Paulo Freire de Oliveira (BPI GA): “A questão da sustentabilidade não é uma revolução. É uma evolução”

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Paulo Freire de Oliveira. Créditos: Vítor Duarte

Em abril de 2018 o grupo CaixaBank adquiria a totalidade do segmento de gestão de ativos do BPI. Desde fevereiro do ano anterior, recorde-se, o grupo espanhol já detinha mais de 80% do próprio banco. Quatro anos depois, numa conversa onde o tema da sustentabilidade foi dos mais abordados, Paulo Freire de Oliveira, CEO da BPI Gestão de Ativos, explicou à FundsPeople - entre outros temas -  quão positivas têm sido as oportunidades criadas pela integração com o grupo matriz.

A entrada do CaixaBank como acionista aconteceu no momento certo, nomeadamente no que diz respeito à temática do ESG. Estamos a conseguir ir a uma boa velocidade neste campo porque temos com o Grupo muitas sinergias a este nível”, introduziu. Paulo Freire de Oliveira acredita que estarem inseridos no grupo CaixaBank é uma mais valia tanto ao nível da consideração dos riscos como um todo, como também no que toca ao acesso a dados e até à eficiência dos processos e de custos. Na própria seleção de fundos há vantagens. “Sendo nós uma equipa com uma dimensão ajustada ao mercado português, mas estando inseridos num grupo desta dimensão, conseguimos ter acesso a uma due dilligence mais detalhada na seleção de fundos, bem como o acesso a uma pool de fundos que passaram no crivo de uma seleção exaustiva”, detalha o CEO.

Apesar destas sinergias alcançadas através da partilha de processos e práticas com o grupo, não há de parte a parte ambições de homogeneização total. Na perspetiva do responsável, as especificidades de cada mercado são para respeitar, e “o segredo está em ser global dentro da Península Ibérica, e local dentro de cada um dos mercados”. “Estes anos permitiram-nos consolidar uma estrutura muito resiliente, e também estabelecer uma boa comunicação e troca de ideias entre equipas”, diz convicto das vantagens.

Os últimos anos

Os últimos dois anos acabaram por ser de crescimento para a indústria de gestão de ativos nacional, e a BPI GA navegou bem essa onda de crescimento. Na perspetiva de Paulo Freire de Oliveira, há razões muito específicas para esse sucesso. Por um lado, acredita que o foco no cliente trazido pela MiFID II, ajudou a que se oferecesse ao cliente a solução de investimento mais adequada. Por outro lado, e na própria entidade, tem sido benéfico conseguirem “oferecer diferentes soluções de perfil de risco em vários tipos de produtos e formatos, sejam eles fundos, seguros ou PPR”. A fórmula é fácil de entender: “Oferecer o produto certo aos clientes em termos de perfil de risco nas várias plataformas possíveis, conjuntamente com um desempenho adequado aos objetivos do Cliente; isto fez com que os inflows crescessem”, elucida.

Fundo Artigo 9 para breve

Mas a esta receita um ingrediente foi sendo adicionado com parcimónia: o tópico da sustentabilidade. Se no início abordavam o ESG de forma mais holística - “porque os próprios standards internacionais eram ainda muito vagos” - desde a introdução da SFDR e da Taxonomia Ambiental as coisas mudaram.  “A partir de agora diria que todos os produtos terão que ser sustentáveis de alguma forma, obedecendo a regras”, começa por referir. Lembrando o que significa os fundos estarem inseridos nos artigos 6, 8 ou 9 do referido regulamento, o CEO antecipa que a oferta da entidade vai ter produtos classificados nas diretrizes destes três artigos. “Vamos poder oferecer aos nossos clientes produtos consoante as suas preferências quanto à sustentabilidade, mas também de risco, respeitando os objetivos de rentabilidade”, reitera.

Deste modo, fica então visível a intenção de lançar um fundo inserido no artigo 9, num “futuro breve”.  “Será algo muito específico, para ir ao encontro da necessidade do Cliente que tem um objetivo definido de sustentabilidade”, explica. Claro que isso exigirá da gestora alguns recursos, e esse é, na opinião do profissional, um dos grandes desafios de ser ESG, sobretudo para as casas de menor dimensão. “Nós estamos a fazer um esforço, e o grupo onde estamos inseridos permite-nos fazer alguma diluição dos custos que isso implica. Ter acesso a dados é um desses custos, algo que é caro em termos específicos sobre esta matéria”, afirma.

Mas se hoje estamos ainda a escrever estas linhas sobre o assunto, no entender do CEO daqui a cinco anos ou dez anos isso deixará de acontecer. “Esta questão da sustentabilidade não é uma revolução. É uma evolução. Acho que vai trazer um novo elã à indústria de gestão de ativos.  Ter em conta os riscos financeiros, mas também os sociais, ambientais ou de governance vai fazer parte do dia-a-dia de toda a indústria, não apenas das gestoras que já estão mais avançadas no processo, como a BPI Gestão de Ativos”, prevê. Atualmente, o responsável aponta mesmo que “não há nenhuma equipa de gestão que não esteja permanentemente a trabalhar sobre questões de sustentabilidade e a ajustar os seus processos de investimento. Apesar de existirem algumas regras e políticas transversais, não existe uma abordagem única para todas as equipas da gestora, nem para todos os mercados em que investimos”, elucida. 

Seguir o exemplo espanhol

Como entidade inserida num grupo espanhol, há também uma monitorização próxima do que se faz no país vizinho. Nesse sentido, Paulo Freire de Oliveira acredita que há caminho a desbravar no incentivo à poupança em Portugal, quanto mais não seja seguindo os exemplos do passado, mas também os de Espanha. “Há uns anos tivemos o bom exemplo do incentivo aos PPR. Vimos que o mercado respondeu a esses estímulos fiscais”, recorda, lembrando que desvantagens fiscais como as que existem nos fundos face a outros produtos de poupança e investimento podiam ser eliminadas. Por outro lado, aponta também o bom exemplo de Espanha. “As regras da vizinha Espanha do “trespasse fiscal” poderiam ser aproveitadas em Portugal. Existem sensivelmente 300 mil milhões de euros de volume em fundos espanhóis. Em Portugal são cerca de 18 mil milhões, muito longe da nossa escala em termos de população ou produto. Seria apenas seguir o modelo. É preciso um incentivo ao mercado nacional de fundos e, sobretudo, aos portugueses que desejam poupar e investir a longo prazo”, concluiu.