana DBRS) mantêm a notação de risco da dívida pública abaixo de BBB- ou de Baa3?
Muitos questionam este posicionamento, uma vez que segundo eles Portugal tem demonstrado francas melhorias. Será mesmo?
O problema principal que a meu ver inquieta as agências de rating e os nossos credores é a sustentabilidade do crescimento económico de Portugal. O modelo económico assenta em demasia no consumo privado, em detrimento de outras variáveis como o investimento ou as exportações. Por exemplo, as exportações em 2016 aumentaram apenas 0,9%, mas se retirarmos as receitas do turismo (ano excelente), as exportações decresceram.
O défice público de 2016 passou de 3% para 2%, mas tal só foi possível devido a medidas extraordinárias (0,3%) e sobretudo a cativações efetuadas em quase todos os ministérios e a uma redução significativa do investimento público (muito estranho o silêncio dos partidos que apoiam o governo nesta matéria). Sem isso, dificilmente o défice teria cumprido a meta dos 2,5% fixada por Bruxelas.
Mas 2% de défice significa que Portugal ainda não está em equilíbrio. Prova disso, é o aumento da dívida pública para 130% do PIB em 2016 e que continua a aumentar nos primeiros meses de 2017. Esta é a segunda grande fonte de preocupação das agências de rating e dos credores. Até agora, a dívida pública só tem aumentado.
Uma terceira fonte de preocupação é a saúde do setor bancário português, instrumento tão importante para a sustentabilidade do crescimento económico de um País.
Tivemos nacionalizações, resoluções, intervenções, aumentos de capital, CoCos… mas, a agonia dos últimos anos persiste, incluindo o banco público que cometeu no passado o mesmo tipo de erros que os bancos privados.
Com um PIB a crescer abaixo de 2,5% (nível mínimo desejável), com uma dívida pública que continua a subir de valor e com um setor bancário em que o crédito vencido e em risco ainda não parou de aumentar, quem é que se atreve a passar o País de junk para investment grade?
É que neste caso, é como passar uma nota de 9 para 10 valores, ou seja, de uma negativa para uma positiva. É só um valor ou um nível de notação, mas é um nível determinante, pois trata-se de passar a dívida pública portuguesa de um investimento especulativo para um investimento em que o emitente demonstra capacidade para honrar os seus compromissos financeiros a m/l prazo.
Se nesta altura, a dívida pública portuguesa já tivesse um rating de BBB- ou Baa3, seria mais fácil melhorar a notação. Mas não é o caso e, portanto, as agências de rating, enquanto não tiverem a certeza que Portugal está no rumo sustentadamente correto e, acima de tudo, enquanto os bancos não demonstrarem uma melhoria clara de performance e de redução do crédito mal parado, dificilmente o rating poderá melhorar, infelizmente. Mas como estamos quase em Maio, pode ser que haja um milagre!