Tanto o Brent como o West Texas Intermediate recuperam 37,72% e 24,5% dos seus mínimos atuais… e mostram uma correlação positiva com o dólar.
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Pouco a pouco, o petróleo voltou a ganhar espaço na agenda mediática. O crude registou um rally, especialmente desde o verão, o que levou o Brent (de referência na Europa) a subir mais de 10% no ano e a recuperar níveis inéditos desde junho de 2015. O West Texas Intermediate (de referência nos Estados Unidos) avançou 5,6% em 2017. É igualmente significativo que tanto o Brent como o West Texas cheguem a valores de 37,72% e 24,5% desde os seus mínimos anuais, registados no final do mês de junho (dados da Bloomberg).
Que fatores estão por detrás deste comportamento? Da Legg Mason Global AM destacam as recentes novidades na Arábia Saudita, onde se viveu uma campanha anticorrupção que levou à prisão de importantes empresários e membros da família real. Esta ação levou a que se tenha “acrescentado uma dose extra de incerteza aos mercados globais de petróleo”, segundo os especialistas da empresa. Segundo os observadores internacionais, a campanha irá reforçar o poder de Mohammed bin Salman, príncipe herdeiro da monarquia saudita.
“A diferença em relação ao passado é que, nesta ocasião, este ajuste no equilíbro produziu-se à vista de todos; entre os detidos estava o príncipe Alwaleed bin Talal, uma das pessoas mais ricas do mundo e investidor comprometido ativamente com empresas de alto perfil, incluindo o Citigroup, News Corp e o Twitter”, destacam a partir da gestora. Os seus analistas comentam paralelamente que “não houve nenhuma alteração na política do país face às exportações de petróleo ou ao comércio global”. A conclusão a que chegam é que “a nova liderança aumentou significativamente a sua retórica e ações anti-Irão, o que poderá embrulhar o mercado global de petróleo com políticas regionais, com resultados imprevisíveis”.
Para Bastien Drut, especialista da Amundi, as tensões geopolíticas no Médio Oriente são apenas um dos fatores que impulsionaram a escalada de preços. Acrescenta a estes o facto de a OPEP – em conjunto com a Rússia e outros nove produtores – ter decidido em março prolongar o corte da sua produção até final de 2018, assim como o facto dos Estados Unidos e da Zona Euro terem publicado dados económicos melhores do que o esperado.
Dito isto, Drut descarta que o rally dure muito mais tempo. Cita o último relatório publicado pela Agência Internacional de Energia (AIE), onde a entidade afirmava que os Estados Unidos estão a ponto de se converter num “líder incontestável na produção de gás e petróleo”. Este relatório também ressalta que o incremento da produção de ouro negro registado no país entre 2010 e 2025 “não tem precedentes históricos”, e de facto acredita que irá superar o crescimento que registou a própria Arábia Saudita durante os anos do auge dos petrodólares (1966-1981). O analista acrescenta que o departamento norte-americano de energia prevê um crescimento forte da produção de petróleo nos próximos meses, o que irá manter os preços sob controlo num contexto em que “em nenhum caso a Arábia Saudita deu sinais de não querer que os preços subam demasiado”.
Um comportamento incomum
O especialista destaca em segundo lugar que o rally de petróleo não foi acompanhado de uma depreciação do dólar e, de facto, qualifica-o como “uma verdadeira alteração do paradigma das correlações”, pois o petróleo e o dólar mantiveram uma correlação inversa nos últimos 15 anos. “Hoje já não é tanto assim porque os Estados Unidos passaram de ser importador líquido de petróleo para uma situação em que será exportador líquido (a AIE espera que isto aconteça em 2027)”, indica Drut. Assim, explica que, desde o início de setembro, o dólar e o petróleo subiram, até ao ponto de atualmente a correlação entre o euro/dólar e o preço do crude rondar zero. “Até a correlação do par USD/CAD e o preço do petróleo está muito mais baixo que durante a década anterior”, ressalva o especialista.
O que está então a guiar o comportamento do bilhete verde? Para o analista da Amundi, “as expetativas das taxas da Fed converteram-se recentemente num motor mais decisivo do dólar”. Isto deve-se a que a Fed, ao prever um nível um pouco mais alto das taxas, “o dólar tem um pouco mais de potencial de subida”.
Céline Renucci, analista da AXA IM, fixa-se também na incomum desconexão entre o petróleo e as divisas associadas a matérias-primas. Apresenta um gráfico em que se pode constatar o que qualifica como “queda significativa” das correlações. Assim, detalha que “o veículo entre o dólar canadiano e o petróleo caiu abruptamente em 2017, devido principalmente ao crescente papel da política monetária e mais notavelmente pela reação face à primeira subida das taxas do Banco do Canadá desde 2010, que ocorreu em julho”.
No caso da coroa norueguesa, acredita que a explicação se deve ao facto de que “um crescimento mais forte do que o esperado impulsionou a divisa, ajudando a reduzir a sua vulnerabilidade de movimentos do preço do bruto”. Renucci considera que esta incomum divergência poderá interpretar-se como “uma desconexão temporal”, por isso acredita que poderá estar para breve uma alteração de comportamento.
A última divisa que a especialista cita é o dólar australiano; neste caso, afirma que “há boas razões para manter uma posição curta”, dado que as taxas de juro nominais registaram uma queda de 2% ao mês e de 1,4% ao ano. “A composição dos fluxos demonstra que esta depreciação é especulativa, mas também mais estrutural porque a tendência de queda também parte de dinheiro real (fundos de pensões, seguradoras, gestoras de fundos”, explica.
Voltando ao dólar, a analista da Amundi acredita que o recente rally será positivo para o BCE e para a Fed. Isto porque hoje o preço do barril é 20% superior às últimas previsões publicadas pelo BCE, enquanto o euro se manteve estável. “Isto poderá levar a uma revisão das previsões da inflação do BCE em dezembro”, indica. No caso da Fed, o efeito base da subida do petróleo “irá durar durante vários meses”; se combinada com a recente subida até 1,8% do IPC, depois de cinco meses sem alterações, “deverá levar os membros do FOMC a se sentirem confiantes com a previsão de inflação”, conclui Drut.