A equipa da Sixty Degrees AM comenta as suas previsões para as presidenciais nos EUA, aponta para um possível corte de taxas para o final de julho por parte da Fed e descreve o comportamento de várias commodities.
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COLABORAÇÃO da Equipa Sixty Degrees AM.
Apesar do bom momento para os ativos de risco, não podemos iniciar a segunda metade de 2024 sem refletir sobre alguns assuntos que poderão vir a afetar os mercados financeiros nos tempos mais próximos. Enquanto investidores de longo prazo, temos de incorporar os eventos políticos e geopolíticos, sejam eles domésticos ou globais, na nossa decisão de alocação estratégica. Nos últimos quarenta anos, os investidores têm-se tornado complacentes, no sentido em que passaram a considerar que as previsões de crescimento e inflação a longo prazo são apenas uma função de fatores, como o crescimento da força de trabalho, a melhoria da produtividade e das vicissitudes da oferta e procura agregadas a nível global. Uma leitura atenta do pós-Segunda Guerra Mundial revela que a política e a geopolítica sempre tiveram uma influência decisiva sobre o contexto macroeconómico. Com isto em mente, não podemos deixar de assinalar que as eleições presidenciais americanas de novembro são, sem margem para dúvida, o evento que mais irá condicionar a evolução dos eventos geopolíticos à volta do globo, bem como do andamento dos mais importantes fatores macroeconómicos.
Previsões sobre as eleições presidenciais nos EUA
Por um lado, após o inédito debate televisivo entre os atuais candidatos às eleições presidenciais americanas, foi criada a dúvida quanto à personalidade que os democratas pretendem realmente apresentar no duelo de novembro. Tendo em conta as alternativas já adiantadas, na nossa opinião, não será de estranhar que a escolha venha a recair sobre a Sra. Clinton, tendo em conta a sua larga experiência política e que, em 2016, venceu Trump no voto popular. Porém, este braço-de-ferro democrata poderá, no curtíssimo prazo, levar a atual Administração na Casa Branca a reforçar o seu apoio nos conflitos armados em curso e/ou a aumentar a pressão sobre a China no que respeita a Taiwan. A verificar-se alguma destas situações, será natural o aumento da pressão sobre o orçamento federal americano e a manutenção de uma política monetária mais contracionista, para tentar contrariar os efeitos inflacionários dos conflitos armados.
Temos, por isso, uma série de catalisadores negativos à espera de acontecer: inúmeras guerras potenciais, uma situação fiscal completamente insustentável, incertezas com as eleições de 2024, bancos regionais e imóveis comerciais com enormes problemas, dificuldades do lado dos consumidores já visíveis nos resultados recentes das empresas de retalho, e o desemprego que já atinge os 4,1%, o valor mais alto desde novembro de 2021.
Possível corte de taxas no final de julho por parte da Fed
Tendo isto em linha de conta e apesar de o mercado atribuir uma probabilidade quase nula a uma descida das taxas de referência pela Fed no final de julho, é nossa opinião que esse poderá ser o timing ideal para este movimento acontecer. Tendo em linha de conta que a Fed pretende evitar uma recessão a todo o custo (que poderá já ter começado) enquanto gere a taxa de crescimento da economia para reduzir a inflação, a deceção nos dados económicos mais recentes poderá ter aberto uma pequena e estreita janela de oportunidade para a tentativa de inflexão nas taxas de juro.
Preferência pelo mercado norte-americano, mas com algumas preocupações
No que toca às ações, a nossa escolha continua a recair pelo mercado norte-americano em resultado da situação económica relativa ser mais favorável, condicente à atração de maiores níveis de investimento, em particular dos fluxos de capitais internacionais. No entanto, com a capitalização bolsista dos setores tecnológicos a pesar mais de 42% do total do S&P500, acima dos 40,7% atingidos no pico de 2000, o tema da inteligência artificial (IA) passou a estar sob um escrutínio crescente.
Uma situação que nos preocupa no mercado norte-americano prende-se com a proposta da Sra. Yellen para a tributação das mais-valias não realizadas. A administração Biden propôs um novo imposto de 25% sobre o rendimento e as mais-valias não realizadas para os contribuintes que ganham mais de 100 milhões de dólares. A verificar-se, isto abre a porta à criação de um terceiro imposto sobre o rendimento pessoal. Como é habitual, a tributação é dirigida aos mais ricos, mas, mais cedo ou mais tarde, isso será alargado aos restantes contribuintes. Isto só irá dissuadir o investimento das pequenas empresas e dos empreendedores, que contribuem enormemente para a inovação pois trazem criatividade e imaginação aos negócios.
Recuperação e estabilização da China
2024 continuará a ser um período de estabilização controlada para a China, onde os decisores políticos enfrentam a delicada tarefa de manter um equilíbrio entre crescimento e estabilidade. O compromisso com a mudança estrutural a longo prazo permanece inflexível, enquanto estão a ser implementadas as necessárias medidas de flexibilização específicas e anticíclicas para apoiar o crescimento.
As ações chinesas recuperaram acentuadamente dos mínimos de janeiro e desfrutam agora de uma dinâmica positiva, apoiadas pelo despontar de melhorias ao nível dos indicadores económicos e por novos sinais de apoio político. As exportações da China no final de junho deverão aumentar mais de 8% em termos anuais (em dólares americanos) e acima de 10% em renminbi, e assim superar as expetativas dos analistas, apontando para um crescimento do PIB superior ao esperado para o segundo trimestre.
