A forte correção sofrida pelas bolsas tem retirado protagonismo às obrigações, uma classe de ativos que também está a sofrer com este arranque de ano e onde se estão a produzir desajustes muito significativos, sobretudo nas obrigações high yield. As quedas mais avultadas estão a acontecer nos EUA, onde a quebra anual do segmento high yield alcança os 4,2%, sem que o índice de high yield com vencimentos a curto prazo (1-3 anos) consiga escapar (-2,6%). No high yield europeu a tendência é semelhante, ainda que com retrocessos menos exacerbados, sendo o retorno de -2,9% no índice genérico e de -0,5% para o que integra os vencimentos a mais curto prazo. Na renda fixa corporativa com grau de investimento, as rentabilidades anuais são quase nulas, mas positivas (de 0,7% no índice norte-americano e de 0,5% para o europeu). Os índices de dívida corporativa a curto prazo estão praticamente flat de ambos os lados do Atlântico. No atual contexto de volatilidade e incerteza, treasuries e bunds são as rainhas, sobretudo as obrigações alemãs, cuja yield está nos 0,26%.
O segmento high yield norte-americano está a ser o mais afetado pela ansiedade dos investidores. Estará o aumento dos spreads em consonância com o contexto económico e os fundamentais subjacentes das empresas? Segundo uma análise do histórico (20 anos) dos spreads de crédito high yield norte-americano e obrigações com grau de investimento (classe BBB), em comparação com o crescimento dos non-farm payrolls, realizado pelo MFS IM , ambos os segmentos parecem estar a refletir uma situação muito mais adversa do que o atual mercado laboral nos EUA justifica. “À exceção da crise de dívida soberana europeia em 2011, os spreads atuais estão associados com um contexto de recessão. De facto, excluindo a crise financeira global no período 2008-2009, os mercados de crédito proporcionaram poucas oportunidades para comprar com margens tão amplas”.
Tal como explica Talib Sheikh, gestor do JPM Global Income, os spreads ajustados às opções (OAS) da high yield norte-americana, começaram o ano nos 483 pontos base e alcançaram os 655 no fecho do terceiro trimestre. “Para colocar em contexto, os diferenciais das taxas de high yield apenas superaram estes níveis três vezes nos últimos 20 anos”. Este comportamento responde aos receios de falta de liquidez, à deterioração da qualidade de crédito entre os títulos mais especulativos, à aceleração do ciclo de M&A e ao risco de incumprimento nos sectores de energia e recursos. O conjunto destes factores acabou provocando uma liquidação indiscriminada nas posições em dívida de elevado rendimento. “Na ausência de uma recessão nos EUA – que não parece provável este ano – os amplos diferenciais do crédito em geral e da high yield em particular, deveriam traduzir-se em rentabilidades semelhantes às das ações em 2016”, afirma.
O ano de 2016 pode ser um ano em que as obrigações soberanas se comportarão pior que a renda fixa corporativa. Ken leech, diretor de investimento da Western Asset (legg Mason Global AM), assim acredita. “A dívida empresarial vai ter um melhor comportamento que a emitida pelos governos, devido ao seu menor preço e melhores fundamentais, sobretudo nos EUA. A chave é, uma vez mais, ser muito seletivo nos sectores e emissores, já que a dispersão entre os ganhadores e perdedores tem sido muito elevada”. Segundo Ludovic Colin, que a par com Hervé Hanoune, gere o Vontobel Fund Bond Global Aggregate, o default nos EUA está incorporado no preço. Atualmente, o mercado desconta que a maioria dos emissores do sector energético entrarão em default este ano, bem como 20% das entidades financeiras. “O mercado está a refletir pânico e stress, não fundamentais”. Na Europa, Colin considera que sair nestes momentos do segmento de dívida corporativa com grau de investimento ou dívida pública de países como Portugal “é uma decisão profundamente equivocada”.
“Comprar uma obrigação de uma empresa de qualidade, que te paga um cupão entre 300 e 400 pontos base, é hoje um investimento muito mais seguro que as emissões de curta duração, bunds ou treasuries, ativos que não te remuneram e que podem gerar muitas perdas de capital. O conceito de risco em obrigações mudou”. Richard Ford, gestor do Morgan Stanley Euro Corporate Bond, também se mostra bastante optimista acerca das obrigações europeias. Na sua opinião, os factores técnicos da procura (sólida) e da oferta (muito baixa) são positivos para a dívida com grau de investimento e as valorizações estão bastante atrativas. “ A ampliação dos spreads de 2015 criou oportunidades de valor e os diferenciais de hoje são inconsistentes com os fundamentais da economia”. Estes factores técnicos, a par com a probabilidade muito baixa de que a Fed produza várias subidas de taxas de juro durante este ciclo económico, faz com que a dívida corporativa norte-americana ofereça uma relação rentabilidade/risco muito atrativa”.
O grande problema que a maioria dos especialistas destaca, passa pela liquidez de mercado, a qual foi afetada em consequência de uma regulação mais restritiva que reforçou os requisitos de capital dos bancos, o que levou muitos intermediários a reduzir os seus inventários e a limitar as atividades dos market makers, indicam da Pioneer Investments. Mas esses problemas de liquidez também afetaram a dívida pública. “A quantidade total de treasuries disponível passou de 2,7 biliões de dólares em 2007 para 1,7 biliões em finais de 2015, com uma redução do tamanho dos blocos de trading. Entretanto, produziu-se uma emissão recorde de obrigações corporativas, ao ponto dos níveis atuais serem 2,4 vezes superiores aos de há dez anos e o volume de ativos sob gestão em fundos que oferecem reembolsos diários ter aumentado a um ritmo de 10% ao ano, sendo agora 76% superiore aos de 2008”, sublinham da Amundi.