Mario Draghi fez o tão ansiado anúncio de um quantitative easing europeu que envolve a compra de dívida pública e privada no valor mensal de 60 mil milhões de euros.
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Com regras bem definidas, o Banco Central Europeu (BCE), contrariando as pressões políticas alemãs, avança já no próximo mês de março com o seu programa de quantitative easing à semelhança do que já tinha sido feito nos Estados Unidos, Reino Unido e Japão. Porém, convém sublinhar, que os dois primeiros tiveram reconhecido sucesso por apresentarem "fundamentais macroeconómicos diferentes e mais favoráveis que os espelhados pela Zona Euro e pelo Japão", como recorda à Funds People Paulo Monteiro Rosa, economista e autor do blog Omniaeconomicus.
Os pontos chave mencionados pelo Presidente do BCE incluem além das compras de títulos de dívida no valor de 60 mil milhões de euros mensais - talvez a única parte do discurso que tenha surpreendido os mercados que esperavam menos 10% do que este montante - a manutenção do programa até setembro de 2016, muito embora se defina um target da taxa de inflação de 2%. Caso a mesma não seja alcançada, o programa poderá ser prolongado. Nas compras o BCE abrange asset backed securities e covered bonds assim como títulos investment grade o que, no caso da dívida pública portuguesa, apenas é garantido pela agência de rating DBRS. O Presidente determinou ainda que não poderão exceder uma terça parte do total de dívida emitido pelo país, estabelecendo também um tecto de 25% na compra por emissão.
Mario Draghi acrescentou igualmente que as compras serão feitas pelas Bancos Centrais de cada país (em inglês, NCBs), na medida da sua quota junto do BCE. Caso existam perdas, haverá um sistema partilhado das mesmas, nos seguintes termos: o BCE assume 20% e os NCBs os restantes 80%. Houve um consenso relativamente a este regime, muito embora o programa de QE não tenha sido aprovado por unanimidade, apenas por uma “grande maioria“.
Paula Carvalho, economista-chefe do Banco BPI, considera que em termos globais é a “decisão necessária", tendo Mario Draghi surpreendido mais uma vez, embora assuma que "é (ainda) cedo para afirmar que será suficiente. Demonstra sobretudo, mais uma vez, o empenho das autoridades monetárias da zona euro em gerar inflação, influenciar as expectativas e impulsionar a actividade económica na Europa".
Será o suficiente para a economia real?
Tanto Paulo Monteiro Rosa como Paula Carvalho apresentam as suas dúvidas no que toca aos verdadeiros efeitos que estas medidas possam ter na economia real. O economista explica, "por analogia, que os resultados a obter do QE europeu não deverão ser muito diferentes do QE japonês, pelo menos no que concerne à evolução dos preços e ao crescimento económico. A economia japonesa assemelha-se à da Zona Euro, principalmente quanto ao envelhecimento da população das duas áreas geográficas. No entanto, os europeus são mais propensos ao consumo que os japoneses o que poderá resultar num desempenho mais positivo do QE do BCE". Contudo, refere ainda, "o QE do BCE pode não chegar à economia real. Permanecer apenas nos mercados financeiros. Os bancos comerciais já têm um relativo acesso facilitado aos mercados. Dinheiro não lhes falta. A taxa de juro de referência do BCE é de 0.05%. Logo se os bancos não emprestam é porque têm receio de financiar uma economia que continua débil. Os bancos centrais controlam a base monetária e não a massa monetária. Os bancos centrais não emprestam directamente à economia… Esse trabalho cabe aos bancos comerciais e aos agentes económicos, nomeadamente famílias e empresas", conclui.
Por seu lado, a economista-chefe do Banco BPI afirma que para que se consigam visualizar os efeitos deste programa de expansão monetária "será necessário que o estímulo chegue à economia real, impulsionando o consumo e o investimento. Os efeitos destas medidas já se vinham fazendo sentir no mercado financeiro, via a desvalorização do euro, a descida das taxas de juro de longo prazo e a redução dos custos de financiamento dos Estados Europeus. Resta aguardar pelo funcionamento dos restantes mecanismos, nomeadamente a redução da fragmentação financeira e a melhoria dos fluxos de financiamento ao sector privado".
Como reagiram os mercados?
Com os TLTRO a ter uma revisão em baixa para -0,10% e as taxas de juro a serem mantidas nos 0,05% e a taxa de depósito nos -0,20%, as primeiras reações dos mercados foram calmas com ganhos marginais entre 1% e 2%.
Assim sendo, a única surpresa foi provavelmente o valor das compras de 60 mil milhões de euros mensais, superior ao valor de 50 mil milhões falado na véspera do anúncio. Esta diferença poderá justificar a queda de 1% registada pelo euro face ao dólar. Todavia, a "moeda única já se encontrava sob alguma pressão dadas as eleições gregas do próximo fim-de-semana, podendo mesmo chegar aos 1.10 face ao dólar", lembra Jorge Ramalho, autor do blog "O Monitor dos mercados".