Com a recuperação cíclica em curso e a com a pressão inflacionista contolada, os desafios colocados pelo abrandamento económico – particularmente no sectr imobiliário – merecem um exame atento, no sentido de aferir se a abordagem estratégica e adaptativa da China à gestão do seu desenvolvimento económico será eficaz na estabilização do crescimento e na restauração da confiança dos consumidores e dos investidores.
Abordagem de uma duração reduzida continua a fazer sentido
Em termos de posicionamento em obrigações, continuamos a acreditar que, estrategicamente, continua a fazer sentido uma abordagem de duração reduzida que tire partido da inversão da curva de yields, em especial nos EUA. Porém, caso se materialize um cenário de hard landing, no curto prazo, o hedge natural aos ativos de maior risco poderá justificar um alongamento da duration. Mantemos também a preferência por empresas investment grade face à dívida pública e às empresas high yield. Taticamente, sugerimos maior agilidade na gestão quer da exposição à duration, quer da qualidade de crédito, diferente do padrão de compra e manutenção das décadas anteriores.
Commodities
- Petróleo: espera-se um enorme défice de oferta na ordem dos 1,4 milhões de barris por dia no 3T24, que se deverá reduzir para apenas 500.000 barris por dia no 1T25 devido a uma queda sazonal na procura, uma vez que a procura de petróleo recupera sazonalmente e o crescimento da oferta permanece limitado. Além disso, a OPEP+ anunciou em 2 de junho que iria eliminar gradualmente os cortes voluntários de produção, mas prevê-se que venha a retomar o aumento da produção durante o 2T25. Em resultado destes cortes de produção, a EIA estima que os stocks globais de petróleo deverão continuar a cair durante o segundo semestre, em cerca de 700 mil barris por dia. A mesma agência estima que os preços do petróleo aumentem de uma média de 82 dólares/b em junho para 89 dólares/b na segunda metade de 2024. Por um lado, o alastrar dos conflitos no Médio Oriente e/ou na Ucrânia poderá originar um cenário de preços mais elevado no curto prazo. Já no longo prazo, a dinâmica entre a oferta e a procura é positiva para o preço do petróleo, especialmente se for marcada pelo regresso da economia chinesa e o aumento da procura nos mercados emergentes.
- Urânio: o preço à vista do urânio aumentou 88% no ano passado, tendo a maior parte deste aumento ocorrido num movimento ascendente rápido e quase directo durante a segunda metade do ano. Como tal, acreditamos que a atual correção é natural, num contexto mais amplo de um ciclo de subida, e constitui um sinal saudável de um mercado funcional. Como tal, este pode ser um ponto de entrada atraente no bull market em curso. Um défice de oferta de longo prazo e um interesse renovado na energia nuclear realçam os verdadeiros desafios a superar para restabelecer o equilíbrio do mercado. Sem nenhuma nova oferta significativa no horizonte nos próximos três a cinco anos, acreditamos que este mercado ainda tem muito espaço para subir. Apesar do mercado ter celebrado, em 2023, um novo recorde plurianual ao nível da contratação de urânio a longo prazo, os números globais disfarçam um mercado bifurcado.
- Ouro: embora as taxas de juro mais elevadas no mundo ocidental representem ainda um elevado custo de oportunidade face à detenção de ouro, as sanções impostas pelos governos ocidentais a alguns países, com destaque para a Rússia e o Irão, levaram os investidores não ocidentais, especialmente os seus bancos centrais, a procurar activos fora do alcance de potenciais sanções. No caso dos bancos centrais, a procura de uma moeda alternativa e neutral face ao dólar americano, tem sido a grande razão para a acumulação de ouro que temos vindo a registar nos últimos trimestres. Isto melhorou muito o perfil de risco/retorno do ouro, tornando-o não apenas um diversificador eficiente numa carteira multiativos, mas também uma cobertura contra um risco sistémico exógeno num mundo multipolar. Do ponto de vista de uma carteira de investimento, o ouro continua a ser uma cobertura contra riscos sistémicos nos mercados financeiros, contra a utilização do dólar americano como arma de arremesso geopolítico ou contra a implementação de controlos de capitais para evitar a fuga de capitais face à guerra.
- Prata: após um ano de desempenho quase nulo (a prata ganhou 0,7% em 2023), a prata registou uma forte recuperação no decorrer do primeiro semestre, subindo mais de 22%. A prata tem tentado acompanhar a recuperação do próprio ouro, com ambos os metais a serem impulsionados pela perspetiva de flexibilização da política monetária nos EUA, pela crescente turbulência geopolítica no Médio Oriente e pelas compras dos bancos centrais, especialmente da China. Olhando para o futuro, esperamos que os preços da prata mantenham a tendência de apreciação, impulsionados por taxas de juro potencialmente mais baixas, investimento físico mais robusto, compras de ETF e aumento da procura industrial.
- Câmbios: taxas de juro mais elevadas durante mais tempo nos EUA deverão tornar temporária qualquer fraqueza do dólar americano até às eleições, mesmo que se materialize a recuperação cíclica da economia global. Yields mais elevadas, menos pressa para reduzir as taxas de juro diretoras e a superioridade cíclica da economia dos EUA continuam a ser alguns dos argumentos a favor do dólar. Além disso, é provável que os elevados riscos geopolíticos tragam maior volatilidade aos mercados financeiros, beneficiando assim moedas de refúgio, como o dólar americano ou o franco suíço, e dificultando a valorização sustentável de moedas mais cíclicas, como o euro e o dólar australiano.