Ricardo Silva (CA GEST): "Um fundo misto poderá revelar-se uma opção francamente válida"

Ricardo Duarte Silva
Ricardo Duarte Silva. Créditos: Vítor Duarte

TRIBUNA de Ricardo Duarte Silva, selecionador de fundos da Crédito Agrícola Gest.

O risco de mercado permanece no topo das preocupações. Há várias décadas que não assistíamos a uma queda sincronizada tão pronunciada por parte das duas principais classes de ativos (ações e obrigações). Para um gestor de carteiras é sem dúvida desafiante alocar nesta envolvente (quer pela manutenção de níveis elevados de volatilidade, quer pela maior correlação entre os ativos).

Os outlooks

Atendendo aos sinais de abrandamento económico nos principais blocos conjugados com um maior pessimismo por parte dos agentes económicos (consumidor e empresas) é expectável que tenhamos uma segunda metade do ano em desaceleração. Reflexo disso mesmo são as sucessivas revisões em baixa das projeções económicas de diversas instituições internacionais (como o FMI, OCDE, BCE e Fed) e os sinais de maior cautela avançados pelas empresas durante a mais recente época de resultados.

A Europa pela manutenção do conflito militar na Ucrânia e pela maior dependência energética encabeça a lista das potenciais surpresas negativas. Já nos EUA, o impacto poderá advir da política monetária mais agressiva expectada por parte da Fed e da menor confiança do consumidor que tem sido abalada pela escalada da inflação, pela subida dos custos de financiamento e pela queda dos mercados financeiros. Finalmente a China, em contraciclo, poderá beneficiar da reabertura da economia e de uma política monetária e fiscal mais acomodatícia.

A inversão: matérias-primas a cair, obrigações a recuperar

Num cenário de potencial estagflação ou mesmo de recessão económica, duvidamos que as matérias-primas permaneçam imunes à onda de pessimismo que já vai sendo descontada nos mercados de crédito e ações. A redução do poder de compra das famílias, a diminuição de estímulos fiscais e os maiores custos de financiamento permanecem entre os principais riscos capazes de induzir um choque do lado da procura no mercado de mercadorias. Quanto às classes de risco, pensamos que o derating nas ações já vai incorporando algum abrandamento da economia global, mas provavelmente ainda não o suficiente para acomodar um quadro recessivo. Finalmente, as obrigações governamentais poderão aliviar das perdas registadas nos primeiros seis meses, especialmente se a inflação começar a recuar (seja por efeitos de base ou por um qualquer desenvolvimento geopolítico positivo). É, no nosso ponto de vista, pouco crível que os bancos centrais entreguem todas as subidas de taxas de juro já descontadas nas curvas de rendimento sem colocarem em risco o crescimento económico.

Fundos mistos

Sem querer individualizar, um fundo misto poderá revelar-se uma opção francamente válida, especialmente se investido numa lógica de longo prazo. As obrigações já incorporam uma expectativa muito exigente de subida de taxas por parte dos principais bancos centrais. Acreditamos que o poder diversificador da classe poderá ser bem maior na segunda metade do ano, em particular se o movimento de risk off se intensificar (alargamento adicional de spreads de crédito ou queda dos mercados acionistas). A evolução dos ativos de risco dependerá em sobremaneira da capacidade dos bancos centrais combaterem a inflação sem porem em risco a atividade económica, uma gestão sem dúvida difícil e que acarreta múltiplos riscos.

A busca por informação no ESG

Temos introduzido poucas alterações na estrutura das carteiras, mas a integração da nova metodologia ESG, desenhada internamente no último ano, implica uma maior preferência por produtos artigos 8 e 9. Nos alternativos, estamos sempre atentos a estratégias com track record comprovado de forma a diversificar os portefólios.